Quando abri os olhos, o teto branco do hospital era a primeira coisa a saudar-me.
Todo o meu corpo gemia de dor, especialmente a cabeça, que parecia prestes a explodir.
Ao meu lado, Sofia, a minha melhor amiga, observava-me com uma expressão sombria.
"Finalmente acordaste, Clara."
A voz dela era rouca, e a minha era um sussurro doloroso.
"Onde... onde está o Leo?" perguntei.
Sofia parou de descascar a maçã, sem olhar para mim.
"Ele está a tratar dos procedimentos de alta da Inês."
Inês. A ex-namorada do Leo, a mulher que ele sempre insistiu ser "apenas uma amiga".
O nome atingiu-me com a força de um soco.
Foi então que as memórias invadiram-me: o chiar dos pneus, o barulho ensurdecedor do metal a torcer.
E o Leo, ao volante, a virar instintivamente para proteger a Inês no banco do passageiro.
Deixando-me a mim, a sua noiva, no banco de trás, a levar o impacto principal.
Dois dias. Dois dias em que o meu noivo cuidou da ex-namorada enquanto eu estava inconsciente.
Quando ele entrou, aliviado, nem sequer me perguntou como eu estava.
Pelo contrário, ele justificou que a Inês precisava dele, que "somos compreensivos".
E depois, descobri o seu diário.
Nele, meses de dúvidas, comparações e a revelação mais dolorosa de todas: a minha quase-morte era "um sinal" para ele.
Um sinal de que ele não me ia escolher.
"Estou a deixar-te porque tu já me tinhas deixado há muito tempo."
Eu estava a ser expulsa da minha própria casa.
Ele estava a pintar-se como a vítima de uma noiva ciumenta.
Mas eu tinha de perguntar: "O que era eu, Inês? Um obstáculo?"
Depois de o Leo tentar comprar o meu silêncio com um advogado e me ter pedido para voltar depois de a Inês o ter deixado.
Eu sorri. Um sorriso genuíno e sem esforço.
Isto não era o fim, era o meu verdadeiro começo.