Uma onda de raiva quente e inútil me invadiu. Minhas mãos se fecharam em punhos ao meu lado, minhas unhas cravando em minhas palmas. A dor era uma sensação que me aterrava, um ponto agudo de foco no caos turbulento de minhas emoções. Eu queria gritar, enfurecer-me, arranhar seu rosto bonito e mentiroso. Mas meu corpo não cooperava. A raiva estava presa lá dentro, um veneno silencioso e ardente.
Ele viu o lampejo de dor em minha expressão e interpretou mal. - Sinto muito, Helena - disse ele, sua voz pingando sinceridade praticada. - Vamos superar isso. Eu prometo.
Ele começou a falar novamente, pintando outro belo quadro de nosso futuro, um futuro onde nada disso jamais aconteceu.
Eu o interrompi. - Estou cansada, Arthur.
As palavras o pararam na hora.
- Quero ficar sozinha - eu disse.
A mágoa em seus olhos era real desta vez. Ele não estava acostumado a ser dispensado. Ele me perseguiu por anos, uma força da natureza implacável e encantadora. Eu acreditei no conto de fadas que ele me vendeu. Acreditei que nosso amor era a única coisa verdadeira em minha vida.
Agora eu via a verdade. Era uma história que ele contava a si mesmo, e eu era apenas uma personagem coadjuvante.
Ele saiu sem dizer mais uma palavra.
Alguns dias depois, ele me levou para casa. De volta ao nosso apartamento. O horizonte da cidade parecia o mesmo, mas tudo parecia diferente. Estranho.
Nosso jardim no terraço, aquele que passei anos cultivando, estava coberto de ervas daninhas. Lá dentro, coisas estavam faltando. Uma pintura que eu amava. Uma escultura que comprei em nossa lua de mel. Minha poltrona favorita.
- O que aconteceu com as minhas coisas? - perguntei.
Arthur se mexeu desconfortavelmente. - Tive que abrir espaço. Catarina... ela ficou aqui por um tempo. Ela precisava de um lugar para se sentir segura.
Ele disse isso tão casualmente, como se fosse a coisa mais natural do mundo sua ex-namorada se mudar para nossa casa enquanto sua esposa estava na prisão.
- Não se preocupe - ele acrescentou rapidamente, tentando me apaziguar. - Ela está no quarto de hóspedes agora. Fiz ela sair do nosso quarto esta manhã.
Ele me guiou pelo apartamento, mostrando as mudanças, um anfitrião orgulhoso exibindo sua hospitalidade. Eu o segui, meu rosto uma máscara em branco. Meu coração era uma pedra fria e morta no meu peito.
Ele me abraçou por trás, o queixo apoiado no meu ombro. - Senti tanto a sua falta, Helena. Sinto muito por tudo.
Fiquei rígida em seu abraço. Então, com uma força que eu não sabia que possuía, o empurrei para longe.
- Não - eu disse. - Não fale sobre isso. Não quero ouvir.
Ele parecia atordoado. - Helena...
Naquele momento, a porta da frente se abriu com um clique.
Catarina entrou, carregando sacolas de compras. Ela parou abruptamente quando nos viu. Um lampejo de irritação cruzou seu rosto antes que ela o rearranjasse em um sorriso brilhante e acolhedor.
- Helena! Você está em casa! Que maravilha. - Ela olhou para minhas roupas de hospital. - Oh, coitadinha. Precisamos comprar roupas novas para você. Arthur, você contou a ela? Sinto muito, tive que tirar algumas de suas coisas velhas para abrir espaço.
Eu apenas olhei para ela, meu silêncio uma parede que ela não conseguia penetrar.
Ela tentou pegar meu braço, para me guiar em direção ao quarto. - Deixe-me mostrar o que fiz com o lugar.
Puxei meu braço de volta.
Seu sorriso vacilou. Vi o flash de raiva em seus olhos.
- Tudo bem - eu disse, minha voz estranhamente calma. - Tenho certeza de que está lindo.
Eu precisava fugir. Precisava colocar a próxima fase do meu plano em ação. - Acho que vou tomar um banho.
Enquanto a água corria, peguei a minúscula câmera à prova d'água que Juju havia me dado de seu esconderijo. Não era maior que um botão. Eu a fixei atrás do espelho do banheiro principal, a lente perfeitamente posicionada para capturar todo o cômodo.
Quando saí, Catarina estava sozinha com Arthur. Sua voz era um silvo baixo e venenoso.
- Ela me odeia, Arthur. Ela vai tentar arruinar tudo. Você tem que escolher.
- Eu já escolhi você - disse ele, a voz cansada.
Catarina não estava satisfeita. Ela queria uma declaração pública. Ela queria me humilhar.
- Vou dar uma festa - ela anunciou, a voz de repente brilhante e alta para meu benefício. - Uma cerimônia de compromisso. Para nós. Para mostrar ao mundo que nosso amor é real.
Então, ela caminhou até o painel de alarme de incêndio perto da porta e, com um sorriso malicioso, puxou a alavanca.
O alarme soou, um grito ensurdecedor e agudo.
A voz automatizada do prédio começou a cantar: - FOGO DETECTADO. POR FAVOR, EVACUEM IMEDIATAMENTE.