Era Emílio, parado em frente a um quarto privativo, o braço envolto em torno de Haydée Carvalho, que soluçava em seu peito enquanto ele murmurava palavras de conforto, o olhar carregado de uma ternura que eu não via voltada para mim há muito, muito tempo.
O sussurro sufocado de Haydée atravessou o corredor: "Você acha que ela desconfia de alguma coisa?"
"Helena? Ela confia em mim completamente", Emílio disse, com um desdém sutil que deixava evidente o quanto ele subestimava minha inteligência e o quanto eu era irrelevante para ele.
"Mas quando você vai me fazer sua esposa? Quando você vai dar a mim e a Léo a vida que merecemos?", Haydée insistiu, sua voz embalada por uma ambição desesperada.
"Haydée, pare. Helena é minha esposa e isso não vai mudar", ele a cortou, e havia um fio de firmeza em sua voz.
Nesse momento, senti a respiração falhar no meu peito.
"É o mínimo que posso fazer, é minha penitência pelo que fiz a ela", Emílio completou, sua voz tingida com algo próximo à culpa enquanto ele a puxava para um abraço, beijando seus cabelos.
Nesse momento, os olhos de Haydée se desviaram para mim e, por um instante, nossas vistas se cruzaram. Não havia surpresa em seu olhar, apenas um lampejo de vitória fria e triunfante. Ela sabia que eu estava ali o tempo todo.
Recuei, o corpo inteiro tremendo. As lágrimas que tentei segurar desceram em cascata, quentes e imparáveis. Ele não queria se divorciar por culpa, mas jamais abriria mão da outra família. E eu? O que eu era para ele? Uma mera substituta? Um símbolo de um compromisso que ele não sentia mais, mas que era incapaz de romper por covardia?
Os votos dele ecoaram na minha mente, zombeteiros e cruéis: na saúde e na doença. Ele os pronunciara com tanta convicção... e eu acreditara.
Voltei para meu escritório com passos pesados, mas firmes. Esse amor tóxico, fragmentado, era um câncer, e precisava ser extirpado. Pensando nisso, peguei meu celular e marquei a data do aborto. Depois, liguei para Ayla.
"Prepare os papéis do divórcio. Quero tudo dividido ao meio. Tudo o que me é devido."
Ayla ficou atônita, pois na visão dela, éramos o casal perfeito, invejado por todos desde a faculdade de medicina.
Mais tarde, eu estava sentada no meu carro, no estacionamento do hospital, quando meu celular tocou.
Era Emílio, com a voz animada, quase radiante: "Oi, amor. Desculpe por ontem à noite, mais uma crise no escritório. Olha, hoje à noite é o grande jantar de aniversário da empresa. Como esposa do CEO, você precisa estar lá. É importante."
Um riso amargo quase escapou dos meus lábios, mas eu apenas concordei.
Emílio pareceu relaxar do outro lado da linha, aliviado por eu não questionar nada. "Ótimo, te vejo hoje à noite." Após encerrar a ligação, olhei pela janela, mas não enxerguei nada, só senti uma sensação profunda e gelada de pressentimento.
Emílio não tinha ideia do que estava por vir. Havia um desconforto, uma percepção vaga de que algo precioso escapava por entre seus dedos, mas ele não conseguia nomear, pois não fazia ideia de que já havia perdido tudo.