Eu observei, entorpecida, enquanto eles discutiam seus planos como se eu não estivesse ali, como se minha vida não estivesse prestes a ser arrancada de novo. Eles tinham vindo para nossa ilha tranquila para uma "lua de mel", mas eu sabia o verdadeiro motivo: me arrastar de volta para sua gaiola dourada. Ele precisava de mim para abafar os rumores, para limpar sua bagunça.
"Vamos ficar aqui", declarou Heitor, seu olhar varrendo meu pequeno barraco de pescador - o único lar que eu conheci por dois anos. "É... rústico."
Isabela parecia horrorizada, seu nariz se enrugando com o cheiro de peixe e maresia que impregnava tudo. "Aqui? Heitor, querido, cheira a... como se um mercado de peixe tivesse explodido aqui dentro. Meu enjoo matinal não aguenta isso." Ela agarrou sua barriga arredondada dramaticamente, depois se curvou, vomitando ruidosamente nos arbustos do lado de fora da minha porta.
Eu a encarei, um nó frio se formando no meu estômago. Grávida. Claro. Outro lembrete do que eu havia perdido.
"Se você não gosta, tem uma balsa de volta para o continente em uma hora", eu disse, minha voz mais afiada do que eu pretendia. "Ninguém está te forçando a ficar."
A cabeça de Heitor se ergueu bruscamente, seus olhos faiscando de irritação. "Ayla, cuidado com o seu tom! Isabela é sensível. Você sempre teve essa veia cruel, implicando com ela quando ela estava vulnerável."
Sua acusação era tão absurda, tão completamente invertida, que eu quase ri. Não era Isabela que era vulnerável naquela época. Era eu. Sempre eu. Mas ele havia reescrito a história em sua mente, me pintando como a vilã e Isabela como a vítima perpétua. Uma parte de mim esperava que Isabela aceitasse meu conselho e fosse embora, que este pesadelo terminasse tão rápido quanto começou. Mas isso era ingenuidade. Este era Heitor. Ele nunca desistia até conseguir o que queria.
"Nós vamos ficar", disse Heitor, cortando os protestos fracos de Isabela. Ele entrou na minha pequena sala de estar, já tomando posse. Ele arrancou uma tapeçaria desbotada da parede, jogando-a no chão. "Isso vai servir." Ele chutou uma pilha dos meus livros gastos para um canto. Ele estava me apagando, pedaço por pedaço.
Uma onda amarga de resignação me invadiu. Eu me movi para arrumar os itens espalhados, minhas mãos tremendo um pouco. Meu olhar caiu sobre um frasco velho e fechado de perfume de lavanda em uma prateleira, um presente do meu salvador, Mateus. Ele me disse que era para me ajudar a dormir, para acalmar os pesadelos. Eu nunca o usei, com medo de alterar o cheiro simples do mar que agora me definia. Mas agora, com o vômito teatral de Isabela e a presença sufocante de Heitor, eu precisava de algo. Abri o frasco, o cheiro forte enchendo o pequeno espaço.
Isabela vomitou de novo, um som seco e doloroso. Heitor correu para o lado dela, sua expressão tingida de medo genuíno. "Isabela? O que há de errado? Você está bem?" Ele acariciou seus cabelos, sua voz cheia de uma ternura que eu nunca tinha ouvido dirigida a mim.
Meu coração parou no peito. Algo estava realmente errado.
"É o bebê, Heitor!", Isabela ofegou entre os espasmos, lágrimas escorrendo pelo seu rosto. "Eu acho... eu acho que algo está errado!"
O rosto de Heitor ficou pálido. "O bebê?", ele sussurrou, sua voz falhando. "Você... você está grávida?"
Isabela assentiu, soluçando. "Sim! Íamos te contar na nossa lua de mel de verdade, mas eu tenho estado tão enjoada..."
O mundo girou. Grávida. A palavra ecoou em minha mente, um sussurro cruel e zombeteiro. Instintivamente, agarrei a mesa de madeira resistente para me firmar, meus joelhos fracos. O tempo, ao que parecia, tinha mudado tudo para eles. E nada para mim.
Minhas próprias memórias, nítidas e dolorosas, voltaram com tudo. Dois anos atrás, naquele iate amaldiçoado, eu também estava grávida. Uma vida minúscula e frágil crescendo dentro de mim. "Heitor", eu sussurrei, minha voz tremendo com uma esperança que eu não sabia que possuía. "Estou grávida."
Sua reação na época foi um aceno displicente, seus olhos focados em seu celular. "Sério, Ayla? Agora? Você sabe como a Isabela está estressada. A família dela está passando por um momento difícil. Isso não é justo com ela."
Não era justo com Isabela. Meu bebê. Minha esperança. Ele exigiu que eu interrompesse a gravidez. "Isabela precisa de mim", ele disse, sua voz fria e inabalável. "O bem-estar dela é primordial. Você pode ter outro filho mais tarde. Este não é o momento certo."
Então, o acidente. A luta frenética. Sua mão me empurrando, sua voz gritando: "Pegue o colete salva-vidas, Isabela! Você carrega o meu futuro!" Um chute forte na minha barriga, uma tentativa desesperada de afastar uma Isabela em pânico. A dor lancinante. O sangue. A água fria e escura. Meu bebê, perdido. Tudo por Isabela. Tudo pelo futuro que ele imaginava.
Agora, Isabela estava diante de mim, sua barriga uma curva proeminente, um símbolo do futuro deles, de tudo que me foi negado. O contraste foi um golpe físico. Eu não conseguia respirar. Saí correndo do barraco, rasgando a grama alta, para longe da presença sufocante da felicidade deles.
"Ayla! Espere!", a voz de Heitor cortou o ar da noite, surpreendentemente urgente. Ele me alcançou facilmente, sua mão no meu braço novamente. "Ayla, volte para casa. Por favor."
Casa. Ele ousava usar essa palavra.