Capítulo 7 A Transformação de Elara

A dor começou no meio da madrugada.

Primeiro, um calor estranho percorreu sua espinha, como brasas se acendendo sob a pele. Depois, vieram as batidas do coração - fortes, rápidas, violentas - como se quisessem romper o peito e libertar algo há muito aprisionado.

Elara ofegava. Estava sozinha na cabana simples, nos limites da vila humana onde fora criada. Mas nada ali a pertencia mais. Desde que a deusa da lua - aquela loba feita de névoa e luz - tocara sua alma, tudo havia mudado.

O lobo dentro dela... não era mais sombra.

Era presença. Fome. Instinto vivo.

- O que está acontecendo comigo? - sussurrou, dobrada sobre si mesma.

As articulações estalaram como galhos quebrando. Um grito escapou quando a espinha arqueou involuntariamente. A pele queimava, os ossos se contorciam em movimentos que não pertenciam a um corpo humano.

Ela caiu ao chão. Cada respiração era uma luta. Cada batida do coração, um trovão.

A visão se turvou. Mas os outros sentidos se expandiram: o som do vento rugia como maré, o cheiro da madeira queimava como fogo, e o próprio sangue vibrava nos ouvidos.

"Deixe vir..."

A voz dentro dela era selvagem e suave - Saelira, a loba adormecida.

"Não lute. Nascemos para isso."

E então, algo se partiu.

Algo... despertou.

O corpo arqueou uma última vez. E o grito que saiu não era mais humano.

Era um uivo.

Agudo. Ancestral. Um chamado que atravessou paredes, tocou árvores distantes, subiu até o céu - e foi respondido pelo próprio silêncio da floresta.

Quando a dor cessou, restou apenas a respiração pesada. E, em seguida, a clareza.

Elara abriu os olhos.

E o mundo era outro.

Tudo pulsava com intensidade: cores mais vivas, sons mais nítidos, aromas como histórias desveladas. A lua, lá no alto, parecia mais próxima - uma mãe. Uma guardiã. Uma testemunha.

Ela se ergueu com patas que ainda aprendiam a obedecer. Caminhou até o espelho antigo, tremendo sob sua presença.

E quando se viu... parou.

A loba diante dela tinha pelagem branca como a neve, densa, luminosa sob o luar. E os olhos - dourados, intensos, impossíveis de esquecer - ardiam com uma luz que não era deste mundo.

Ela não sabia que era assim.

Mas agora sabia quem era.

A Loba Branca havia despertado.

E o mundo... começava a ouvir seu uivo.

                         

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