Os funcionários da casa se reuniram para assistir, seus rostos uma mistura de curiosidade mórbida e satisfação cruel. Alguns deles levantaram seus celulares, as pequenas lentes pretas capturando minha degradação. O som de suas risadinhas foi um golpe físico.
"Olhem para a 'assassina'. Ela está recebendo o que merece."
"O lugar dela é numa jaula."
Os guardas me jogaram dentro do canil e bateram a pesada porta. O trinco de metal se encaixou com um som de finalidade. Os Dobermans, agitados pela comoção, começaram a latir, seus rosnados profundos e ameaçadores enchendo o pequeno espaço. Eu me arrastei para o fundo da jaula, pressionando-me contra as grades frias.
"Por favor, me deixem sair!" eu gritei, minha voz perdida na cacofonia de latidos.
Ricardo ficou do lado de fora do canil, me observando com aqueles mesmos olhos vazios. Ele era uma estátua de julgamento justo, impassível diante do meu terror.
Apertei meu peito, meus dedos procurando por algo, qualquer coisa, para me segurar. Eles encontraram um objeto pequeno e liso no bolso do uniforme barato que eu usava. Uma conta de lápis-lazúli, um presente da minha avó. "Para proteção," ela havia dito. Era a única coisa da minha vida passada que eu consegui manter.
A pedra lisa estava fria contra minha pele, um pequeno ponto de realidade neste pesadelo. Minha mente voltou aos anos que passei tentando ganhar o amor de Ricardo. Eu pensei que poderia derreter seu exterior gelado com meu calor. Eu tinha sido tão ingênua. Todos os meus esforços, todo o meu amor, não valeram nada. Tudo levou a isso: uma jaula.
Meu orgulho, que já foi o assunto da sociedade paulistana, era agora uma relíquia esquecida. Ele o havia arrancado de mim, pedaço por pedaço, até não sobrar nada. A dor física, o medo constante, a vergonha pública - tudo se fundiu em uma onda de desespero que finalmente me puxou para o fundo. O mundo inclinou, os latidos desapareceram e tudo ficou preto.
Acordei com uma dor aguda e ardente na bochecha. A mãe de Ricardo, Eleonora Montenegro, estava sobre mim, seu rosto contorcido em uma máscara de puro ódio. Eu não estava mais no canil, mas no chão de mármore frio da sala em memória de Isabela.
"Sua criatura inútil," ela cuspiu, sua voz pingando veneno. "Você desmaia por um tempinho numa jaula? Isabela está morta por sua causa. Morta!"
Ela apontou para o enorme retrato de Isabela que pendia sobre a lareira. "Ricardo quer que você bata a cabeça no chão. Cem vezes. Para implorar o perdão de Isabela."
Meu corpo era um peso morto. Eu não conseguia me mover. Uma das empregadas agarrou meu cabelo e forçou minha cabeça para baixo, batendo minha testa contra o chão duro. Uma vez. Duas vezes.
"Sinto muito," eu sussurrei, as palavras mecânicas, sem sentido.
"Mais alto!" Eleonora gritou. "Isso soa como se você estivesse arrependida?"
Novamente, eles forçaram minha cabeça para baixo. Um fio quente de sangue escorreu pela minha têmpora. Repeti as palavras, minha voz um eco oco na sala silenciosa. "Sinto muito, Isabela. Sinto muito mesmo."
A memória daquela noite de cinco anos atrás passava em minha mente em um loop. Isabela, caindo. O choque em seu rosto. E então Ricardo, me encontrando ao lado de seu corpo, seu rosto se desfazendo não de dor, mas de uma raiva terrível e fria. "Você vai pagar por isso, Helena," ele havia jurado. "Pelo resto da sua vida, você viverá no inferno para se redimir pelo que fez."
Ele havia cumprido sua promessa.
Bati minha cabeça no chão novamente. E de novo. A dor era um zumbido distante. Contei cada uma, uma ladainha do meu sofrimento. Noventa e oito. Noventa e nove. Cem.
Terminei, minha testa sangrando livremente no tapete branco imaculado. Eu estava tonta e enjoada, mas um único pensamento atravessou a névoa. Lucas.
Olhei para Ricardo, que observava silenciosamente da porta. "Eu fiz o que você pediu," eu murmurei. "Agora, por favor, me deixe ver o Lucas."
Um lampejo de algo - seria pena? - cruzou seu rosto, mas desapareceu tão rápido quanto apareceu. Ele caminhou até uma pequena mesa e pegou um frasco cheio de um líquido escuro.
"Você quer ver seu irmão?" ele perguntou, sua voz enganosamente suave.
Eu assenti, a esperança lutando com o terror em meu peito.
Ele estendeu o frasco. "Beba isso. Beba isso, e eu deixarei você vê-lo."
Olhei para o frasco, depois para seu rosto indecifrável. "O que é isso?"
"Um remédio," ele disse suavemente. "Para garantir que uma assassina como você nunca possa ter filhos. Para garantir que sua linhagem amaldiçoada termine com você."
Meu sangue gelou. Ele queria me tornar infértil. Ele queria tirar a única coisa que uma mulher considera sagrada, a possibilidade de um futuro, de uma família própria. Tudo por um crime que eu não cometi.
Olhei do frasco para seus olhos frios e determinados. Era uma escolha entre meu futuro e meu irmão.
Não havia escolha alguma.
Por Lucas, eu faria qualquer coisa.
Com a mão trêmula, peguei o frasco. Levei-o aos lábios e bebi até a última gota.