O cheiro de desinfetante hospitalar e o som distante de uma sirene eram as últimas memórias de Ana Paula. Ela se lembrava do rosto de Lucas, seu noivo, contorcido não em preocupação, mas em desprezo, enquanto Camila, sua melhor amiga, segurava a mão dele, sussurrando palavras venenosas. A humilhação pública, o dote de um milhão de reais em dinheiro falso, a reputação online destruída, tudo culminou em um empurrão durante uma briga e a escuridão que se seguiu. A dor da traição era uma ferida aberta, pulsando com a imagem deles rindo de sua desgraça.
Um solavanco.
Ana Paula abriu os olhos, ofegante. O ar não cheirava a antisséptico, mas a perfume caro e canapés. A música ambiente era suave, e vozes animadas enchiam o salão de festas luxuoso. Ela olhou para as próprias mãos, que tremiam. Estava viva. Estava usando o vestido de seda branco que escolhera para a festa de noivado.
"Ana, você está pálida. Está tudo bem?"
Era a voz de Camila. A mesma voz que, em sua memória agonizante, a chamava de tola e patética. Ana se virou e viu Camila, o rosto pintado com uma falsa preocupação, o brilho da inveja mal contido nos olhos. Ao lado dela, Lucas, o influenciador digital carismático, sorria para a câmera de seu celular, gravando um story para seus milhões de seguidores.
"Estou aqui com a minha linda noiva, Ana, e a melhor madrinha do mundo, Camila! Estamos prestes a fazer o grande anúncio!" ele dizia para a tela, a voz cheia de uma empolgação fabricada.
Ana Paula sentiu um calafrio. Era hoje. O dia em que sua vida desmoronou. Mas agora, algo estava diferente. A dor e a confusão da vida passada se solidificaram em uma calma gélida, uma determinação de aço. Ela não era mais a noiva ingênua e apaixonada, ela era uma sobrevivente com um roteiro completo do desastre que estava por vir.
Ela olhou para o palco montado no centro do salão, onde uma mala de aparência cara estava posicionada em uma mesa. A mala. O "dote". O milhão de reais em notas falsas que Lucas usaria para humilhá-la e, ao mesmo tempo, criar um golpe de marketing para si mesmo, posando como o noivo generoso e rico.
"Você parece um pouco distante, amor", Lucas disse, finalmente baixando o celular e passando um braço em volta de seus ombros. O toque dele, que antes a fazia se sentir segura, agora causava repulsa.
Ela forçou um sorriso pequeno.
"Apenas emocionada. É um grande dia."
"O maior dia das nossas vidas", ele corrigiu, dando-lhe um beijo na testa, um gesto puramente para as câmeras e para os convidados que os observavam com admiração.
Ele trocou um olhar rápido com Camila por cima da cabeça de Ana Paula. Um olhar que ela nunca havia notado antes, mas que agora, com o conhecimento de sua traição, gritava cumplicidade. Era um olhar que dizia: "A tola está caindo direitinho".
Mas a tola estava morta. E no lugar dela, havia uma mulher que renasceu das cinzas da traição, pronta para queimar tudo até o chão. A festa deles estava apenas começando, mas Ana Paula já sabia exatamente como terminaria. E desta vez, ela seria a única a rir por último.