Quando o Amor Deixa de Ser Nosso
img img Quando o Amor Deixa de Ser Nosso img Capítulo 2 A Proposta
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Capítulo 8 A Foto Que Mudou Tudo img
Capítulo 9 O Gosto Amargo da Liberdade img
Capítulo 10 As Regras do Jogo Que Ele Criou img
Capítulo 11 O Peso do Silêncio img
Capítulo 12 O Ensaio do Que Já É Real img
Capítulo 13 Quando Fingir Vira Verdade img
Capítulo 14 O Que Escapa do Controle img
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Capítulo 2 A Proposta

A casa ainda cheirava a comida fria.

As velas haviam se apagado há horas, deixando um rastro de cera sobre a toalha branca. O vinho seguia intocado na taça, refletindo as luzes suaves da sala.

Clara estava sentada no sofá, imóvel. O mesmo vestido preto, o cabelo já meio solto, o rosto sem expressão. Não havia lágrimas, só um cansaço profundo, quase silencioso.

O relógio marcava quase meia-noite quando ela ouviu o som da chave girando na fechadura.

Arthur entrou devagar, como quem teme o próprio eco.

- Clara... - ele chamou, a voz rouca, insegura.

Ela não respondeu. Apenas levantou o olhar e o encarou.

Por um instante, o silêncio pareceu uma punição. Ele fechou a porta, respirou fundo e se aproximou, os passos pesados no piso de madeira.

- Eu posso explicar... - começou, hesitando. - Não é o que você pensa.

Clara soltou um riso curto, sem humor.

- Não é o que eu penso? Você estava jantando com outra mulher no lugar onde a gente comemorava o nosso amor, Arthur. O que mais eu preciso pensar?

Ele passou a mão pelos cabelos, nervoso.

- Eu errei, tá? Eu... eu não queria que você descobrisse assim.

- Então o erro não foi trair - foi eu ter visto, é isso?

Arthur fechou os olhos por um instante.

- Eu não sei o que aconteceu. Eu me senti... preso, sufocado. A rotina, o trabalho, tudo igual. Eu te amo, Clara, mas eu preciso respirar.

Ela o olhou, sem raiva, sem gritar. E isso o desarmou mais do que qualquer ataque.

- Você precisava respirar, e por isso escolheu outra mulher?

- Eu não escolhi - respondeu rápido. - Aconteceu. As coisas acontecem.

- Não - ela corrigiu, calma. - As coisas não "acontecem". Você escolhe. Você decidiu mentir pra mim, decidiu sair com ela, decidiu me enganar.

Arthur ficou em silêncio. Caminhou até o aparador e serviu um pouco de whisky, tentando parecer no controle, mas a mão tremia.

- Eu só queria que você me entendesse - disse, sem encará-la. - Que entendesse que eu não quero perder o que a gente tem.

Clara o observava com uma serenidade quase cruel.

- E o que a gente tem, Arthur?

Ele demorou a responder.

- Uma história. Uma vida. Cinco anos juntos. Eu não quero jogar isso fora. Eu só... - engoliu em seco - eu só quero liberdade.

Ela arqueou a sobrancelha.

- Liberdade?

Arthur se virou, os olhos marejados.

- Talvez o que esteja faltando pra gente seja... abrir o casamento.

A frase caiu no ar como uma pedra.

Clara piscou devagar, tentando entender se ele realmente tinha dito aquilo.

- Um casamento aberto? - repetiu, em voz baixa.

- Sim - ele disse, com firmeza repentina. - Tem casais modernos que fazem isso, que se permitem viver outras experiências sem que o amor acabe. Eu te amo, Clara. Só acho que a gente precisa... se reinventar.

Ela ficou em silêncio.

Ele interpretou o silêncio como choque e tentou avançar:

- Seria um acordo. Um recomeço. Eu juro, eu quero continuar com você.

Clara levantou-se devagar. O som do tecido do vestido deslizando contra o sofá pareceu amplificar o momento. Ela caminhou até ele, devagar, os olhos fixos nos dele.

- Você quer um casamento aberto, Arthur?

- Quero que a gente tenha espaço pra respirar. Que possamos ser livres sem acabar um com o outro.

Clara o observou por longos segundos.

Então, para total surpresa dele, ela assentiu.

- Está bem.

Arthur piscou, confuso.

- O quê?

- Está bem - repetiu, firme. - Você quer um casamento aberto, então vai tê-lo.

Ele deu um passo pra trás, atônito.

- Clara, eu não disse isso pra te machucar. Eu só... eu não achei que você fosse aceitar.

Ela esboçou um sorriso frio.

- Pois é. Você nunca acha que eu seria capaz de nada, não é? Nem de te enfrentar, nem de te deixar, nem de aceitar isso.

Fez uma pausa. - Mas adivinha? Eu aceitei.

Arthur a encarou, sem entender.

- Você tá falando sério?

- Mais do que nunca - respondeu, com uma calma que parecia perigosa. - A partir de amanhã, estamos "abertos". Você vive como quiser. E eu também.

Ele a olhou, surpreso, tentando decifrar se ela falava por impulso ou vingança.

Mas Clara apenas se virou, caminhando até o corredor.

Antes de desaparecer no quarto, disse sem olhar pra trás:

- Boa noite, Arthur. E boa sorte com a sua liberdade.

A porta se fechou devagar.

Arthur ficou parado na sala, com o copo ainda na mão, o som do relógio ecoando como um lembrete cruel.

Ele achou que dominava o jogo, mas, sentiu medo.

            
            

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