Capítulo 3 Escolhas que deveriam ser nulas

- Ah, vamos lá Cath. Você não quis fazer nada o dia inteiro.

Esse era Gustavi, com sua inabalável persistência infantil. Eu já tinha dito não à praticamente todas as suas propostas de distração. Embora sua última idéia, sobre irmos tomar banho de rio fosse tentadora. O dia estava uma quentura infernal, que um alívio séria mas que bem-vindo.

Mas infelizmente, papai cuidou para que nada disso fosse possível.

Ele havia colocado Marcílio, um capataz brutamontes de quase dois metros para rondar a casa - e não me deixar ir a canto algum, sem que ele estivesse presente. Eu já havia tentando, e assim que pus o pés fora de casa fui quase que imediatamente arrastada para dentro novamente. Parecia brincadeira, mas William falará sério quando disse que papai me manteria dentro de casa até o casamento. Eu era prisioneira na minha própria casa, e depois do casamento seria á de William.

- Não posso meu amor, estou de castigo esqueceu? Mas podemos pintar, o que acha? - Falei tentando parecer animada. Afinal, Gustavi não precisava saber das reais proporções do meu castigo.

Ele fez uma carinha super entendiada com a minha idéia e sentou-se no sofá a minha frente com o queixo apoiado nas mãos. Seus olhinhos grandes, comprimidos mostrando todo seu descontentamento.

- Não, isso é muito chato. Só você é boa nisso! - Resmungou totalmente, manhoso.

- Posso te ensinar. - Sugeri com meu melhor sorriso encorajador e beijei sua bochecha gorducha. - É só presta mais atenção e logo, logo estará fazendo até um retrato meu.

O último argunto foi decisivo para Gustavi que quando meneiou a cabeça, dessa vez foi totalmente empolgado.

Desligamos as lamparinas do quarto e seguimos correndo para o atelier no corredor do primeiro andar. Encontramos Nita no meio do caminho, que gritou e ameaçou nós puxar as orelhas por corremos na escada. O que só nós fez empenhamos á correr com mais energia.

Paramos ofegantes enfrente a porta lascada do ateliê. Abri a porta com chave que fica sempre guardada acima do umbral. Afastei as cortinas e as janelas; arejando e clareando o ambiente morfado. Tudo do jeitinho de como eu me lembrava. A única diferença era o ar um pouco empoeirado, e alguns lençóis brancos que protegiam os poucos móveis do recinto pelo pouco uso.

O cantinho preferido de mamãe quando viva, ainda era dolorido estar alí junto com as nossas memórias de quando pintavamos em dupla - Ela perfeita no que fazia. Não era de se esperar que o lugar ficasse abandonado. Sua presença aqui, inda era muito forte. Além que ninguém, depois de mim herdou seu talento com os pincéis. Eu sofri tanto com a sua perda, que na época até me esqueci que gostava de pintar. Agora eu percebia, que usar cores e da forma a algo era uma das formas mais simples de reviver sua memória.

- Cath? - A vozinha de Gustavi, me puxou de volta para o presente.

No entanto bem ali, cheio de temores e bichos papões e estava outra grande parte de mamãe, meu doce Gustavi. O pensamento me fez sorrir, quando disse:

- Venha seu medroso! pode entrar. Tudo estar claro agora.

Lentamente, a porta se abriu. Os olhinhos desconfiados de Gustavi passando pelo lugar vendo se de fato, falei a verdade. Apesar dele sempre negar, todos na casa sabiam que ele tinha medo de praticamente tudo que se movia.

- Não tenho medo. Eu só, quis ser educado e ter deixar passar na frente por ser mais velha. - Rebateu me fazendo rir, da sua perspicácia.

- Oh, eu não duvido pequeno homenzinho. - Disse a ele que sorriu satisfeito. - Agora, me ajude a separar as tintas e pincéis. Vou ensinar você à pintar os campos de trigo.

Separamos tudo e começamos a pintar. Como todo criança impaciente, Gustavi pareceu bastante chateado por não conseguir a mesma precisão que eu em seus traços. Sorrio do seu aborrecimento, mesmo sendo um grande medroso - ele não deixa de ser competitivo. O que era inútil, já que seu talento para pintura é inexistente. Lógico que eu nunca contaria isso á ele. Mas como se ouvindo meus pensamentos, Gustavi subitamente jogou o pincel no chão cruzando os bracinhos com um enorme bico.

- Não sei fazer isso....Estar horrível! - Disse olhando da sua tela para a minha.

A proposta inicial havia sido desenhamos os campos de trigo. Porém, seu desenho pareceia uma gema de ovo esmigalhada. Ele tinha razão, estava péssimo.

- Não estar não. - Tentei o consolar. - Você só precisa treinar mais.

- Poxa, Cath. Queria que ficasse igual o seu. - Reclamou, batendo o pés no chão. Segurei a vontade de rir, Gustavi fica muito fofo irritado.

- Talvez, o podemos consertar.

- Mesmo? - Gustavi virou de frente para mim, feliz com a idéia.

- Claro! - Confirmei, sacudindo o pincel no ar. O que faz Gustavi franzi o cenho confuso na minha direção, ele parecia preste a reclamar quando voltei a dizer: - Assim, oh - então, numa única pincelada sujo seu nariz de tinta azul.

Seu rosto parece surpreso por um minuto, mas ele logo entende a brincadeira me sujando de tinta verde. Com sendo, bem meno que eu - Gustavi pouco consegue acerta meu rosto mas não posso dizer que meu vestido teve a mesma sorte. Em algum momento, meu quadro também sofreu seus ataques. E por incrivelmente que pareça, o deixou de certa forma até interessante. Estou dando um gritinho, por ser acertada mais uma vez quando ouvir batidas na porta.

Sussurrei um distraído " pode entrar". - Só depois, me dando conta que poderia ser papai. Ele ficaria nada feliz com a nossa performance. Mas a questão é que não era papai, e sim Enzo. Meu melhor amigo.

Suspirei de alívio e surpresa. Ele era filho de Nita e havia passado os últimos meses, servindo o exército. Eu havia ficado bastante triste na época em que fora, mas papai andava implicando de mais com a nossa amizade que Enzo acabou achando que dar um tempo ia ser bom. E mesmo ser querer tive de concordar. Mas agora, o que pareceram ser anos depois ele estava de volta; e diferente.

Ainda tinha os mesmos olhos castanhos provocadores, mas ele tinha crescido. Estava com um ar mais adulto, mas homem. Céus! Ele tinha barba, mesmo que rala era visivel. Era difícil acreditar que o garoto franzino, que corria comigo pela fazenda era essa mesmo rapaz bonito e encorpado.

- Vai ficar ai me olhando com essa cara de boba, ou vai me dar um abraço e cumprimentar direito seu velho amigo? - Enzo disse com um leve sorriso.

Ele segurava Gustavi que nem vi quando pulou no seu colo, o pôs no chão para me receber em um abraço esmagador. Eu adorava seus abraços. Eram reconfortantes, e sempre tiravam meus pés do chão. Inspirei demoradamente em seu pescoço.

- Porque não me avisou que voltaria ? - Sussurrei em seu ouvido, ele riu. Fazendo-me rir também, isso não havia mudado ainda sentia cosquinhas bem alí.

- Queria te fazer uma surpresa. - Explicou, pondo-me no chão.

- Tenha certeza que fez. - Respondi, demorando uns minutos para me desfazer o abraço.

- Vai ficar quanto tempo? - Dessa vez, é a voz entusiasmada de Gustavi que pergunta. Não era segredo que com Enzo por perto, ele o monopolizaria o quanto pudesse.

- Um mês, talvez. - Respondeu bagunçando a cabeleira arrumadinha de Gustavi.

- Só um mês ? - falei não conseguindo esconder, a decepção da minha voz.

Por um longo momento, Enzo não disse nada. Só olhou para mim, pensativo. Então, piscou e se dirigiu a Gustavi, que o olhava como se fosse um herói místico e perguntou:

- Campeão, você me deixaria ter uma palavrinha particular com a sua irmã ?

Gustavi franziu as sobrancelhas adoravelmente, como um pequeno ciumento. Ele não gostava nada da idéia de me deixar só com outro garoto, mas por fim balançou a cabeça assentindo.

- Tudo bem, mas você tem que me arrumar para mim um uniforme legal desses que usa. - Ele propôs, como um pequeno homem de negócios.

- Tem a minha palavra - Enzo concordou rindo divertido, com a mão no peito como se fizesse um juramento.

- Seu pequeno trapaceiro. - Sorrir também e abaixei até ele, depositando um beijo estalado em suas bochechas. - aproveite e limpe essa tinta, que eu logo vou atrás. E se perguntarem por mim, diga que eu fiquei arrumando tudo aqui, certo?

- Certo. - Concordou, sumindo questão de segundos pela portar.

Mesmo depois que Gustavi se foi, eu e Enzo ainda continuamos olhando para porta. Agora, com só nós dois de frente um ao outro, e as palavras pareceram sumir. Logo eu, que tinha tanto o que falar, sentir como se minha mente tivesse sido apagada. Como desenhos feitos na areia, levados pela maré.

De costas para ele, andei até a janela e sentei no penhoral. Não demorou muito para que surgir-se ao meu lado. Afastei-me um pouco dando espaço para que senta-se.

- Você vai casar. - Ele disse.

- Vou.

Sabia que séria a primeira coisa que me perguntaria, já até tinha imaginado a cena na minha mente. Mas agora eu só conseguir confirmar, sem nada melhor para não dizer. Perguntando-me como soube da notícia. Mas conhecendo o jeito que nossa província era, o certo é que ele deveria ter vindo escutando boatos desenfreados sobre a fusão dos Whiters com os James desde que desembarcou no porto.

- Como isso aconteceu?

Ele se inclinou e segurou meu queixo para que eu olha-se em seus olhos, quando tentei olhar para longe.

- Papai que acha que eu preciso de limites. - Murmurei infeliz. - Eu sabia que teria que casa um dia, mas pensei que encontraria um noivo bom. Um noivo que no mínimo simpatiza-se, e não um Casanova.

- Você não tem que fazer isso se não quiser.

Enzo me olhou muito profundamente e tão determinado ao dizer-lo; que eu até acreditei que ele tivesse uma solução.

- Como não?

- Fuja comigo. - Ele falou se aproximando mais. - Tenho um bom dinheiro guardado, podemos ir para longe. Você disse que queria um noivo que no mínimo simpatiza-se. Eu estou aqui, seu amigo. Acho que isso deve valer de alguma coisa. Agora pode não ser o melhor momento para dizer, mas eu amo você.

Acho que devo ter parado de respirar um minuto, como a certeza de que meus os olhos também estavam arregalados. Garantindo minha total expressão perplexa. Sinceramente, Amo? por essa e não esperava. Esse era o tipo de pergunta, para qual eu não tinha idéia do que o responder. Tudo bem, eu gostava de Enzo e muito! Mas como amigo e, é sempre isso que ele seria.

Agora eu tinha duas opções de desgraça, até ria se á piada não fosse o meu destino. Casaria eu com um amigo e lhe daria esperanças de um amor, que não conseguria retribuir? Ou, com um completo estranho de fama libertina? Todas as duas opções pareciam tão erradas. Na verdade, as duas nem deveriam ser válidas.

- Enzo, eu acho q... - Comecei a dizer com o coração pesado; não sabendo encarar o rosto cheio de expectativa de Enzo. Porque, sabia que acima dos seus sentimentos por mim; seu principal objetivo ainda era me proteger.

Porém antes que conseguisse fórmula o a frase, seus lábios ás imterromperam.

Fiquei petrificada, sentindo seus lábios macios colados aos meus. Sua respiração pesada no meu rosto, enquanto ainda continuei sem mover um músculo. Porém Enzo não se deteve com a minha hesitação. Levemente mordeu o meu lábio inferior, quase como se pedindo permissão. Eu arfei assustada. Gesto que ele tomou como oportunidade para ousar em um beijo de verdade.

Não era algo exatamente ruim só de uma maneira que não me sentir tocada de nem uma forma por um sentimento diferente, além do já conhecido carinho. Quando seus lábios, começaram a trilhar beijos no meu pescoço, cai em mim e o afastei.

Mas não fui muito longe, antes de ser detida num abraço dessa vez nada; reconfortante.

- Seremos felizes Cath. - Enzo falou nos meus cabelos. - Mesmo suja e coberta de tinta, bagunçanda você é linda. Adoro seu desmazelo, seu bom humor. Amo, amo você. - Diz plantando pequenos beijinhos no meu ombro.

Voltei á empurra-lo novamente, dessa vez com mais força. Mesmo assim, não é uma tarefa nada fácil em vista da sua força naturalmente maior. Mas como eu sou insistente, ele me soltou confuso. Droga, mil vezes droga! Ele havia entendido tudo errado.

- Não.

- Não o que, Cath? - Ele perguntou preocupado.

- Sinto muito, não me casarei com você. Não posso fazer Isso com você, comigo. Somos irmãos, nunca poderia te dar amor.

Desviei o olhar triste, por ferir Enzo. Mas era melhor assim, ser sincera e dizer tudo de uma vez. Quando o vir passar pela porta, pensei que me confortaria; ajudaria-me encontrar meio termo para situação. E não, que me faria juras de amor.

- Eu não sou seu irmão. Eu sou um cara que gosta de você, e acaba de ser desprezado. - Ele deu uma risada sem humor. - Deve ser muito terrível a idéia de casar comigo, não? Porque nem um casamento forçado, á fez me aceitar.

Meneiei a cabeça totalmente imponente, com a sua expressão derrotada e o olhar cheio de mágoa, direcionado a mim. Algo, que eu nunca pensei que aconteceria. Comecei a chorar, lágrimas salgadas lavando o meu rosto.

Dessa vez, eu tentei me aproximar para consola-lo - não tinha certeza, se era a mim ou ele - Mas Enzo me afastou com um gesto cansado.

- Não me odeie. - Sussurrei, fungado. - Você merece alguém melhor que eu. Alguém que se casa-se com ele porque o ama-se, e não somente como irmão. Ou por não ter escolhas. Sinto tanto, por não consiguir amar você do jeito com que deseja. sinto muito, sinto muit...

Ele deu um suspiro audível, Enzo atravessou o quarto e me tomou num abraço triste. O que só me fez, chorar ainda mais forte. Que ironia, eu rechaçava-o e ainda era consolada. Realmente, não o merecia. Infelizmente, certas coisas, estão acima das nossas vontades ou do que séria a opção mais fácil. Tudo séria tão mais simples se eu o amasse.

- Desculpe, Cath. Estou sendo um egoísta. - Disse, mexendo nos meus cabelos. - Você aí confusa, e eu lhe impondo decisões. Imagino como deve ser difícil para você, independente e com espírito livre ter se casar com um completo desconhecido. Mas minha oferta ainda estar de pé, mesmo que você se decida no dia do casamento que não consegue fazer isso. Eu ajudarei você, e não se preocupe, não esperarei nem sequer um sorriso em troca. Pense nisso. - Ele beijou a minha testa e caminhou para porta sem nem sequer olhar uma vez para trás.

- Você vai se afastar de mim, assim? - perguntei, limpando as lágrimas com as mãos, mangas o que viesse primeiro.

Não podia o deixar ir assim. Já havíamos passado por tantas coisas juntos. Pedir conta das vezes que chorei nos seus ombros pelos sermões de papai, ou em como nos divertiamos somente debochando um do outro. A nossa amizade não poderia ser fragmentada assim, mau resolvida em uma única conversa.

- Sinto muito, Cath. Uma vez, que a gente se declara nada é como antes. Eu não conseguiria, ficar assim tão perto de você como antigamente, sem querer mais. - Ele respondeu, sem ainda se virar para olhar para mim.

Abrindo a porta ele sumiu rapidamente e eu contive um grito de frustação. Esse casamento, à inda nem tinha acontecido e já estava destruindo a minha vida aos pedaços.

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Não vi mas Enzo naquele dia. A única informação que tive sobre ele, foram meros detalhes de uma Nita muito feliz com a volta do filho. Assim, como o recado de Tobias que queria falar comigo tão logo o primeiro foco de luz surgi-se no horizonte. Essa foi a conclusão de um dia triste, e uma noite longa de sonhos inquietos.

            
            

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