Fred Narrando
Nasci sob o peso de um sobrenome que carrega mais medo do que respeito. Collins. Aqui fora, muita gente sussurra quando escuta esse nome. Mas lá dentro, dentro da estrutura que sustenta a maior máfia do país, a única coisa que se escuta é ordem. Regras. E o som de quem desobedece, caindo.
Sou Frederico Collins. O primogênito. O herdeiro do império que meu pai construiu com sangue, aço e silêncio. Tenho trinta anos e, até hoje, carrego nos ombros a responsabilidade de manter tudo em pé - mesmo que, às vezes, eu queira derrubar tudo.
Cresci dentro de uma jaula de ouro. A gente não chama de casa. Era um quartel. Meus brinquedos? Armas desmontadas. Meu café da manhã? Treinamento de combate às cinco da manhã. Aprendi a atirar antes mesmo de entender o que era uma nota de cinquenta. Meu pai nunca permitiu erro, nem vacilo. Cada passo era vigiado. Cada escolha, cobrada. E fraqueza... fraqueza era punida com desprezo.
Fui moldado no fogo. E, sinceramente? Eu odiei cada segundo.
Não me entenda mal. Eu sou leal. À minha família. À máfia. Ao sangue Collins que corre em mim. Mas eu nunca fui como ele. Nunca quis ser o reflexo do meu pai. Ele é ferro frio. Eu sou aço em brasa. Ele acredita em controle absoluto. Eu acredito que o controle real está em saber quando quebrar as regras e sei fazer isso melhor do que qualquer um.
Por isso ninguém me desafia. Porque sabem que eu não tenho limite quando sou provocado. Eu sou o tipo de homem que resolve com um olhar, mas que não hesita em sujar as mãos se for preciso.
Sou o mais velho de três irmãos. Os dois mais novos olham pra mim como se eu fosse o exemplo. E talvez eu seja, mas não porque sigo as regras do velho. Eu sou exemplo porque nunca precisei delas.
Meu irmão do meio Vincent tenta equilibrar o que sente com o que é esperado dele. Vive nesse conflito de querer agradar o nosso pai e ainda manter a própria identidade. O caçula, Dominik esse ainda tem muito a aprender. Acha que o mundo se curva pra ele só por carregar nosso nome. Mal sabe que o nome Collins só protege quem tem coragem pra sustentar o peso dele.
Eu, por outro lado, sou o que segura essa porra toda. Sou o que enfrenta os inimigos dentro e fora da organização. Sou quem senta à mesa com outros chefes e impõe respeito sem precisar levantar a voz. Mas, quando levanto... é melhor correr.
Nunca me permiti demonstrar fraqueza. Sentimento é brecha. Emoção é entrada. E, nesse jogo, qualquer sinal de humanidade é o suficiente pra te arrancarem tudo. Eu não mostro. Nunca. Já vi gente cair porque hesitou por um segundo. E um segundo é tudo que o inimigo precisa.
Já amei? Já. Uma vez. E bastou. Ela me ensinou que até o mais duro dos homens pode sangrar por dentro sem derramar uma gota. E, depois que ela se foi, decidi que não importava quem passasse pelo meu caminho, ninguém mais veria esse lado.
Mulheres? Tenho. Mas nenhuma fica. Eu sou intenso demais pra qualquer relacionamento saudável. As que vêm, sabem o que esperar: prazer, intensidade, domínio. Mas amor? Não. Isso eu deixei pra trás com o caixão que levei nos ombros anos atrás.
Não sou um bom homem. Nunca tentei ser. Mas sou o homem que você quer do seu lado quando o caos bate à porta. Sou aquele que assume a bronca, que protege os seus, que bota fogo no mundo se tocar em quem é meu. A diferença entre mim e os outros chefes é que eu não preciso gritar pra mostrar força. Eu ajo.
Tenho o respeito da máfia inteira porque conquistei. Não herdei. Cada cicatriz que carrego é uma história de guerra. Cada olhar que recebo, uma lembrança de que eu sou Collins até o fim, mas nas minhas próprias regras.
Meu pai sabe disso. Ele finge que me tolera por ser necessário. Mas a verdade é que ele me teme. Não por medo físico, mas porque eu sou o que ele nunca conseguiu ser: imprevisível. E isso assusta até o próprio Don.
Mas deixa eu te contar uma coisa. O poder, de verdade, não está no controle absoluto. Está na escolha de quando e como quebrar esse controle. E nisso, ninguém me vence.
Agora, um conselho: se cruzar comigo, escolha bem como vai agir. Porque se você me respeitar, terá em mim um aliado fiel. Mas se me trair... não haverá buraco fundo o suficiente pra você se esconder.
Meu pai me chamou no escritório dele no fim da noite. Quando cheguei lá os meus irmãos já estava, Aquele olhar sério, típico de quem já viu o inferno de perto, me dizia que o assunto era importante. Me sentei, cruzei os braços e esperei.
- A Hope vai voltar - ele disse, com a voz firme, sem rodeios.
Na hora, meu maxilar travou. Hope. O nome soou como uma memória engavetada há tempo demais. A afilhada do meu pai. A filha do soldado mais leal que a máfia Collins já teve. O homem morreu no campo de batalha, salvando a vida do velho, tomando três tiros no peito só pra garantir que o Don não caísse naquela emboscada. Meu pai nunca se perdoou. Nunca superou. Diante do túmulo, ele jurou que cuidaria da filha daquele homem como se fosse dele. E nos fez prometer, a mim e aos meus irmãos, que jamais tocaríamos nela. Que a protegeríamos com a vida, se fosse preciso.
- Ela terminou a faculdade, passou os últimos oito anos fora. Tá voltando pra casa - completou ele.
A mãe da Hope nunca foi apenas uma funcionária. Depois que a nossa mãe morreu, foi ela quem cuidou da gente. Alimentou, medicou, consolou.
Eu devia estar tranquilo. Devia só pensar em protegê-la, como o combinado. Mas alguma coisa dentro de mim se mexeu. Oito anos é tempo demais. E se aquela garotinha de olhos grandes e sorrisos doces voltou mulher?
Meu pai se levantou, encarou meus olhos como só ele sabe fazer.
- Não se esqueçam do que prometeram.
Engoli seco. Porque proteger... tudo bem. Mas manter distância? Isso pode ser mais difícil do que parece.