Eu estava grávida de oito meses, prestes a dar as boas-vindas ao nosso Tiago.
Com o Miguel, meu marido, planeávamos um futuro feliz e uma vida serena.
Era para ser o capítulo mais alegre da nossa história.
Mas num instante, tudo desabou num pesadelo.
Um acidente brutal na autoestrada A5.
O som ensurdecedor do metal a rasgar.
O nosso carro completamente destruído.
A minha mãe, Laura, gemia ao meu lado, inconsciente.
Com as mãos a tremer, apesar da dor excruciante no abdómen, consegui ligar ao Miguel.
Mas a sua voz não era de preocupação, era fria e impaciente.
Ele não podia vir, alegou, pois tinha de cuidar da sua meia-irmã, Sofia, que "torcera o tornozelo" numa queda.
No hospital, a primeira coisa que senti foi o vazio lancinante onde antes havia vida.
O médico confirmou a minha maior dor: o nosso bebé não resistiu.
Enquanto a minha mãe lutava pela vida nos Cuidados Intensivos, o Miguel apareceu.
Não sozinho, mas com a Sofia, que mancava de forma teatral, e o seu pai, Jorge.
Em vez de consolo ou luto, recebi acusações revoltantes.
Ele e o Jorge disseram que eu estava "emocional" e que devia pedir desculpa à Sofia pelo "drama".
Para selar o seu abandono cruel, o Miguel mudou de número, cortando qualquer forma de comunicação.
Meu filho morto, minha mãe entre a vida e a morte, e meu marido os abandonava por uma mentira tão descarada?
Como podiam ser tão frios e cruéis?
A dor da traição era quase tão insuportável quanto a perda.
A sua indiferença perfurava mais fundo que qualquer ferida física.
Mas a verdade veio à tona, de forma brutal.
A minha amiga Clara enviou-me a prova irrefutável.
A Sofia, de salto alto, brindando alegremente com mimosas num café chique no Chiado.
A data e a hora eram claras: duas horas depois do meu acidente.
A sua "dor" era uma farsa abominável.
Naquele instante, a minha dor transformou-se em fúria controlada.
Eu não quebrei.
Forjei uma armadura de raiva e determinação.
E jurei que eles pagariam, cada um deles, por terem transformado a minha vida num inferno.
A guerra acabava de começar, e eu tinha as armas necessárias.