Criada em isolamento, Molly era uma jovem de estatura mediana, adornada por longos cabelos castanhos que emolduravam seu rosto angelical. Seus olhos, ainda que carregassem a ingenuidade da juventude, escondiam uma inteligência aguçada e uma perspicácia incomum. Era como se, por trás da fachada de uma jovem inexperiente, existisse uma alma perspicaz pronta para desabrochar.
Filha da cafetina da máfia, sua mãe nutria o desejo de que ela conseguisse manter um homem bom e que a protegesse na máfia, assim como ela mesma fizera, moldando-a em uma moça bela, vaidosa e atraente, sua mãe a criou para ser uma noiva perfeita e nada alem disso, o que poderia ser considerado loucura, e era considerado, para seu pai e irmãos, mas não se opuseram a criação da cafetina Matilde, mesmo que se sentissem aflitos com a forma como ela fazia tudo parecer um mar de rosas, mas agora o que ela faria na iminente caça a sua família, onde ate Molly poderia ser morta?
Molly estava ate inerte a tudo que acontecia, ate presenciar a preparação de sua família para uma partida iminente, sem saber o que se passava por trás das portas, era uma tortura para ela. A angústia de ser mantida de fora, estava a consumindo amargamente.
- Que saco! Por que eles nunca me contam nada? - resmungava Molly ao passar por cada porta, seus olhos castanhos ardendo de curiosidade.
No andar de baixo, seu pai perambulava de um lado para o outro, a inquietude estampada em seu rosto. Molly se esgueirou até a sala, observando seus irmãos Caio e Matheus empacotando freneticamente as malas.
- O nosso pai sabe o que vai acontecer se ficarmos. Temos que ir antes que a guerra comece - sussurrou Caio, a voz carregada de receio, apesar de tentar disfarçar. Com seus 24 anos, ele era o irmão do meio e tinha um pouco mais de experiência no mundo da máfia.
- Eu sei - confirmou Matheus com indiferença, o filho mais velho e mal-humorado de 30 anos. Ambos os irmãos ainda não haviam se casado, tendo conseguido escapar dos casamentos arranjados pela família, mesmo que fossem vantajosos. - Devíamos ter nos unido a outra máfia - sugeriu ele, lançando um olhar sombrio para Caio.
- Você sabe que isso significa morte, a menos que fosse uma aliada. Mas a única aliada que tínhamos é a que vai começar a matar todos por causa da dívida bilionária de Teodoro.
- Aquele infeliz! - rosnou Caio, batendo o punho na mesa.
- Mas somos precavidos, não vamos esperar eles fecharem todos os buracos - resmungou Matheus enquanto organizava suas malas, alheio à irmã que o observava pela fresta da porta.
- Entre, irmãzinha - ele a convidou ternamente, revelando que a havia visto. Matheus, apesar de rigoroso com todos, era gentil com Madson, sua única fraqueza. Ela era seu ponto mais fraco.
Madson o encarou timidamente antes de entrar no quarto.
- Já disse para não ficar à espreita - ele a repreendeu, mas logo a envolveu em um abraço apertado que a fez reclamar de dor. Matheus era alto e forte como um soldado, e suas tatuagens escondidas sob a camisa social só aumentavam sua aura sombria. Seu rosto geralmente era mal-humorado, mas ele sempre se esforçava para sorrir para sua irmã. Caio, o irmão mais novo, não era muito diferente, apenas um pouco mais magro e com uma expressão mais gentil. Ambos adoravam Madson.
- O que está acontecendo? - perguntou Madson Molly, sentando-se na cama para ajudar a dobrar as roupas ainda empilhadas.
- Na verdade, é o que vai acontecer - corrigiu Matheus, voltando a esvaziar o guarda-roupa.
- Ei, pequeno pêssego - disse Caio, o irmão mais novo, levantando-se da poltrona e sentando-se ao lado dela na cama. Ele inclinou o rosto em seus cabelos e fungou. - Ah... Isso sim! É um cheiro incrível, vontade de morder e arrancar um pedaço - disse com seriedade, fazendo Madson levar a sério.
- Ah! Você não pode fazer isso!
- Mas o cheiro dessa fruta... A mãe tem que parar de fazer estoque desse xampu. Qualquer dia você vai ser canibalizada - ele disse segurando o riso.
- Esse é meu favorito, vocês sempre reclamam - resmungou Madson, emburrada.
- Normalmente parece uma droga; às vezes me dá ânsia de vômito e outras vezes eu sinto que pêssego é minha fruta preferida, mas eu nem como essa fruta - comentou Matheus sem os encarar.
- Uhm... eu também nunca comi pêssego. Parece ser uma fruta difícil por aqui.
- Mas, em compensação, você cheira da cabeça aos pés - completou Matheus, enquanto continuava segurando a ponta dos cabelos da irmã sobre o nariz.
- A mãe te dá um monte desses cremes. Pode contrabandear uns para mim? - perguntou Caio.
- São para meninas.
- Eu sei, se eu ganhar uns desses, com certeza pensarei para qual garota eu posso dar. Quem sabe a minha futura esposa. - Caio comentou pensativo, como se já tivesse alguém em mente.
- Apenas compre alguns diferentes. Imagina ter uma esposa com o cheiro da sua irmã, parece assustador. - confessou ela sentindo calafrios.
- Verdade, talvez eu encomende um tão bom no mesmo lugar que a mãe encomendou os seus. - Caio comentou, e Matheus o encarou de soslaio, desaprovando. Ele sabia que os produtos que Molly usava não eram por acaso, e ele até mesmo queria jogar tudo fora.
- Sabemos que não tem aqui no Brasil. Desde que você disse gostar deles, nossa cafetina sempre compra em caixas para você, perfumes e cremes com esse cheiro.
- verdade o fornecedor disso é tão misterioso, com certeza seria um bom presente para alguém que eu quisesse me casar?
- Está apaixonado, irmãozinho? - perguntou Matheus com a voz arrastada e cautelosa, apertando o ombro de Caio, o fazendo se contorcer de dor como se tivesse falado algo errado.
- Não...! - urrou Caio, puxando a grande mão do irmão do seu ombro como se fosse um gancho. - Não estou pensando nisso agora... Me solta! - ele tentou se soltar ao sentir aquele aperto machucar seu músculo.
- Theus! Solta! - pediu Molly, também tentando tirar a mão de Matheus, ajudando seu irmão. Mas os dois não tinham força para aquele homem de dois metros e intimidador.
- Ok... Mas casamento é um assunto proibido aqui - concluiu Matheus , obedecendo ao pedido da irmã.
- Aconteceu! - gritou seu pai, irrompendo no quarto. Os irmãos se silenciaram. - Todas as contas foram bloqueadas; a máfia sul está começando a caçar nossas cabeças - avisou ele, trêmulo, tentando manter a calma.
- Já está tudo pronto, vamos apenas sair - anunciou Matheus sem demonstrar emoção, pegando seu fuzil em cima do guarda-roupa e entregando um também ao irmão. - Chame os empregados para descer com as malas. Sairemos no carro forte até o subsolo; se bloquearam as contas, não temos como sair da cidade.
- Matheus! Não temos como sair da cidade; eles já fecharam tudo. Não sei quantos dias vamos conseguir ficar escondidos. Eu serei um dos primeiros a ser caçado por ser braço direito de Teodoro.
- Afinal, é só a máfia sul que está começando uma guerra? - perguntou ele pensativo, enquanto Caio e Madson Molly apenas prestavam atenção em silêncio. Lincoln, pai de dos três presentes, era sottocapo de Teodoro e, portanto, sucessor, mas devido à dívida do capo, a máfia sul estava cobrando com a vida de todos de sua organização.
- Sim, foi o que informaram.
- Então a máfia da cidade leste não vai se unir a eles, certo?
- Você sabe que não, afinal tem algo que ele tem bastante interesse em nossa família... - interrompeu ele a fala, engolindo em seco ao encarar Molly. Ela estava próxima demais e não poderia saber o motivo da máfia leste não atacar, que tinha a ver exatamente com ela.
- Então, devido à aliança que iria ser formada, ele decidiu não se envolver? Interessante. - murmurou Matheus, engolindo em seco sem entrar muito no assunto.
- Ainda assim, ele não vai nos proteger, porque a aliança não foi formada. A máfia leste é a mais influente em todas as organizações. Se tivéssemos o selo de trânsito livre da família Seagreme que eles carregam livremente, poderíamos apenas apresentá-lo e ser livres desse lugar - resmungou seu pai.
- O selo de trânsito livre?
- Sim! O selo que é feito com o anel do brasão da família Seagreme, os que comandam toda a cidade e podem ir de um lugar a outro, concedendo esse privilégio a todos que confiam.
- Aquele maníaco que está prestes a se tornar capo da máfia? O mesmo que você entregaria a nossa... - Matheus se calou novamente com cautela, mas Molly já estava curiosa.
- Vamos pensar sobre isso e entrar em contato, se...
- Não! - Matheus interrompeu Lincoln, nenhum dos irmãos concordava com a decisão do pai.
- Mas se a entregarmos, ele nos daria o selo e poderíamos sair! - retrucou seu pai desesperado.
- Ela não é objeto de troca, nosso trato é um e você vai cumprir até o fim.
- Pai, nós não vamos aceitar fazer isso. Então, é bom que lute! - asseverou Caio entregando um fuzil a seu pai, batendo contra seu peito. Madson não entendia o que estava acontecendo. Por um momento, ela encarou aqueles três homens fortemente armados, ao mesmo tempo em que eles a encaravam sérios. Ela mal imaginava o que poderia ser, mas ficou pensativa sobre o selo de trânsito.