- Victor, querido, venha almoçar conosco - disse a cunhada, tocando-lhe o braço com delicadeza.
- Sim, claro - ele respondeu, sem demonstrar mais do que um leve sorriso. A vontade de lhe dizer que entrar no seu quarto sem bater não era correto estava ali, mas ele deixou para um outro momento. Tadinha, ela estava sofrendo demais para perceber o quanto a falta de limites também estava desgastando a dinâmica deles.
Na sala de jantar, ele a observava, ainda tão abatida. Seus olhos estavam cansados, e o rosto, marcado pela tristeza. Ele se inclinou à frente da mesa e falou com uma voz suave, mas firme:
- Você precisa voltar a ser quem era. Volte a se cuidar. Vá ao Pilates, faça suas massagens, volte ao salão. Não pode deixar que tudo a consuma assim.
Ela olhou para ele com um olhar vazio, e a expressão de desgosto tomou seu rosto.
- E meus filhos? Não tenho quem cuide deles, os empregados mal conseguem dar conta...
Victor, vendo a tristeza em seus olhos, suspirou e tomou sua mão sobre a mesa.
- Não se preocupe com isso. Eu vou contratar uma babá.
Ela sorriu, um sorriso triste e agradecido.
- Ah, obrigada, Victor querido - ela disse, apertando a mão dele antes de se recostar na cadeira.
Victor sorriu de volta, mas a verdade era que seu sorriso estava vazio. Ele puxou a mão de volta delicadamente e voltou a comer, tentando se concentrar na comida, mas sua mente estava longe.
***
Victor entrou em seu escritório, fechando a porta com um suspiro. Sentou-se atrás da mesa e, com a ponta dos dedos, passou por sua tela do computador até encontrar o número que procurava. Seu melhor amigo, Felipe, sempre fora a pessoa a quem ele recorria quando precisava de algo.
- Felipe? Tudo bem? - disse ele ao telefone, tentando soar tranquilo. - Preciso de uma ajuda... Estou pensando em contratar uma babá para meus sobrinhos. Você conhece alguém?
Do outro lado, a voz de Felipe foi imediata e descontraída.
- Claro, cara! Minha prima acabou de chegar ontem do Canadá. Ela é ótima, super responsável.
Victor pensou por um momento, antes de responder, com uma leve preocupação.
- Embora minha família fale inglês, prefiro manter o idioma local. Acho que seria mais adequado.
Felipe riu, sem mostrar qualquer dúvida.
- Fica tranquilo, meu amigo. Ela fala português fluente, nem parece que nasceu no Canadá. Você vai gostar dela, tenho certeza.
Victor sorriu ligeiramente, aliviado, com a sensação de que sua vida estava prestes a mudar novamente.
- Beleza, Felipe. Se você puder mandar o número do telefone, vou entrar em contato com ela.
- Claro! Vou te passar os detalhes. Fique tranquilo, vai dar tudo certo.
Victor desligou o telefone e olhou pela janela mais uma vez, pensativo. A ideia de trazer uma nova pessoa para dentro de sua casa o deixava inquieto. Mas, por ora, não havia outra opção. Ele precisava de alguém em quem pudesse confiar, para que sua cunhada pudesse ter o espaço necessário para se recuperar de sua perda.
Victor recebeu a mensagem de Felipe quase imediatamente com o número de telefone da prima dele. Sem perder tempo, discou e esperou, ouvindo os toques do outro lado da linha. Quando a chamada foi atendida, uma voz suave e educada respondeu:
- Alô?
- Boa tarde. É Isabelle? - perguntou ele, mantendo seu tom firme e cordial.
- Sim, sou eu. Quem fala? - A voz dela era tranquila, com um leve tom de curiosidade.
- Meu nome é Victor Mendonça. Felipe, seu primo, me deu o seu contato. Preciso de uma babá para meus sobrinhos, e ele falou muito bem de você. Gostaria de saber se tem interesse no trabalho.
Houve uma breve pausa do outro lado.
- Ah, claro. Tenho interesse, sim. Pode me contar um pouco mais sobre as crianças e as responsabilidades?
Victor ajeitou-se na cadeira, olhando para o monitor do computador à sua frente, onde um lembrete piscava com reuniões marcadas no escritório da empresa.
- São dois. Uma menina de sete anos e um menino de cinco. São educados, mas, como qualquer criança, precisam de atenção e disciplina. Minha cunhada está passando por um momento difícil, e preciso que você assuma algumas tarefas básicas com eles: brincadeiras, supervisão de estudos e organização da rotina. Não se preocupe, você terá todo o suporte necessário.
Isabelle sorriu do outro lado da linha, a voz dela agora mais calorosa.
- Parece ótimo. Eu adoraria ajudar.
Victor respirou fundo. Era isso. Ele confiava em Felipe e, sinceramente, precisava resolver a situação o quanto antes.
- Excelente. Pode começar amanhã?
- Sim, sem problemas. Onde estão localizados? - perguntou Isabelle.
Victor forneceu o endereço da mansão, explicando que um motorista estaria disponível para buscá-la, se necessário.
- Não precisa se preocupar, eu consigo chegar. Até amanhã, senhor Mendonça.
Victor encerrou a chamada e, por um momento, ficou olhando para o celular como se esperasse algo mais. Ele apoiou o aparelho sobre a mesa, recostando-se na cadeira. Um arrepio inesperado percorreu sua espinha, e ele balançou a cabeça, tentando afastar aquela sensação estranha.
- Isso é o que dá pensar só em trabalho. Estou enlouquecendo... - murmurou para si mesmo, passando uma mão pelo rosto.
Mas, por mais que tentasse ignorar, a voz de Isabelle continuava ecoando em sua mente. Havia algo naquele tom gentil e confiante que o havia desarmado. Ele se levantou, caminhando até a janela do escritório, observando o jardim impecável que se estendia até os muros da mansão.
- É só uma babá, Victor. Nada mais. - Ele tentou convencer a si mesmo, mas o desconforto persistia.
Ele passou o restante da tarde envolvido em reuniões e e-mails, mas, em intervalos, encontrava-se distraído, lembrando-se daquela breve conversa.
Naquela noite, durante o jantar, a cunhada percebeu que ele estava mais quieto que o normal.
- Tudo bem, Victor? Parece distante hoje.
Ele ergueu os olhos do prato e forçou um sorriso.
- Estou bem. Apenas cansado com o trabalho.
Ela assentiu, embora parecesse não totalmente convencida.
Depois do jantar, enquanto tomava um último café no escritório antes de se recolher, Victor releu as mensagens de Felipe no celular. Sentiu-se ridículo por estar tão inquieto.
- Amanhã tudo voltará ao normal. Ela vai começar, as crianças terão alguém para cuidar delas, e pronto. - Ele disse em voz alta, como se tentasse dar fim àquela inquietação.
Mas, no fundo, Victor sabia que algo estava diferente.