Ele me apertou mais forte, seu aperto doloroso. "Não seja ridícula. Esta é a sua casa. Nossa casa. E quanto ao nosso filho? Quem vai cuidar dele se você fugir para a casa dos seus pais?" Ele tentou injetar preocupação em sua voz, mas soou oco, manipulador.
"Eu vou levar nosso filho comigo", afirmei, minha voz firme apesar da fraqueza em meu corpo.
Seus olhos brilharam com algo que eu não consegui decifrar - pânico? Raiva? Ele não disse mais uma palavra, mas seu aperto em mim se intensificou ainda mais. Seu ritmo acelerou, me carregando rapidamente em direção à saída.
"Heitor! Onde você vai?" A voz de Kátia, afiada e exigente, cortou a noite. Ela estava correndo atrás de nós. Mas ele nem sequer olhou para trás. Ele apenas continuou se movendo.
De repente, Kátia gritou, um som agudo e teatral. "Heitor! Cuidado!" Ela correu para a rua movimentada, diretamente no caminho de um táxi que vinha vindo.
Heitor, sem um momento de hesitação, me jogou de seus braços. Minha cabeça bateu na borda afiada de um vaso de pedra, uma dor lancinante explodindo atrás dos meus olhos. O sangue jorrou imediatamente, quente e pegajoso, pelo meu rosto. Antes que eu pudesse registrar a dor, uma moto em alta velocidade, desviando de Kátia, me atingiu. Fui arremessada, meu corpo uma boneca de pano jogada no ar. Um clarão ofuscante, depois uma dor lancinante na minha perna.
Através da névoa turva e agonizante, eu vi Heitor. Ele havia segurado Kátia. Ele a segurava com força em seus braços, acariciando seu cabelo. "Meu amor, você se machucou?", ele murmurou, sua voz grossa de preocupação. Kátia enterrou o rosto em seu peito, soluçando melodramaticamente. "Oh, Heitor, pensei que ia morrer! Você me salvou!"
Ele a beijou, um beijo longo e terno, bem ali no meio do caos que ele havia criado. Ele me jogou fora. De novo. Ele a escolheu. De novo.
A dor na minha cabeça, na minha perna, foi eclipsada pela agonia em meu coração. Meu amor por ele, que teimosamente se agarrava à vida, finalmente murchou e morreu. Foi uma morte fria e dura.
A escuridão me consumiu.
Acordei em um quarto branco e estéril, o bipe rítmico das máquinas minha única companhia. Eu estava na UTI. Dias haviam se passado. Minha cabeça latejava, minha perna direita estava envolta em um gesso pesado.
Heitor estava largado em uma cadeira ao lado da minha cama, a cabeça apoiada no peito, fingindo dormir. Seu rosto estava pálido, a barba por fazer escurecendo sua mandíbula. Ele parecia cansado. Uma pontada de algo parecido com pena, rapidamente suprimida, agitou-se dentro de mim.
Lembrei-me dele como um menino, tão vibrante, tão cheio de vida. Seus olhos, sempre brilhando com travessura. Agora, eles estavam sombreados por algo feio, algo que eu não reconhecia mais. Seu rosto, antes tão bonito, agora parecia distorcido, quase monstruoso.
Um soluço suave escapou dos meus lábios, um som que eu não pretendia fazer. Sua cabeça se ergueu. Ele piscou, seus olhos se arregalando quando me viu. "Aurora! Meu Deus, você está acordada!" Ele se lançou para frente, pegando minha mão. "Você está com dor? Onde dói?" Sua voz era frenética, tingida de uma preocupação performática.
"Isso tudo é culpa sua", ele acusou, sua voz baixando para um sussurro áspero. "Sua exigência ridícula de ir para a casa dos seus pais. Foi isso que causou este acidente."
Meu coração, já morto, não sentia nada além de um vazio frio. Ele estava me culpando. Por sua escolha. Por sua traição.
"Foi a sua amante que causou isso!", eu engasguei, minha voz rouca. "Ela se jogou no trânsito!"
A menção do nome de Kátia fez seu rosto se fechar. Seus olhos endureceram. "Não se atreva a falar da Kátia assim!", ele cuspiu, sua voz cheia de veneno. "Ela estava apavorada! Ela é delicada! Você é quem está sempre tão dramática, tão histérica. Ela não tem sido nada além de um doce, uma verdadeira profissional. Você precisa aprender com ela, Aurora. Ela é graciosa. Você é apenas... uma bagunça."
Lágrimas escorriam pelo meu rosto, quentes e furiosas. A injustiça, a pura audácia de suas palavras, era sufocante.
Ele revirou os olhos. "Ah, pelo amor de Deus, pare de chorar. Sempre chorando. Kátia nunca chora. Ela lida com suas emoções. Você deveria tentar. Seja como ela. Digna." Ele se levantou, andando de um lado para o outro no pequeno quarto. "Sabe de uma coisa? Vou divulgar uma declaração. Um pedido de desculpas público seu para a Kátia. Por acusá-la, por ser tão... indelicada."
Minha visão turvou. Minha cabeça latejou. Eu não conseguia respirar. Meu monitor cardíaco gritou, as luzes vermelhas piscando descontroladamente.
O celular de Heitor vibrou. Ele o pegou, seu rosto se abrindo em um largo sorriso. "Kátia, meu amor! Você está bem?" Ele saiu do quarto, sua voz sumindo enquanto falava doces palavras para ela. "Estou chegando. Estou a caminho."
Ele foi embora. Eu estava sozinha. De novo. Os monitores gritavam mais alto. Enfermeiras correram para dentro. A última coisa que vi foram os rostos aterrorizados da equipe médica antes que a escuridão me consumisse mais uma vez. Eu estava sendo levada para a emergência. Ninguém estava comigo.