- Sophie, você está bem? Parece exausta. - A voz do fotógrafo me puxou bruscamente de volta à realidade. Havia preocupação em seu tom, mas seus olhos, como os de todos ali, estavam apenas curiosos, famintos por um deslize. Eu era um espetáculo.
- Estou bem, sim. Apenas me distraí por um momento, me perdoem. - Forcei um sorriso, sentindo o peso da mentira em cada palavra. Todos voltaram aos seus afazeres, e agradeci mentalmente por ninguém notar minha farsa.
Enquanto a câmera me capturava, eu me sentia livre - irônico, considerando minha situação. Os flashes traziam uma sensação de poder, algo que parecia faltar no resto da minha vida. Mas quando o ensaio terminou, o vazio voltou a me engolir, e lá estava eu, caminhando para o que deveria ser chamado de lar, mas que na verdade era minha prisão.
Ao passar pelos portões, a realidade me golpeou com a força de mil verdades. A única maneira de sobreviver era obedecer - evitar confrontos, evitar punições. Esse era o preço da minha segurança.
- Srta. Sophie. - Jhow me cumprimentou ao abrir a porta, sua voz abafada pela tensão que pairava no ar.
- Boa noite, Jhow. O senhor e a senhora Williams já estão em casa? - perguntei, escondendo o nó na garganta. A simples menção de meus pais fazia meu estômago se revirar. Ele assentiu em silêncio, como se já soubesse o que estava por vir.
- Estamos aqui, Sophie. Pensamos que não voltaria para casa hoje. - A voz de James soou seca, fria como gelo. Meus ombros se curvaram, e automaticamente abaixei a cabeça, surpresa por não ter notado sua presença.
- Desculpe, senhor. O ensaio se estendeu mais do que o previsto.
- Da próxima vez, avise. Você sabe que tem horário para estar em casa. Ficamos preocupados, querida. - Suas palavras tinham um tom ácido, e a ironia delas me fez engolir em seco.
- Mais uma vez, peço desculpas. Posso me retirar e me preparar para o jantar?
- Antes venha até o escritório; quero conversar com você. - O frio na espinha me paralisou. "Conversas" com meu pai sempre terminavam com algo quebrado em mim. Às vezes era o corpo; às vezes, a alma.
Sem contestar, segui seus passos até o escritório. O espaço era grande e luxuosamente iluminado, com quadros impecavelmente pendurados nas paredes e uma estante cheia de livros, meus únicos refúgios. Fugi para tantas realidades entre aquelas páginas que, às vezes, me esquecia de que a minha própria realidade era infernal.
James me olhou por um instante, seus olhos frios como sempre, antes de dizer com firmeza:
- Você vai se casar!
As palavras me atingiram como um soco. O mundo pareceu girar, e eu senti o chão sumir.
- Não posso me casar, papai. Eu não estou pronta... -Tentei argumentar, minha voz tremendo.
- Como ousa me contrariar? - A voz dele rugiu pela sala, encharcada de raiva. - Eu estou dizendo que vai casar, então sim, você vai casar, quer queira, quer não. - Ele gritou, levantando-se da cadeira e avançando em minha direção segurando-me pelo pescoço com uma força dolorosa. Arrependi-me de cada palavra, mas era tarde demais.
- Eu não posso me casar, papai. Eu não quero, por favor não me obrigue. - Respondi com a voz fraca, já prevendo o que viria. Antes que ele pudesse gritar de novo, minha mãe, Victoria, gargalhou, sua risada cheia de veneno e desprezo.
- Você acha que tem escolha? - Sua risada foi seca, sarcástica. - Nós já decidimos. Vai casar com Mikhail Volkov.
O nome não me era estranho. Já havia lido algo sobre ele em notícias de negócios, mas o que mais me chamava atenção, além de sua beleza inegável, era sua fama como um homem frio, calculista e implacável.
- Ele é o CEO da VK Enterprises, Sophie. Um dos homens mais ricos e influentes do mundo. Essa união vai nos trazer poder e prestígio. - James continuou, como se estivesse me vendendo a ideia.
Minha mãe, Victoria, se aproximou com seu típico ar superior, carregando um celular na mão. Com um sorriso cínico, ela mostrou a tela para mim.
"Mikhail Volkov, CEO e suposto chefe da máfia russa, acusado de envolvimento com a Tambov Gang."
Eu pisquei, tentando absorver as palavras. "Suposto chefe da máfia russa." Não podia ser verdade.
- Isso é uma piada? - perguntei, sentindo o desespero me dominar.
- Ele é mais do que apenas um CEO, Sophie. - James falou, cruzando os braços. - Ele é o Pakhán da Tambov Gang, a organização criminosa mais poderosa da Rússia.
A declaração me fez cambalear.
- Vocês estão me entregando para um mafioso? Isso é loucura! - gritei, sem me importar com as consequências.
Victoria bufou, revirando os olhos.
- Por favor, Sophie, não seja tão dramática. A nossa família faz parte desse mundo há décadas. Você não seria diferente. - Sua voz carregava desprezo. - Ele é um empresário respeitável, influente e bilionário. E, também um mafioso, mas quem se importa?
James avançou, colocando-se frente a frente comigo.
- Ele escolheu se casar com você, mesmo existindo dezenas de moças mais bonitas e indicadas ao casamento com um Pakhán. Devia estar agradecida, mesmo sendo uma garota sem graça foi escolhida para ser a primeira dama.
As palavras dele queimaram. Eu me senti reduzida a nada, como se minha existência fosse apenas um peso para ser passado adiante, como se meu corpo fosse um objeto a ser negociado. e, bom, eu estava sendo negociada, com a porcaria de um mafioso.
- Não vou fazer isso... Eu não posso fazer isso... - minha voz saiu embargada, mas firme.
- Você vai, sim. - disse Victoria com frieza. - E vai fazer isso sem causar um escândalo.
- O que ele vai fazer comigo? - murmurei, minha voz quase inaudível, enquanto o terror começava a se enraizar.
- Isso não me interessa. - James rebateu. - Você só precisa ser uma perfeita noiva, algo difícil considerando que você é... bom, você é você. Apenas se comporte e tudo sairá conforme deve ser,
"Apenas se comporte." Essas palavras ecoaram na minha mente. Nada estava bem, e, no fundo, eu sabia que nunca ficaria.
E mesmo assim, uma pergunta me assombra mais do que qualquer outra.
Mikhail Volkov, e o que ele fará comigo?