O Rato Nas Sombras: Sua Queda
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Capítulo 3

Clara POV:

Cheguei em casa uma hora antes de Bruno. O apartamento estava escuro, silencioso, um contraste gritante com a cena caótica que eu havia deixado para trás. Sentei-me no sofá da sala, a única luz vindo do brilho da cidade do lado de fora da janela. O silêncio era pesado, mas era melhor que o barulho.

A chave de Bruno girou na fechadura. O clique suave ecoou no silêncio. Ele entrou, suspirando pesadamente ao fechar a porta. Ele não me viu a princípio, apenas caminhou direto para a cozinha. Então ele parou.

Ele deve ter me sentido na escuridão. Ele se aproximou, veio por trás de mim e envolveu meus braços em volta da minha cintura. Seu queixo repousou no meu ombro, sua respiração quente contra meu pescoço. Ele tentou se aninhar no meu cabelo.

"Clara", ele murmurou, sua voz suave, quase hesitante. "Sobre hoje..." Ele fez uma pausa, procurando as palavras.

"Eu quero o divórcio, Bruno", eu disse, minha voz vazia, cortando sua tentativa de reconciliação. Meu corpo enrijeceu em seu abraço.

Ele ficou rígido. Seus braços se apertaram ao meu redor, espremendo quase dolorosamente. "Não seja ridícula, Clara", ele zombou, a voz tensa. "Foi uma emergência. O Léo estava machucado. A Isabela estava desesperada." Ele tentou descartar, minimizar, como sempre fazia. "Eu estava apenas sendo um médico, um amigo. Você sabe como a Isabela é, ela exagera em tudo. Não foi nada."

Eu não me virei. "Você sabe que não foi nada, Bruno. Você sabe exatamente o que foi."

Ele franziu a testa, seu aperto afrouxando ligeiramente. "A Isabela é só... uma amiga. Uma amiga de longa data. Nos conhecemos desde o colégio. Não há nada mais do que isso." Ele tentou me acalmar, sua mão acariciando meu braço. "Vou fazer o jantar para nós. Algo especial. Que tal?"

Ele se inclinou, tentando beijar meu pescoço. Seus lábios estavam frios. Eu não senti nada. Ele pareceu perceber também, recuando um pouco.

"Você precisa descansar agora", disse ele, sua voz mudando para um tom de médico. "O cuidado pós-procedimento é fundamental. Sem estresse, lembra? Eu cuido de tudo."

Uma risada amarga borbulhou dentro de mim. Ele achava que eu tinha seguido em frente com o procedimento. Ele nem sabia. Ele não tinha perguntado. Ele não se importou o suficiente para perguntar.

Lembrei-me por que me apaixonei por ele. Ele era charmoso, brilhante, confiante sem esforço. Ele tinha um jeito de me fazer sentir como se eu fosse a pessoa mais importante do mundo. Ele uma vez me disse, sob o brilho suave de um poste de luz depois de um turno noturno, que admirava minha dedicação, minha paixão por salvar crianças. Ele disse que éramos duas metades de um todo ambicioso, destinados a mudar o mundo, um paciente de cada vez.

No dia do nosso casamento, todos nos chamavam de casal poderoso. Dra. Clara Benevides, oncologista pediátrica. Dr. Bruno Benevides, cirurgião plástico das celebridades. Éramos perfeitos, no papel.

Ele foi para a cozinha, o barulho de panelas e frigideiras preenchendo o silêncio. Observei suas costas largas, o jeito como seus ombros se moviam enquanto ele picava legumes. Ele parecia tão doméstico, tão... normal.

"Bruno", eu disse, minha voz cortando os ruídos da cozinha. "Eu não vou aceitar a bolsa de pesquisa clínica."

Ele parou, a faca imóvel. "O quê? Por que não? É uma oportunidade enorme." Ele se virou, o rosto intrigado.

"Envolve viagens internacionais, muito tempo fora", expliquei, a mentira com um gosto amargo na minha língua. "E com a gente tentando ter um bebê... simplesmente não funcionaria."

Ele deu de ombros, retomando o corte. "Bem, tudo bem. Você sempre pode se candidatar a uma posição menos exigente. Talvez algo administrativo? Ou apenas tirar uma folga. Você trabalhou duro, Clara. Você merece relaxar. Apoie-se em mim."

Ele se virou, um leve sorriso no rosto, mas seus olhos estavam estreitos, quase predatórios. "Nós não vamos nos divorciar, Clara", disse ele, a voz firme, inabalável. "Nossa família vai ficar bem." Ele se virou de volta para o fogão, o óleo crepitante agora enchendo o ar com o cheiro de alho e arrependimento.

Eu não disse nada, minha mão tocando inconscientemente minha barriga, onde as marcas das agulhas estiveram uma vez. A dor fantasma era aguda.

"A maior conquista de uma mulher são seus filhos", minha sogra me disse uma vez, seus olhos percorrendo meus diplomas de medicina pendurados na parede. "Todo o resto é secundário."

Se eu desistisse da minha carreira, se eu entregasse minha identidade profissional, o que me restaria? Que poder eu teria quando ele inevitavelmente partisse meu coração de novo? Eu me tornaria apenas mais um de seus acessórios, outra esposa-troféu numa gaiola dourada. Eu nem teria base legal para lutar por nosso filho, se chegasse a esse ponto.

Suas tentativas de reconciliação, suas promessas, pareciam um poço mais fundo, uma areia movediça que me engoliria por inteiro. A ideia dele, de nós, recomeçando, parecia uma piada cruel.

"Nossa família vai ficar bem", ele havia dito. Mas eu sabia a verdade. Nossa família era uma fachada cuidadosamente construída, bonita para o mundo exterior, mas oca e podre por dentro. E esta noite, ela finalmente desmoronou.

            
            

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