Ela cruzou os braços sob o peito, sem se importar com a exposição, ou talvez exatamente por isso. Os olhos azul-acinzentados o encaravam com firmeza, ousadia e um toque perigoso de provocação.
- Ora, ora... se não é o magnânimo Alessandro Spinola em pessoa. A que devo a honra?
- Vim falar com a minha sobrinha - ele respondeu, seco. - Será que pode fazer o favor de chamá-la?
Nina arqueou uma sobrancelha, recostando-se de leve na porta com um sorriso enviesado nos lábios carnudos e provocantes.
- Agora você quer estar presente na vida da Catarina? Depois de anos sumido, ignorando ligações, aniversários, decepções... e agora bate na porta como se fosse o herói da história? Que timing impressionante.
O sangue subiu às têmporas de Alessandro. Aquela menina atrevida era um pecado ambulante, o verdadeiro mal encarnado. E o pior: ela sabia.
Ele deu um passo à frente, sentindo o perfume floral que escapava da pele dela. Um aroma doce e insolente, como tudo nela. Os olhos escuros desceram por um instante, rápido demais para ser notado, lento demais para ser inocente.
- Olha aqui, garota - disse ele, tentando manter o controle, porque a garota além de atrevida e sensual, era cheirosa. - Você não sabe de nada. Não se meta no que não lhe compete. Agora pare de fazer cena e chame minha sobrinha. Agora.
- Alessandro... - murmurou David, seu amigo, tentando intervir ao ver o fogo que se acendia entre os dois.
- Não se mete, David! Essa menina insolente e sem educação precisa ouvir algumas verdades!
Nina arregalou os olhos e o sorriso desapareceu por completo do seu rosto delicado. Ela se aproximou mais, com o dedo indicador erguido, e bateu no peito dele com força.
- Minha mãe me ensinou a ter educação com quem merece - cuspiu as palavras, com os olhos faiscando. - E sabe o que mais? Nós oferecemos exatamente o que recebemos, senhor Spinola.
Alessandro estava prestes a retrucar quando notou o vizinho do lado, com a porta entreaberta, observando a cena com interesse demais. O velho sorria abertamente, encantado com a calcinha vermelha à mostra da morena. Alessandro sentiu o sangue ferver de novo, mas por outro motivo.
Antes que dissesse qualquer coisa, a esposa do vizinho puxou o marido pela orelha para dentro da casa com um grito em espanhol, encerrando o espetáculo alheio.
David coçou a nuca, visivelmente desconfortável, mas Nina não recuou nem um centímetro.
- Ora, sua... - começou Alessandro, já sem filtro.
- Tio?
A voz suave de Catarina ecoou da escada, abafando toda a tensão. Alessandro desviou o olhar e seu peito finalmente se acalmou ao ver a sobrinha ali, com o rosto ainda amassado de sono, descendo as escadas com os olhos marejados.
Ela correu e se jogou nos braços dele, e Alessandro a acolheu como quem segura a própria alma de volta.
- Cata... - ele sussurrou, apertando o corpo dela contra o seu. - Eu estava tão preocupado.
- Eu sei - disse ela baixinho. - Mas estou bem agora, tio. Prometo.
Nina recuou alguns passos, o semblante mais suave, mas ainda com os olhos atentos. Ela observava o reencontro com ternura, mas também com ceticismo.
David desviou o olhar, tentando focar em qualquer outro ponto da sala que não fosse as duas garotas de camisetas largas e pouca roupa. Percebendo a inquietação do homem, e ainda aborrecida com a discussão, Nina disparou, ríspida:
- Algum problema?
David corou, desviando o olhar da garota sem graça.
- Não, não... desculpe a intromissão. Não quis faltar com respeito a vocês.
Ela suspirou, assentindo.
- Tudo bem. Mas da próxima vez, bata antes de entrar num território que não é seu. A vista pode te custar caro.
Alessandro lançou um olhar fulminante para ela, mas se calou. Catarina o puxou pela mão.
- Tio... amanhã a gente conversa melhor, pode ser? Eu prometo que vou pra casa cedo.
Ele hesitou e seu olhar voltou novamente para Nina, que agora estava encostada na parede com o belo par de pernas à mostra. O olhar dela dizia "ouse discordar", e ele, pela primeira vez, se viu rendido.
- Tudo bem, principessa - murmurou, beijando o rosto da sobrinha. - Mas amanhã, sem plateia.
- Tudo bem - respondeu Catarina, sorrindo.
Alessandro se afastou do abraço e voltou a encarar Nina, como se ainda não tivesse terminado com ela.
- Vamos, David.
- Desculpe novamente, senhorita Nina - disse o amigo, sem graça.
- Acho bom ensinar ao seu amigo aqui o que são boas maneiras - respondeu ela, firme. - O titio precisa de uma reciclagem urgente.
Alessandro parou à porta e virou-se pela última vez.
- Amanhã, Nina - disse ele, em tom baixo e carregado de promessas. - Você não vai ter essa parede pra se esconder.
- Amanhã estarei de salto. E não vou me esconder - retrucou ela. - Pode trazer sua arrogância, titio. Eu levo minha verdade.
Ele saiu, com os olhos ainda colados nos dela e Catarina fechou a porta com um suspiro.
- Nina...
- Quem esse brutamontes pensa que é? - bufou Nina. - Cata, você só vai pra casa se se sentir segura. Eu prometi a você isso e não quebro minha palavra.
- Ele está tentando. Eu sei que errou, mas... é meu tio. E eu preciso contar o que aconteceu. Por mais que me doa.
Nina a abraçou, apertando-a com ternura.
- O que passou, passou. Agora você tem a mim. E ninguém mais vai machucar você. Nem mesmo ele.
Mas o que Nina não admitia, nem para si mesma, era que o verdadeiro perigo... era Alessandro.
E ele já morava nos lugares mais perigosos do seu corpo.