Junto com as provas, havia um acordo de divórcio pré-redigido. Era surpreendentemente simples, me concedendo a guarda do nosso filho, uma pensão generosa e uma parte significativa dos bens de Heitor. Era quase bom demais para ser verdade. Meu ajudante anônimo cobriu todas as bases.
Kátia enviou outra mensagem: *Encontrou minha pequena surpresa? O Heitor é bem apaixonado, não é?* Uma onda de náusea me invadiu. Ela estava me provocando. Ela sabia que eu sabia.
Olhei para os papéis do divórcio sobre a mesa de mogno polido, minha mão tremendo ao pegar a caneta. Parecia pesada, como uma arma. Meu coração era uma coisa machucada no meu peito.
Lembrei-me de Heitor, um garoto imprudente de dezesseis anos, correndo com seu carro velho na chuva torrencial para me buscar em uma festa. Ele bateu o carro, quebrou o braço, mas ainda assim se certificou de que eu estava bem primeiro. "Você se machucou, Rory?", ele perguntou, o rosto pálido de dor, ignorando o próprio braço ensanguentado.
Ele era meu herói naquela época. Era para ele que eu corria, quem me fazia sentir segura. Ele era tudo. Esse sentimento, essa certeza absoluta, era uma parte profunda e inabalável de mim. Como eu poderia arrancar isso? Parecia amputar um membro.
A ideia de viver sem ele, sem a vida que construímos, era um cânion vasto e vazio. Estendia-se diante de mim, escuro e aterrorizante.
Meu celular vibrou novamente. Kátia: *Ainda enrolando? Heitor acabou de sair para a 'reunião tarde da noite' dele comigo. Temos champanhe.*
Então, uma mensagem de Heitor: *Trabalhando até tarde, amor. Um grande negócio surgindo. Não me espere acordada. Te amo.*
A palavra "amo" tinha gosto de cinzas. Peguei a caneta, minha mão não tremia mais. Ela se moveu rapidamente, decisivamente, pela linha pontilhada. Minha assinatura. Aurora Mendes.
Estava feito. O ar saiu dos meus pulmões em um suspiro trêmulo. Uma estranha mistura de vazio e uma aterrorizante sensação de liberdade me invadiu.
Mais tarde naquela noite, a babá me trouxe um copo de leite morno. "O Sr. Bastos disse que isso a ajudaria a dormir, senhora", ela disse suavemente, seus olhos cheios de preocupação.
Heitor. Sempre o marido atencioso. Ele costumava preparar chás de ervas especiais para mim, medidos com precisão, para ajudar com meu estômago frágil na faculdade. Ele até aprendeu a massagear minhas têmporas do jeito certo para aliviar minhas dores de cabeça tensionais. Ele tinha sido tão atencioso, tão carinhoso.
Soltei uma risada áspera e quebrada. Uma única lágrima traçou um caminho pela minha bochecha. O cuidado, a atenção, tudo era uma performance agora. Uma mentira.
Não dormi um pingo naquela noite. Na manhã seguinte, vesti o terno mais elegante que eu tinha, os papéis do divórcio apertados na minha mão. Meu corpo parecia fraco, mas minha determinação era de ferro. Eu tinha que enfrentá-lo.
Cheguei ao Grupo Bastos, a torre reluzente do poder de Heitor. Kátia já estava lá, empoleirada na beirada da mesa de mogno de Heitor, um sorriso de escárnio nos lábios. Ela me olhou, seus olhos brilhando com triunfo.
"Ora, ora, se não é a Sra. Bastos", Kátia ronronou, pegando o pesado selo corporativo de Heitor. Ela carimbou um documento com um floreio, depois jogou o selo de volta na mesa. "Bem na hora. A propósito, o acordo entra em vigor hoje. Fiz questão de agilizar."
Lembrei-me de Heitor se recusando a me deixar tocar em seu selo, dizendo que era "propriedade da empresa, importante demais". Agora, essa mulher, sua amante, o manuseava com tanto descaso. A hipocrisia era uma ferida fresca.
"Você realmente acha que venceu, Kátia?", perguntei, minha voz plana, desprovida de emoção. Eu sabia que a raiva era inútil agora. Só servia para alimentá-la.
Ela riu, um som frágil. "Ah, Aurora. Eu sempre venço. Você só demorou mais para perceber." Ela empurrou o acordo de divórcio selado pela mesa em minha direção. "Aqui está, querida. Seu bilhete para a liberdade. E para a minha."
Peguei os papéis. Meu olhar encontrou o dela. "Aproveite sua vitória, Kátia", eu disse, minha voz baixa. "Mas lembre-se, o mundo dá voltas."
Virei-me para sair, as pesadas portas do escritório de Heitor se aproximando. Assim que as alcancei, elas se abriram e Heitor entrou. Ele parou abruptamente, seus olhos se estreitando quando me viu.
"Aurora? O que você está fazendo aqui?" Seu tom era ríspido, impaciente. Ele não estava satisfeito.
Então ele viu Kátia, seu rosto se suavizando imediatamente. Ele passou por mim como se eu fosse invisível, seu braço envolvendo a cintura de Kátia. "Kátia, meu amor, você não precisava me esperar. Você parece exausta." Ele pressionou um beijo em sua têmpora. "Você tem trabalhado tanto neste projeto."
Um cheiro enjoativo me atingiu. Era o sabonete líquido caro de Kátia. Estava impregnado em Heitor, uma manifestação física da traição deles. Meu estômago se contraiu. Eu precisava sair. Agora.
"O que é isso que você tem aí?", Heitor perguntou, seus olhos finalmente pousando nos papéis em minha mão. Sua testa se franziu ao ver o selo vermelho em negrito.