Capítulo 1
Eliza Altheron
No dia em que completei 21 anos, quem apareceu no portão do internato não foi meu pai.
Foi um estranho: alto, de ombros largos, olhos verdes como gelo e uma expressão que não revelava nada.
Horas depois, dois tiros ecoaram - secos, cruéis - e meus pais caíam diante de mim, o sangue se espalhando pela calçada como uma mancha impossível de apagar.
Naquele instante, achei que aquele homem seria meu algoz.
Até encontrar um envelope escondido no cofre.
E nele, a assinatura do meu próprio pai... autorizando a minha morte.
Foi assim que tudo começou.
.
Eu imaginei que veria o motorista da família ou até meu pai, com o semblante carrancudo e os braços cruzados. Mas aquele homem não parecia ter vindo para me levar de volta. Parecia mais... um presságio.
- Foi... foi papai quem te enviou? - perguntei, hesitante.
Ele não respondeu. Apenas entregou um envelope lacrado ao segurança do colégio. O homem leu, analisou os documentos e assentiu. Um gesto simples - e minha liberdade foi entregue nas mãos de um desconhecido.
- Traga suas coisas. Não posso entrar lá - disse o estranho, a voz grave, sem emoção.
Talvez fosse só um novo guarda-costas, pensei. Ou talvez eu estivesse louca. Arrumei minhas malas rapidamente; já estavam prontas para o dia seguinte. Ele caminhou até elas como se soubesse exatamente onde estariam, pegou todas sem esforço e seguiu para o carro preto parado na frente.
Entrei no banco de trás, tentando controlar a inquietação. O silêncio era sufocante.
- Qual o seu nome? - arrisquei.
- Você trabalha com meu pai há muito tempo?
- Eles estão bem?
Nada. Nenhuma resposta. Só o ronco dos pneus contra o asfalto. Cada quilômetro percorrido fazia meu coração bater mais rápido.
O carro parou. Reconheci de imediato a entrada da minha casa. O peito se encheu de alívio e saudade. Desci correndo, as lágrimas queimando nos olhos. Estava de volta.
Mas em segundos, tudo desabou.
Pah! Pah!
Dois tiros secos. Definitivos.
Meus pais tombaram diante de mim.
- N-não... - minha voz saiu em um sussurro, quase sem ar. - Não, por favor!
Caí de joelhos. O mundo ficou em silêncio absoluto, como se tivesse desmoronado comigo.
- O que você fez? Eles não te fizeram nada! - gritei, sem forças. - Por quê?
O cano frio da arma encostou na lateral da minha cabeça.
A voz dele, cortante, quebrou meu desespero.
- Pegue o que for precisar. Depois, entre no carro.
O som metálico de engatilhar não deixou espaço para dúvida. Tremendo, levantei-me e entrei em casa.
A mesma casa onde aprendi a andar, onde comemorei aniversários... agora manchada pelo sangue dos meus pais.
No escritório, fui direto até o painel escondido atrás da estante. Eu sabia: ali havia uma arma carregada. Vi meu pai guardá-la tantas vezes.
Abri o painel com as mãos trêmulas. O metal frio da pistola trouxe uma sensação estranha de controle. Mas algo chamou minha atenção: um envelope branco preso atrás da arma.
O selo vermelho me fez congelar. O brasão da minha família.
Meu nome estava escrito à mão na parte da frente, com a caligrafia precisa do meu pai. O coração bateu tão forte que doeu. Abri. Dentro, apenas uma folha.
Nome: Eliza Altheron.
Execução: 23 de abril, às 14h30 - portão do internato.
Autorizado por: Reginald Altheron.
A assinatura era dele.
Meu pai.
O mesmo homem que me deu uma boneca feita à mão quando completei sete anos. O mesmo que me ensinou a nadar aos gritos. O mesmo que dizia que um dia eu entenderia seus motivos.
Ele havia me condenado.
Senti o chão sumir. O sangue pulsava nos ouvidos. A respiração falhou. Tudo fazia sentido: o silêncio no carro, o executor, os tiros...
Mas... por quê?
Por que meu próprio pai quis me matar?
E por que esse homem, o executor, não cumpriu a ordem? Por que veio um dia antes?
Guardei a arma no cós da calça, escondendo-a com a blusa. Dobrei o papel e enfiei no bolso. O choro secou. A dor deu lugar a frieza.
Saí até a porta. Ele me esperava encostado no carro, impassível. Olhou-me como quem mede um adversário. Eu o encarei de volta, com algo novo no olhar.
Eu queria respostas.
Eu queria vingança.
- Vamos - murmurei, entrando no carro sem desviar os olhos dele.
Se ele não ia me matar, então seria ele quem me mostraria a verdade.
E, dessa vez, eu é que apontaria a pistola para a nuca dele.