Um pavor gelado se instalou em mim. Era um convite para o filho dele, um filho que eu não sabia que existia. Fui à igreja, escondida nas sombras, e o vi segurando um bebê, um menininho com seus cabelos e olhos escuros. Yasmin Ferraz, a mãe, se apoiava em seu ombro, uma imagem de felicidade doméstica.
Eles pareciam uma família. Uma família perfeita e feliz. Meu mundo desabou. Lembrei-me dele se recusando a ter um bebê comigo, citando a pressão do trabalho. Todas as suas viagens de negócios, as noites tardias - foram passadas com eles?
A mentira era tão fácil para ele. Como pude ser tão cega?
Liguei para a Bolsa de Arquitetura de Zurique, um programa de prestígio que eu havia adiado por ele. "Eu gostaria de aceitar a bolsa", eu disse, minha voz assustadoramente calma. "Posso partir imediatamente."
Capítulo 1
A notificação de e-mail deslizou pela tela do notebook de Emílio, um pop-up elegante e minimalista de sua agenda. Meu marido estava no chuveiro, o som da água batendo contra o vidro um ritmo familiar em nossas manhãs. Eu estava apenas colocando uma xícara de café em sua mesa, um pequeno ritual em nossos cinco anos do que eu pensava ser um casamento perfeito.
Meus olhos capturaram as palavras antes que eu pudesse desviar o olhar.
"Você está convidado para o Batizado de Léo Mendes."
O nome me congelou. Léo Mendes. Nosso sobrenome.
Antes que eu pudesse processar, a notificação desapareceu. Um piscar de olhos, e sumiu. Retratada. Como se nunca tivesse existido.
Mas era tarde demais. A imagem estava gravada em minha mente. A remetente: Yasmin Ferraz. O nome era vagamente familiar, uma influenciadora digital cuja vida perfeitamente curada às vezes cruzava meu feed. Uma mulher linda com uma legião de seguidores.
Um mal-estar, frio e agudo, se instalou em meu estômago. Não era um e-mail qualquer. Era um convite para o filho dele. Um filho que eu não sabia que existia.
O endereço era de uma igreja no centro da cidade, o horário marcado para aquela tarde.
Uma parte de mim queria fechar o notebook com força e fingir que não tinha visto nada. Voltar para a ilusão perfeita que eu havia construído com tanto cuidado com Emílio, o brilhante e carismático CEO de tecnologia que me amava.
Mas outra parte, uma parte mais fria e insistente, sabia que eu tinha que ir. Eu tinha que ver.
Deixei o café em sua mesa e saí de nossa casa impecável e minimalista, a casa que eu havia projetado como um monumento ao nosso amor.
A igreja era de pedra antiga, a luz do sol se infiltrando pelos vitrais. Fiquei no fundo, escondida nas sombras, meu coração um tambor pesado e doloroso contra minhas costelas.
E então eu o vi.
Emílio. Meu Emílio. Ele estava perto do altar, não em um de seus ternos de negócios impecáveis, mas em roupas casuais e macias. Ele parecia relaxado, feliz. Ele estava segurando um bebê, um lindo menininho envolto em renda branca.
Um menininho com os cabelos escuros e os olhos expressivos de Emílio.
A criança, Léo, fez uma bolha de saliva e riu, estendendo uma mãozinha para tocar o rosto de Emílio.
"Espero que ele cresça e seja como você, papai", disse a voz de uma mulher, suave e possessiva.
Yasmin Ferraz apareceu, seu braço deslizando pela cintura de Emílio. Ela encostou a cabeça no ombro dele, uma imagem de felicidade doméstica. Seu sorriso era radiante, seus olhos fixos no homem que eu chamava de meu marido.
Eles pareciam uma família. Uma família perfeita e feliz.
Minha mente ficou completamente em branco. Uma onda de dormência me invadiu, tão profunda que parecia que eu estava flutuando fora do meu próprio corpo. Observei enquanto Emílio beijava a testa de Yasmin, depois voltava sua atenção para o bebê, murmurando algo que a fez rir.
Era real. Tudo aquilo. A mulher, o bebê. Sua vida secreta.
Vi alguns rostos familiares nos bancos, conhecidos de negócios de Emílio, pessoas que já tinham ido à nossa casa para jantares. Eles sorriam para o casal feliz, alheios à esposa parada nas sombras, seu mundo desmoronando ao seu redor.
Eu não conseguia respirar. Não conseguia me forçar a ir até lá, a gritar, a estilhaçar o momento perfeito deles. A luta dentro de mim se esvaiu, substituída por um desespero profundo e oco.
Virei-me e fui embora, deslizando para fora das pesadas portas da igreja e de volta ao barulho da cidade. Os sons estavam abafados, distantes. O mundo parecia frio, e eu estava mais fria ainda.
Lembrei-me de uma conversa de alguns meses atrás, em nosso aniversário.
"Emílio", eu disse, com a voz suave. "Acho que estou pronta. Vamos ter um bebê."
Ele ficou em silêncio. Desviou o olhar, passando a mão pelos cabelos. Um gesto que eu sempre pensei que era ele pensando, processando.
"Ainda não, Elana", ele finalmente disse. "A empresa está em uma fase crítica. Me dê mais um ano. Quero poder dar tudo ao nosso filho."
Eu acreditei nele. Confiei no homem que me perseguiu incansavelmente na faculdade, o único que conseguia ver além da minha ambição, a mulher por baixo de tudo.
Ele era um rival na época, ambos no topo do nosso curso de arquitetura. Ele era brilhante, determinado e frio com todos, menos comigo.
Lembrei-me dele me trazendo sopa quente quando eu passava noites em claro no estúdio, sua mão massageando suavemente minhas costas enquanto eu me curvava sobre as plantas.
Lembrei-me de quando peguei pneumonia, tão doente que mal conseguia ficar de pé. Ele ficou ao lado da minha cama de hospital por três dias seguidos, sem dormir, apenas cuidando de mim.
Ele me pediu em casamento naquele quarto de hospital, sua voz embargada por uma vulnerabilidade que eu nunca tinha visto antes.
"Não posso te perder, Elana", ele sussurrou, sua testa pressionada contra a minha. "Não consigo imaginar minha vida sem você."
Descobri mais tarde que a mãe dele havia morrido em um hospital exatamente como aquele. O medo dele parecia real, seu amor absoluto.
Nós nos casamos logo após a formatura. Sua startup de tecnologia explodiu, e ele se tornou o homem que todos queriam ser. Eu construí minha própria carreira, mas sempre o coloquei em primeiro lugar. Mudei meu próprio plano de cinco anos por ele, por nós.
E todo esse tempo, ele tinha outra família.
Aquele amor, aquela devoção que eu acreditava ser reservada apenas para mim, era uma mentira. Uma performance.
Meu celular vibrou no meu bolso. Era ele. Encarei seu nome na tela, minha mão tremendo. Finalmente atendi.
"Oi, onde você tá?" Sua voz era calorosa, o mesmo tom amoroso que ele sempre usava comigo.
Ao fundo, pude ouvir o som fraco de um bebê chorando, depois a voz de Yasmin acalmando a criança.
Eu estava do outro lado da rua da igreja, observando-o através das portas abertas. Ele segurava o telefone no ouvido, sorrindo enquanto falava comigo.
"Só estou dando uma volta", consegui dizer, minha própria voz soando estranha e frágil.
"Fiquei preso numa reunião de última hora", ele disse suavemente. "Chego em casa logo. Sinto sua falta."
A mentira era tão fácil para ele. Deslizou, polida e perfeita, como tudo o mais sobre ele. Uma lágrima finalmente escapou e deslizou pela minha bochecha, quente contra minha pele fria. Todas aquelas viagens de negócios, as noites tardias no escritório. Quantas delas foram passadas aqui, com eles?
Como pude ser tão cega?
Engoli o nó na garganta, forçando minha voz a ficar firme. "Emílio, preciso ver você."
Ele hesitou. Pude vê-lo mudar de peso, seu sorriso vacilando por um segundo. "Ainda estou na reunião, amor. Não pode esperar até eu chegar em casa?"
"Não."
Nesse exato momento, o menininho, Léo, cambaleou e abraçou a perna de Emílio.
"Papai!" a criança gritou.
Os olhos de Emílio se arregalaram em pânico. Ele rapidamente se abaixou, tentando silenciar o menino enquanto mantinha a voz baixa e calma para mim. "É só... o filho de um dos meus colegas."
O telefone ficou mudo. Ele havia desligado na minha cara.
Observei enquanto ele pegava o menino nos braços, beijando sua bochecha e sussurrando algo que fez a criança rir. Ele parecia tão natural, tão à vontade. Um pai tão bom.
Meu coração parecia ter sido arrancado, deixando nada além de um vazio oco e dolorido. Anos da minha vida, do meu amor, pareciam uma piada.
Peguei meu celular novamente, meus dedos se movendo por conta própria. Não liguei para Ayla, minha melhor amiga. Não liguei para meu advogado.
Liguei para o diretor da Bolsa de Arquitetura de Zurique. Um programa de prestígio de seis meses para o qual eu havia sido aceita, mas adiei por Emílio. Um programa que exigia foco completo e ininterrupto. Isolamento total.
"Eu gostaria de aceitar a bolsa", eu disse, minha voz assustadoramente calma. "Posso partir imediatamente."