Visita íntima
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Capítulo 8 08

Dinheiro Sujo

Rubi

Cheguei em casa depois de mais um dia puxado na escola.

O corpo implorando por descanso, a mente um caos.

Ser eu não é fácil.

Aliás, ser mulher, preta, pobre e sozinha no mundo... é guerra todo dia.

Puxei a mochila pra frente do corpo e comecei a procurar a chave da porta.

Já era noite, a rua vazia. Só o som das motos lá longe e as risadas da molecada nas vielas.

- Cadê essa porcaria? - resmunguei, revirando a bolsa. - Era só o que me faltava!

Suspirei fundo, sentei no degrau da porta e comecei a tirar tudo de dentro da mochila. Caderno, estojo, agenda, fone de ouvido embolado, tudo bagunçado. Quando finalmente achei as benditas chaves, escutei o barulho de moto parando bem do lado da minha casa.

Nem precisei olhar. Já sabia quem era.

Tuka.

Levantei do chão e bati a poeira da roupa. Quando encarei ele, lá estava: o mesmo sorrisinho cara de pau de sempre.

- Vim pra conversar contigo, gata! - falou se encostando na moto.

Cruzei os braços.

- Sério?! Que coisa... E quem disse que eu quero conversar contigo, um?

- Para com isso, pô! Tu sabe que eu não gosto de ficar brigado contigo. Vamo resolver isso?

- E se eu não quiser "resolver" nada dessa vez, um? - soltei o ar pesadamente. - Sinceramente, Tuka, eu tô cansando desse nosso joguinho de vai e vem. Cansa.

Ele me olhou sério, mas com aquele jeitinho dele de sempre que tentava quebrar qualquer raiva que eu tivesse.

- Qual foi? Eu vim te pedir desculpa por ter sido babaca contigo ontem. Me desculpa, vai?

- Ah, jura? - abri a porta com a chave e olhei por cima do ombro. - Você não vai desistir disso, né?

- É... tu sabe que eu sou teimoso. Só saio daqui depois de ouvir da tua boca que você me desculpou.

- Você é chato demais! - entrei em casa e deixei a porta aberta. - Vai entrar ou não?

Ele abriu o portão e entrou, como se fosse a casa dele. Sentou no sofá com aquela cara lavada.

- Tava com saudade de tu, sabia? - falou se inclinando e beijando meu pescoço.

- Sai, eu tô toda suada! - empurrei ele. - Deixa eu tomar um banho e depois a gente conversa, pode ser?

- Pode ser... - ele se jogou no sofá e segurou minha mão. - Mas se tu quiser companhia no banho...

- Claro que não, seu idiota! - dei um tapa na mão dele e fui pro banheiro.

Depois do banho, voltei pra sala enrolada na toalha. Ele ainda tava no mesmo lugar, com os pés em cima do sofá.

- Tira os pés do meu sofá! - bati de leve nas pernas dele.

- Chatona!

Sentei do lado e ele deitou a cabeça no meu colo, todo pidão. Comecei a fazer um cafuné, porque, no fundo, eu também tava com saudade.

- Fiquei sabendo da tua madrinha... Como andam as coisas?

- Como sempre né, só que pior. Ontem a dona Leila demitiu a Vanessa por causa das faltas. E nem era culpa dela. Aquela bruxa sabia e mesmo assim mandou ela embora.

- Se tu quiser, eu posso dar um jeito nisso. É só tu me pedir que eu empresto o dinheiro pro tratamento dela.

Aquela frase fez o cafuné parar na hora.

- Sem chance disso rolar, Tuka. A Vanessa não gosta de você, e você sabe disso. Ela nunca aceitaria dinheiro vindo de você. E, sinceramente? Nem eu.

- Vê isso como um empréstimo. Depois tu me paga. Eu nem cobro juros, pô.

- Já disse que não! - falei mais alto. - É melhor você parar de insistir nisso, senão eu vou acabar me irritando contigo.

- Chatona...

- Tu sabia que eu era chata desde o começo! Se não gostou, compra um coelho e põe no meu lugar.

Ele riu.

- Da onde tu tira essas merdas, Rubi? - me puxou pra perto.

- Sai, menino! - tentei me soltar, mas ele me segurou.

- Tu parece uma criancinha, sabia?

- Melhor parecer criança do que parecer bandido! - retruquei, meio brincando, meio não.

Mas a verdade é que aquela oferta dele mexeu comigo.

Porque no fundo... eu sabia que se eu dissesse sim, ele realmente daria o dinheiro.

Dinheiro sujo.

Dinheiro de sangue.

Dinheiro que pode salvar a vida da minha madrinha...

Mas que também poderia sujar a minha.

E eu? Eu não queria isso.

Não queria dever nada a ele.

Nem ao mundo que ele vivia.

Por isso, eu resistia.

Mas por quanto tempo mais?

            
            

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