Não esperei por uma resposta. Virei-me e caminhei, meus movimentos rígidos, minhas muletas batendo um ritmo frenético no chão polido. Empurrei a pesada porta de vidro e tropecei para o ar fresco da noite, engolindo-o como uma mulher se afogando.
A dor na minha perna era uma pontada surda e distante comparada à torção aguda e agonizante no meu peito. Apoiei-me na parede de tijolos do restaurante, pressionando minha testa contra a superfície fria e áspera, tentando me firmar.
"Clara, espere!"
A voz de João Pedro atrás de mim. Ouvi a porta do restaurante se abrir.
Não me virei. Não conseguia olhar para ele.
"Deixe-a ir," a voz do João Pedro do Futuro era afiada, imponente. "Ela só precisa de um minuto."
"Não," disse João Pedro, seus passos se aproximando. "Clara-"
"João Pedro, a Amanda está se sentindo fraca," o João Pedro do Futuro interrompeu, seu tom endurecendo. "O estresse é demais para ela. Ela precisa ir para casa. Agora."
Amanda, claro. Sempre Amanda. Ela era uma arma, sua suposta fragilidade um escudo que seus protetores usavam para me manter à distância.
"Ela pode pegar um táxi," disse João Pedro, sua voz tensa. "Preciso falar com a Clara."
"E deixá-la ir para casa sozinha depois do que aconteceu na lanchonete?" a voz do João Pedro do Futuro estava carregada de escárnio. "Você é realmente tão egoísta?"
Ouvi o suspiro frustrado de João Pedro. O som de sua batalha interna era a trilha sonora da minha vida agora.
"Eu posso pegar meu próprio táxi," eu disse, minha voz plana, ainda de frente para a parede. Eu não queria sua pena, sua atenção dividida. Eu só queria ficar sozinha.
"Não," ele disse, sua voz de repente bem atrás de mim. "Não vou te deixar aqui." Ele tomou uma decisão, um acordo que pareceu outra traição. "Vou levar a Amanda para casa e volto logo para te buscar. Podemos ir para minha casa. Vamos conversar. Eu prometo. Apenas... espere por mim aqui."
Ele não esperou minha resposta. Ele agarrou meu braço, seu aperto insistente, e me afastou da parede, me guiando para um banco escondido em um pequeno nicho sombrio perto da entrada lateral do restaurante. "Espere aqui. É mais seguro. Volto em vinte minutos. No máximo."
Ele me deixou lá, uma bagagem a ser recuperada mais tarde. Eu o observei voltar para a frente do restaurante, onde o João Pedro do Futuro já estava ajudando uma Amanda de aparência pálida a entrar no banco do passageiro do carro de João Pedro.
Ele entrou no lado do motorista, me deu um último olhar conflitante e então partiu, desaparecendo na escuridão.
Deixando-me sozinha. De novo.
O nicho era escuro, a única luz vindo de um poste de luz piscando no final da rua. Os minutos passavam, esticando-se em uma eternidade. Vinte minutos vieram e se foram. Depois trinta. Depois uma hora.
A noite ficou mais fria. A rua, antes movimentada com os clientes do restaurante, ficou deserta. Um grupo de homens cambaleou para fora de um bar do outro lado da rua, suas risadas altas e agressivas. Eles me viram, uma garota sozinha em um banco escuro.
"Ora, ora, o que temos aqui?" um deles arrastou as palavras, seus olhos demorando no gesso da minha perna.
Meu sangue gelou. Tentei pegar meu celular, meus dedos desajeitados de medo. Eu precisava ligar para alguém. Qualquer um.
"Me deixem em paz," eu disse, minha voz tremendo.
Eles riram, aproximando-se, bloqueando a saída do nicho. "Dando uma de difícil, é? A gente gosta disso."
Meu coração martelava contra minhas costelas. Eu estava encurralada. Minhas muletas eram inúteis como arma. Minha mente gritava um nome.
João Pedro.
Com as mãos trêmulas, disquei seu número. Tocou uma, duas, três vezes.
"Alô?" Sua voz estava distraída, abafada.
"João Pedro," sussurrei, minha voz embargada de terror. "Tem uns caras aqui... estou com medo. Eles não me deixam em paz. Por favor, você tem que voltar."
Houve uma pausa do outro lado da linha. Eu podia ouvir a voz suave de Amanda ao fundo, perguntando quem era.
"Clara, eu..." ele começou, sua voz tensa. "Não posso agora. A Amanda está tendo um ataque de pânico. Ela acha que a casa dela vai desabar com os tremores. Estou tentando acalmá-la."
A desculpa era tão frágil, tão patética, que foi como um golpe físico.
"João Pedro, por favor," implorei, lágrimas escorrendo pelo meu rosto enquanto um dos homens estendeu a mão e agarrou meu braço. "Estou em apuros. Por favor."
"Eu... eu tenho que ir, Clara." Sua voz estava distante, já se fora.
A linha ficou muda.
Ele desligou na minha cara.
Ele a escolheu. Em um momento de perigo real e tangível, ele escolheu a crise fabricada dela em vez da minha real.
O celular escorregou da minha mão, batendo no concreto com um estalo. O som ecoou o estilhaçar do último e microscópico fragmento de esperança no meu coração.
Tentei o número dele novamente. Caiu direto na caixa postal. Ele havia desligado o celular.
O homem que segurava meu braço apertou o aperto, seu hálito quente e com cheiro de cerveja velha no meu pescoço. "Ninguém vem te buscar, docinho."
E naquele momento de terror puro e absoluto, eu soube que ele estava certo. João Pedro não viria. Ele me deixou no escuro, e não ia voltar.