No quinto aniversário de casamento.
Ou, como Tiago fazia questão de lembrar, o aniversário do acidente que ceifou a sua família.
Em vez de celebração, iniciava-se mais um capítulo da minha tortura insaciável.
Ele, o homem que um dia amei mais que tudo, transformara-se num carrasco implacável.
Fui forçada a beber noventa e nove garrafas de vinho, um símbolo macabro da minha "dívida de sangue".
Confinada, isolada, humilhada, vi-o dar afetos a Clara, uma mulher escolhida pela semelhança com a Sofia de outrora.
Fui submetida a uma cirurgia perigosa para doar um rim a ela, depois de um "acidente" suspeito.
O nosso leal cão, Max, o último elo do nosso amor passado, foi cruelmente morto.
E o cúmulo da humilhação: fui forçada a engolir as cinzas do meu querido amigo.
Arrastada de joelhos, sob a vigilância fria dele, até ao cemitério para proclamar os pecados dos meus pais.
A dor física não era nada comparada à exaustão da minha alma.
Eu só ansiava pela paz, a paz que só a morte parecia poder oferecer.
Cansada de amar, cansada de sofrer, o meu único desejo era que tudo acabasse.
Num ato de desespero, atirei-me da Ponte da Arrábida, buscando o abraço gélido do Douro.
Mas abri os olhos novamente.
E, para meu horror e espanto, estava de volta.
Um dia antes do acidente fatídico, com todas as memórias vívidas da minha tortura.
O mais chocante? Tiago também se lembrava.
Agora, perante esta segunda chance inesperada: escolheríamos o ódio mais uma vez, ou haveria redenção para um amor que se transformara em veneno?