Até a Morte, Um Voto de Sangue
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Capítulo 3

Ponto de Vista: Clara Tavares

Nos dias que se seguiram, uma trégua gelada se instalou em nossa cobertura. Movíamo-nos um ao redor do outro como fantasmas, o silêncio entre nós mais pesado do que qualquer discussão. Contratei um detetive particular para investigar a vida de Amanda Alencar, mas todos os arquivos voltavam limpos, cada pista um beco sem saída. Arthur havia construído uma fortaleza de segredos ao redor dela, protegendo-a do mundo e de mim.

Encontrei-o em seu escritório uma noite, olhando para as luzes da cidade.

"Por que você a está protegendo?", perguntei, dispensando qualquer pretensão de civilidade. "Se ela não significa nada, por que escondê-la?"

Ele se virou, o rosto marcado por um cansaço que ia até os ossos. "Clara, por favor. Apenas deixe isso para lá."

"Eu vou", eu disse, caminhando até sua mesa e colocando uma cópia recém-impressa do acordo de divórcio sobre o mata-borrão de couro. "Assine isso, e você nunca mais terá que ouvir o nome dela de mim."

Ele olhou para os papéis, depois de volta para mim. Um sorriso lento e triste tocou seus lábios. Era o sorriso de um homem que sabia que tinha todas as cartas. Ele pegou o documento, mas não para assinar. Com um único movimento decisivo, ele o rasgou ao meio, depois em quartos, deixando os pedaços caírem no chão como flocos de neve.

"Eu te disse", ele falou, a voz suave, mas inflexível. "Só existe uma saída deste casamento para você. E é dentro de um caixão."

Algo dentro de mim se partiu. O frágil fio de controle ao qual eu vinha me agarrando por dias simplesmente... arrebentou. Peguei o pesado peso de papel de cristal de sua mesa e o atirei em sua cabeça. Ele se abaixou bem a tempo, e o objeto se espatifou contra a janela atrás dele, criando uma teia de aranha de rachaduras no vidro reforçado.

Antes que ele pudesse reagir, peguei um abridor de cartas da mesa - uma lâmina de prata, afiada e fina. Avancei contra ele, o aço polido brilhando sob a luz da lâmpada.

Ele agarrou meu pulso, seu aperto como ferro. A lâmina parou a um centímetro de seu coração. Ficamos ali, presos em um abraço mortal, nossos peitos arfando. Seus olhos buscaram os meus, não com medo, mas com uma confusão desesperada e suplicante.

"Você realmente acha que eu não vou fazer isso?", sussurrei, minha voz tremendo com uma mistura de fúria e dor.

Sua mão apertou a minha, forçando meus próprios dedos a se fecharem com mais força ao redor do cabo do abridor de cartas. Nossas mãos tremiam juntas, um tremor violento e compartilhado.

"A escolha é sua, Arthur", eu disse com os dentes cerrados, empurrando contra sua resistência. "Me dê o divórcio, ou eu mesma me torno viúva. De um jeito ou de outro, eu vou sair."

Por um longo momento, ficamos congelados naquele impasse. Então, sua expressão mudou. A resistência em seu braço afrouxou. Ele guiou minha mão, e a ponta da lâmina, em direção ao seu próprio ombro.

"Não", disse ele, a voz um sussurro rouco. Com um movimento súbito e chocante, ele empurrou minha mão para frente.

Senti a lâmina afundar em sua carne. Uma perfuração aguda e nauseante. Um suspiro escapou dos meus lábios enquanto ele a cravava mais fundo, seu rosto se contorcendo de dor. Sangue, escuro e espesso, floresceu através do tecido de sua camisa branca, encharcando-a em uma mancha carmesim que se expandia rapidamente.

Uma única gota respingou na minha bochecha, quente e pegajosa.

"Eu não vou deixar você morrer primeiro, Clara", ele engasgou, os olhos fixos nos meus, cheios de uma devoção aterrorizante e distorcida. "Nunca."

Arranquei a lâmina, um som visceral e rasgante que fez meu estômago revirar. Ele soltou um gemido baixo, cambaleando para trás contra a mesa.

O cheiro metálico de seu sangue encheu minhas narinas, espesso e enjoativo. Era o mesmo cheiro daquela noite no barraco. O cheiro da minha liberdade. O cheiro do pecado dele. O cheiro de nós.

Minha cabeça girou. A sala inclinou. O passado e o presente estavam colidindo em uma onda sangrenta e horrível.

"Não...", gaguejei, recuando dele, minhas mãos tremendo incontrolavelmente. Ergui o abridor de cartas ensanguentado como se para afastá-lo. "Não me toque."

Ele me observou, o rosto pálido, a respiração saindo em arfadas irregulares. Ele não tentou me impedir enquanto eu tropeçava para fora do escritório, deixando-o sangrando no escuro. Fugi pelo corredor, o gosto de cobre de seu sangue ainda em meus lábios, uma comunhão profana que nos unia, mesmo em nossa destruição mútua.

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