"A mulher que eu amo é a Lorena", ele disse. "Descobrir que você está grávida do meu filho a destruiria."
Ele pediu para sua assistente marcar a consulta e me mandou para a clínica sozinha. Lá, a enfermeira me disse que o procedimento tinha um alto risco de infertilidade permanente.
Ele sabia. E mesmo assim me mandou para lá.
Eu saí daquela clínica, decidida a ter o meu filho. Naquele exato momento, um alerta de notícia iluminou meu celular. Era um artigo radiante anunciando que Heitor e Lorena estavam esperando o primeiro filho, com direito a uma foto da mão dele pousada de forma protetora sobre a barriga dela.
Meu mundo desabou. Enxugando uma lágrima, encontrei o número para o qual não ligava há cinco anos.
"Pai", sussurrei, com a voz embargada. "Estou pronta para voltar para casa."
Capítulo 1
"O que você acabou de dizer?"
A pergunta pairou no ar do nosso apartamento minimalista, aquele que eu mesma tinha projetado. Minha voz era quase um sussurro.
Heitor Torres, meu namorado de cinco anos, nem sequer levantou os olhos do celular. Ele apenas repetiu, calmo e direto.
"Eu disse que a Lorena precisa que você assuma a culpa. Foi um atropelamento e fuga, Helena. Coisa pequena, ninguém se machucou gravemente, mas a carreira dela não aguenta um escândalo agora."
Eu o encarei, encarei o rosto bonito que amei por tanto tempo. Agora, parecia o de um estranho.
"Você quer que eu diga que estava dirigindo o carro dela? Que eu atropelei alguém e fugi?"
"Faz sentido", ele disse, finalmente erguendo os olhos. Eram frios, racionais. "Você é uma pessoa discreta, uma arquiteta. Não tem uma imagem pública para proteger. Você aguenta a pressão. A Lorena... ela é frágil."
Minhas mãos começaram a tremer.
"Frágil? Heitor, ela cometeu um crime. E a minha ficha? A minha carreira?"
"Não vai afetar sua carreira", disse ele, com um gesto displicente. "Nossos advogados vão cuidar de tudo. Uma multa, talvez um serviço comunitário. Não é nada."
Senti uma raiva fria subir pelo meu peito.
"Nada? Heitor, você tem noção do que está me pedindo? Eu deixei minha família por você. Abri mão do meu nome, da minha herança, de tudo, para que pudéssemos ter uma vida normal, longe da influência deles. Eu fiz isso por você."
"E eu agradeço por isso, Helena, de verdade", disse ele, suavizando a voz. Ele se levantou e veio em minha direção, tentando pegar minhas mãos. "É por isso que eu sei que você é forte o suficiente para fazer mais essa coisinha por nós. Por mim."
Ele estava perto agora, seu cheiro familiar preenchendo meus sentidos. Antes, me confortava. Agora, me dava enjoo.
"Tem outra coisa", eu disse, minha voz tremendo enquanto eu me afastava do seu toque.
Ele parou, um lampejo de irritação cruzando seu rosto.
"O que foi agora?"
"Estou grávida."
As palavras saíram, baixas, mas pesadas. Eu tinha acabado de descobrir naquela manhã. Tinha planejado um jantar romântico para contar, para comemorar.
Heitor congelou. Sua expressão encantadora desapareceu, substituída por um olhar que eu nunca tinha visto antes: um pânico frio e duro.
"Não", ele disse.
"Sim. Eu fiz o teste. Estou de seis semanas."
Ele passou a mão pelo cabelo perfeitamente penteado, andando de um lado para o outro.
"Isso é um desastre. Um desastre absoluto."
Eu ri, um som quebrado e oco. Lágrimas que eu não sabia que estavam ali começaram a escorrer pelo meu rosto.
"Um desastre? É o seu filho, Heitor."
"A Lorena não pode lidar com isso agora!", ele explodiu, virando-se para mim. "O estresse do acidente, a ansiedade dela... descobrir que você está grávida do meu filho a destruiria. Ela não é forte como você, Helena. Ela precisa do meu apoio total."
"Então sou eu que sou sacrificada? De novo?", as palavras saíram espremidas entre meus dentes. "Minha vida, minha reputação, e agora... nosso bebê?"
Ele parou de andar e me olhou, seus olhos agora carregando uma piedade assustadora.
"Não podemos ter este bebê. Não agora."
Meu mundo girou. O chão parecia ter sumido sob os meus pés.
"O que você está dizendo?"
"Estou dizendo que você precisa interromper a gravidez", disse ele, sua voz baixando para um tom baixo e persuasivo. "É o melhor. Para todo mundo. Assim que essa história com a Lorena passar, a gente tenta de novo. É só... um péssimo momento."
O ar me faltou. Ele estava falando do nosso filho como se fosse um compromisso inconveniente a ser remarcado.
"É seu filho, Heitor", sussurrei, minha voz rouca. "Seu sangue."
"E a Lorena é a mulher que eu amo!", ele gritou, sua compostura finalmente se quebrando. "Ela é sensível! Isso a destruiria! Você não consegue entender?"
Eu apenas o encarei, minha mente um muro em branco de dor. Depois de um longo e silencioso momento, um sorriso triste e distorcido se formou em meus lábios.
"Tudo bem", eu disse. "Tudo bem, Heitor."
Um alívio tomou conta do rosto dele. Ele não viu o vazio por trás dos meus olhos.
Nesse momento, o celular dele tocou, uma música pop animada que reconheci como um dos sucessos de Lorena. Ele atendeu imediatamente.
"Lô? Oi, meu amor, o que foi? Não chora, estou a caminho. Estou indo agora mesmo."
Sua voz era uma carícia gentil e amorosa. Uma voz que ele não usava comigo há anos.
Ele desligou e pegou as chaves, sem nem olhar para mim enquanto corria para a porta.
"Vou pedir para minha assistente marcar a consulta para você", disse ele por cima do ombro. "Só faça isso rápido."
Então ele se foi. A porta se fechou, me deixando em um silêncio que era mais alto que seus gritos.
No dia seguinte, eu estava na clínica. O ar cheirava a antisséptico e desespero silencioso. A enfermeira que pegou minhas informações me olhou com pena. Aquilo me deu arrepios.
Ela me entregou uma prancheta com um termo de consentimento. A assinatura dele já estava lá no final: Heitor Torres. Ele tinha assinado naquela manhã, antes mesmo de saber se eu concordaria. Ele tinha tanta certeza de mim.
"A médica quer que você saiba", disse a enfermeira suavemente, evitando meu olhar, "que devido a uma pequena complicação, este procedimento acarreta um alto risco de infertilidade futura. Existe a chance de você não conseguir engravidar novamente."
A prancheta escorregou dos meus dedos dormentes e caiu no chão com um baque.
Ele sabia. Ele devia saber. A médica teria contado para a assistente dele, e a assistente teria contado para ele. Ele sabia que isso poderia me deixar estéril, e mesmo assim assinou o formulário. Ele ainda me mandou aqui para apagar nosso filho e o meu futuro.
Mordi o lábio com força. O gosto metálico de sangue encheu minha boca, mas eu não senti nada. Apenas um vazio vasto e frio.
Eu estava pronta para ir em frente. Para acabar logo com isso, para arrancar o último pedaço dele de dentro de mim. Levantei-me para seguir a enfermeira.
E então eu senti.
Um tremor minúsculo, inconfundível, no fundo do meu ventre. Era muito cedo para um chute de verdade, a médica tinha dito. Mas eu senti. Um lampejo de vida, um protesto silencioso.
*Não me deixe ir.*
"Não", eu disse, minha voz alta e clara na sala silenciosa.
A enfermeira se virou, surpresa.
"Eu não vou fazer isso", eu disse, puxando meu braço. "Vou ficar com o meu bebê."
Saí daquela clínica, deixando o termo de consentimento no chão. O sol da tarde era ofuscante e, por um momento, senti uma onda de força. Eu tinha meu bebê. Era tudo o que importava.
Então, peguei meu celular. A tela se acendeu com um alerta de notícia de última hora de um site de fofocas de celebridades.
A manchete foi um soco no estômago: "Lorena Mattos e o Namorado Heitor Torres Esperam o Primeiro Filho! Fontes dizem que a cantora está radiante após um susto recente com a saúde."
O artigo estava cheio de fotos deles da noite anterior, saindo de um restaurante chique. Heitor a abraçava, com a mão protetoramente pousada em sua barriga lisa. Ambos sorriam, radiantes para as câmeras.
Abaixo do artigo, a seção de comentários era um esgoto.
"Quem é essa tal de Helena Ball? A que atropelou a pessoa com o carro da Lorena? Provavelmente alguma fã obcecada de quem o Heitor sentiu pena."
"Ouvi dizer que ela o persegue há anos. Ainda bem que ele finalmente está com alguém do nível dele."
"Ela parece tão sem sal. Claro que ele escolheu uma estrela como a Lorena. E agora eles estão começando uma família! Tão feliz por eles!"
Mordi meu lábio de novo, com mais força desta vez. Senti a pele se romper, o filete quente de sangue escorrendo pelo meu queixo. Mas eu ainda não conseguia sentir a dor. Eu estava completamente entorpecida.
Olhei para a minha própria barriga, e uma única lágrima rolou pela minha bochecha e caiu na minha mão.
"Está tudo bem", sussurrei para a pequena vida dentro de mim. "Eu vou te proteger. Eu prometo."
Enxuguei o rosto, minha expressão endurecendo. Abri meus contatos e encontrei o número do meu advogado.
"Preciso que você prepare os papéis do divórcio", eu disse, minha voz firme e fria. "E eu quero tudo a que tenho direito."