Meu peito apertou. Por um segundo, fiquei sem respirar. O vestido marcava cada curva do corpo que não era mais de uma menina. Ela cresceu. Virou mulher. E eu... eu estava completamente despreparado para isso.
A garota que eu costumava chamar de "menininha dos Kaya" agora tinha olhos de tempestade e um sorriso que me desarmava.
E o pior... ela sabia disso.
Sabia o efeito que causava. Sabia exatamente como olhar, como se mover, como rir.
Era como se cada gesto dela dissesse: olhe pra mim, Armed, me veja de verdade.
E eu vi.
Maldito seja eu, mas vi.
Durante o jantar, evitei ao máximo encará-la. Falei com o pai dela sobre negócios, tentei me manter concentrado. Mas toda vez que ela cruzava as pernas, mexia nos cabelos ou deixava os lábios tocarem a borda da taça, eu sentia meu autocontrole ruir um pouco mais.
Ela estava brincando com fogo.
E eu era o incêndio que não podia acontecer.
Quando me afastei e fui até a varanda, pensei que o ar fresco me ajudaria a esfriar a cabeça. Mas ela veio atrás. Claro que veio.
E como sempre, veio armada com palavras doces e olhos desafiadores.
"Você está diferente, Nathifa."
Foi o que saiu da minha boca, mesmo que eu tenha pensado em dizer: você está me enlouquecendo.
"Diferente como?", ela perguntou, fingindo inocência.
Eu desviei os olhos. Porque se encarasse por mais tempo, cometeria um erro. Um que eu não poderia apagar depois.
"Mais... mulher", confessei.
Foi como abrir uma porta que devia permanecer trancada.
Ela se aproximou. Senti o perfume dela me invadir, e a proximidade fez minha respiração acelerar. A pele dela brilhava sob a luz da lua, e o jeito como me olhava... como se já soubesse que eu estava prestes a cair.
"E isso é um problema?"
Sim, era. Um enorme problema.
Mas não por culpa dela.
Era por minha culpa.
Porque eu sentia coisas que não deveria.
Porque eu a queria como nunca quis outra mulher.
E porque isso era errado.
Errado aos olhos do mundo. Errado para o pai dela. Errado até para mim.
Mas o desejo não se importa com o que é certo ou errado. Ele simplesmente existe. E ele existia em mim, por ela, de forma avassaladora.
"Você merece alguém da sua idade. Alguém com planos parecidos com os seus."
Disse isso tentando parecer racional. Frio. Mas cada palavra foi como uma faca em mim mesmo.
Ela não recuou.
Ela me enfrentou.
"Você não pode ou não quer?"
Esse era o problema.
Eu queria.
Queria tanto que doía.
Mas por isso mesmo, precisava ser duro.
- Nathifa, pare com isso. - minha voz saiu mais ríspida do que eu pretendia. - Você está confundindo as coisas. Isso é... perigoso.
Ela não disse nada. Apenas me olhou com aqueles olhos grandes, cheios de desafio e desejo.
E eu soube que não adiantava mais fugir. Eu podia gritar, fingir, negar. Mas ela já sabia.
Sabia que eu a desejava.
Sabia que eu estava à beira do abismo.
Então fiz o que qualquer covarde faz quando não consegue enfrentar a verdade: recuei.
Dei as costas.
Desci os degraus da varanda com o peito em chamas.
Entrei no carro e dirigi sem olhar pra trás.
Mas o gosto da voz dela, o perfume que ela deixou no ar, e o jeito como ela me olhou... tudo aquilo ficou preso em mim.
E naquele silêncio do carro, entendi que o que sinto por Nathifa não vai desaparecer.
Eu posso tentar ser duro.
Posso fingir que não vejo.
Mas ela já está dentro de mim.
E eu não sei até quando vou conseguir resistir.
Dirigir à noite por Istambul costumava ser um alívio. O vento entrando pelas janelas, as luzes refletindo nas ruas molhadas, e o silêncio da cidade me ajudavam a organizar os pensamentos. Mas naquela noite, nada disso funcionou.
Tudo em mim estava inquieto.
Como se minha pele tivesse sido marcada pelo olhar dela.
Como se a lembrança de Nathifa ainda estivesse sentada no banco do passageiro.
O vermelho do vestido.
O cheiro doce do perfume.
A ousadia no olhar.
A pergunta que ela fez: "Você não pode ou não quer?"
Essa pergunta ainda martelava na minha cabeça.
Porque a resposta era clara.
E vergonhosa.
Eu queria.
Queria tocá-la, beijá-la, segurá-la nos braços até ela esquecer qualquer outro homem.
Queria me perder naquele corpo, naquela boca atrevida, naquela coragem que ela mostrava toda vez que se aproximava de mim.
Mas o desejo é uma coisa.
A realidade, outra bem mais cruel.
Ela era filha do meu melhor amigo.
A garotinha que eu vi crescer, que corria pelo quintal com as tranças soltas e um vestido manchado de tinta.
Como eu podia olhar para ela agora como mulher... e pior: como a mulher que eu mais queria?
Aquilo era errado.
Pelo menos, era o que eu continuava repetindo a mim mesmo.
Cheguei em casa e joguei as chaves no balcão. Tirei a camisa e fui direto para a varanda, acendendo um cigarro que nem queria. A brisa estava fria, mas não me acalmava. Meus músculos estavam tensos. Meu peito doía.
Eu estava começando a perder o controle.
E isso me assustava.
Revirei a cabeça para trás, encarando o céu.
A imagem dela me invadiu de novo - o jeito como ela caminhava, a voz sussurrando meu nome, o brilho nos olhos quando me provocava. Ela sabia o que estava fazendo. Sabia onde estava mexendo.
- Por que você está fazendo isso comigo, Nathifa? - sussurrei para o vento, como se ele pudesse responder.
Ela estava brincando com fogo.
Mas eu era o homem que se queimava.
Tentei dormir, em vão. Me virei na cama por horas, relembrando cada detalhe daquela noite. A forma como ela se aproximou. A confiança no tom da voz. O toque dos dedos finos roçando meu braço sem querer.
Ou talvez tenha sido de propósito.
A verdade é que eu estava começando a enlouquecer.
Levantei antes do sol nascer. Me joguei no banho frio como se a água pudesse apagar o calor que Nathifa havia deixado no meu corpo. Mas era inútil.
Ela estava em tudo.
No espelho embaçado, vi meu reflexo e reconheci a sombra nos meus olhos. Era o mesmo olhar que vi no pai dela, anos atrás, quando ele conheceu a mãe de Nathifa. Era o olhar de um homem rendido. Perdido.
Mas ao contrário dele, eu não tinha o direito de me entregar.
Peguei o celular e, num impulso, abri a conversa com ela. O nome dela brilhava na tela, tão familiar... tão perigoso. Pensei em digitar alguma coisa. Qualquer coisa.
"Pare com isso."
"Você está me enlouquecendo."
"Não brinque com o que não pode controlar."
Mas apaguei tudo antes de enviar.
Ela não merecia minhas migalhas.
Nem minha covardia.
Mais tarde, precisei ir ao escritório do pai dela entregar uns documentos. Pedi para a secretária chamá-lo, esperando encontrá-lo sozinho. Mas o destino parece gostar de brincar comigo. Porque quem apareceu primeiro foi ela.
Nathifa.
Usava calça jeans e uma camisa branca simples, os cabelos soltos e os lábios rosados, como se nem tentasse me provocar. Mas só de vê-la, meu coração errou o compasso.
Ela parou na porta e me encarou. Por um instante, o mundo inteiro ficou em silêncio. A respiração dela oscilou levemente, e seus olhos brilharam ao me ver.
Eu soube que ela ainda lembrava da noite passada.
Assim como eu.
- Armed - ela disse, com um sorriso que me desmontava. - Não esperava te ver aqui tão cedo.
- Só vim deixar uns documentos - respondi, seco. Frio. Tão frio que doeu em mim mesmo.
Ela mordeu o lábio. Um gesto simples, mas que me deixou tenso da cabeça aos pés.
- Quer um café? - perguntou, dando um passo à frente.
- Não. - cortei. - Estou com pressa.
Vi a decepção passar nos olhos dela. Mas ela disfarçou bem.
- Claro. Como preferir - disse, antes de se afastar.
Fiquei ali, olhando para as costas dela enquanto ela andava pelo corredor. E cada passo que ela dava era como uma batida no meu coração dizendo: ela vai desistir de você, idiota.
E talvez fosse melhor assim.
Talvez fosse isso que eu estava tentando forçar: que ela me odiasse, se afastasse, me esquecesse.
Mas no fundo, bem no fundo...
Eu rezava para que ela não desistisse.
Porque eu não conseguiria continuar fugindo por muito tempo.