Quando o avião taxia na pista, iniciando o pouso sinto um frio se alojar em meu âmago. Santa Helena, estou de volta! Um sorriso enfeita meus lábios, meu coração parece querer explodir de alegria. Depois de quase dez anos, rodando o mundo, conquistando pessoas e levando o que aprendi a fazer de melhor para elas, estou de volta à minha cidade natal, onde tudo no passado me fazia acreditar que eu era uma mulher fraca. Sinto saudades de casa, dos meus pais, e do meu irmão rabugento, o Tomás. Dez anos se passaram e ele nunca parou de me ligar para saber como sua irmãzinha mais nova estava se saindo nos países por onde passei.
Assim que deixo o avião, desço as escadas, sinto a rajada de vento que bate contra o meu rosto e suspiro. Novos ares, novos trabalhos e novos sonhos me esperam aqui. Meu celular vibra em minha bolsa, rapidamente o alcanço. É uma ligação do papai. Meu velho, preocupado comigo, não me deixou em paz desde que falei que estava voltando. Eles sentem saudades. Eu também!
O atendo prontamente, ouvindo sua risada rouca soar através da linha telefônica e um grito que, suponho ser da mamãe.
- Bella, filha, como foi a viagem? - Sorrio largo, ouvindo sua voz alegre soar cheia de preocupação.
- Foi incrível, pai. Estou morrendo de saudades de você e da mamãe e não vejo a hora de chegar à nossa casa para abraçá-los - digo, minha voz se tornando, por um segundo, emotiva. Estou prestes a chorar, mas respiro fundo, pois não posso de jeito nenhum borrar a maquiagem impecável que foi feita pelo, Lorran, meu amigo e maquiador de sucesso que esteve comigo durante esse tempo todo.
- É bom tê-la de volta, filha. Sua mãe está eufórica e louca para vê-la - papai comenta, me fazendo uma mulher rendida a suas palavras.
Recordo-me como foi difícil para eles, quando falei que iria viajar por um tempo. Precisava tirar a ideia daquela Isabella gorda, maltrapilho, que colocaram na minha cabeça quando estudava. Fui para Nova Iorque, levando apenas uma mala e com medo do que o destino reservaria para mim. Por sorte, deu tudo certo. Cursei a faculdade de moda, depois de lutar arduamente para ser modelo Plus Size. Consegui claro, afinal, determinação é tudo e era também algo que não sabia que possuía.
- Tomás está louco para ver como você está depois de tanto tempo longe. Ele ficou me atormentando desde que foi embora, me pedindo que eu a buscasse e trouxesse de volta para casa. - Meu pai sorri levemente, o ar despreocupado pairando na sua voz.
- Sim! Ele também ficou no meu pé, me pedindo para voltar. - Dou uma risada alegre, lembrando-me todas as vezes em que Tomás ligava por videochamada, pedindo que voltasse logo. - Ele é um homem que se faz de durão, mas chora por sua irmãzinha querida- provoco o meu irmão. Meu pai gargalha depois solta um suspiro - Quem estará esperando por mim? - pergunto imaginando que ele pediu para alguém me buscar.
- Ryan e Renzo, meus seguranças, que agora serão seus também. Eles são meu braço direito, os tenho como se fossem meus filhos - diz com orgulho na voz. - Sinto muito, meu bem, mas seu irmão não pôde ir até você agora. Ele está em uma reunião importante com os investidores- papai explica, se desculpando.
Dou de ombros, mas sinto meu coração acelerar com a menção dos irmãos Reed. Já os vi em fotos ao lado de papai, esbanjando sorrisos charmosos. São quentes como o inferno, e não sei se estou pronta para tê-los em meu encalço, seguindo-me para onde quer que eu vá. Lembro-me deles, quando ainda estudava no colégio Santa Mônica e da paixonite idiota que eu tinha pelos os dois. Cercados de garotas, eles faziam sucesso, foram os únicos que nunca direcionaram uma palavra de ofensa a mim, diferente de todos os outros meninos naquela época.
Donos de uma cabeleira loira e lindos olhos azuis. Ryan era o que me chamava mais atenção, apesar de ser idêntico ao seu irmão. Não sei, algo nele gritava simplicidade. Seu sorriso encantador e que causava grande impacto nas calcinhas alheias, era o que mais gostava nele. A beleza surreal, o charme, os sorrisos tortos e quentes, me deixava hipnotizada já naquela época. Obviamente, sempre passei despercebida pelos dois garotos mais bonitos do colégio.
- Pai, porque você não vem me buscar no aeroporto? É assim que diz estar com saudades de mim? - questiono, mandando as imagens dos gêmeos para longe. Balançando a cabeça, deixo que os pensamentos sobre eles evaporem por alguns minutos. Estou nervosa, trêmula, porque saber que vou estar cercada por homens quentes, me faz lembrar sobre a minha adolescência, e isso quase me faz entrar em pânico.
Nenhum deles olharia para mim, sem sombra de dúvidas. Mas, também não vou ficar triste por isso.
Depois de Axel, jurei nunca mais me envolver com homem nenhum. O amei com todo o meu coração, entreguei tudo de mim em um relacionamento onde era eu quem não valia nada aos olhos dele. Axel é bonito, lindos olhos verdes, cabelos negros que caem em sua testa, braços firmes e fortes que me mantiveram segura por mais de um ano. Era o que eu pensava. Seu caráter era algo indiscutível não só para mim, mas para todos que estavam ao seu redor. Acreditei piamente, em sua postura de homem exemplar, fiel e apaixonado para depois quebrar a minha cara e ter o meu coração destroçado de maneira tão suja pelo cretino, filho da puta.
É um mau-caráter de marca maior, me traiu com a minha amiga, a qual eu dividia o apartamento. Encontrei os dois trepando como se o mundo estivesse prestes a acabar. Nus diante dos meus olhos, e ainda por cima na mesma cama em que me fez acreditar que seria sua para sempre. Onde fizemos amor, enquanto o tinha me levando ao sétimo céu. Quando descobri sobre sua traição, o expulsei da minha vida, claro. Mas, ainda assim, tive que ouvir seus xingamentos e ódio direcionados a mim, dizendo-me que não era mulher o suficiente para ele, que eu era gorda demais, feia demais, que eu nunca iria encontrar alguém que me suportasse, ou que, de fato, queira estar comigo do jeito que sou.
Chorei feito uma idiota. E quem não iria? Ver o homem que amava acabar comigo de forma tão baixa, quando eu o tinha como um príncipe encantado. Doeu como uma faca maldita em meu coração. Porém, depois de muito pensar, percebi que ele estava certo o tempo todo em falar que não era mulher para ele. Realmente não sou. Sou linda demais, gostosa e uma mulher incrível.
Eu me amo. Eu me basto! Eu me aceito do jeito que sou!
E quando você se aceita, você se liberta. Porque não precisa que ninguém aceite você. Se aceitar é amar a si mesma com suas qualidades e defeitos; é não precisar que alguém diga o quão incrível, bela, você é. Porque lá no fundo, você sabe. Hoje eu sei!
Fui trouxa em não enxergar o crápula que ele era. Doei-me demais em um relacionamento, do qual quem saiu terrivelmente machucada fui eu. No entanto, superei. Hoje estou bem melhor do que quando vivia com o cretino em meu pé. O deixei com a Faby, a amiga da onça. Dois traíras, que se merecem.
- Não posso, meu bem! Tenho trabalhos a fazer e suponho, que quando chegar aqui vou estar com a cara enterrada nas planilhas e contratos que precisam ser assinados ainda hoje - papai explica se desculpando mais uma vez.
Entendo seu lado, mas o que me deixa triste é saber que ele ainda é o mesmo. Durante toda minha infância e adolescência, o vi comandar empresas, viver em função de seus trabalhos, e quase nunca ter tempo para mim e para o meu irmão. O Sr. Otávio, prefeito de Santa Helena, uma pequena cidade no interior de São Paulo, é também CEO das maiores empresas no ramo da floricultura. Conhecido e respeitado por todos, não há uma pessoa sequer que o contrarie.
Solto um suspiro nada contente, meneio com a cabeça em positivo como se ele estivesse me vendo e falo:
- Está tudo bem, papai. Fale com a mamãe que quero para o jantar estrogonofe de carne. Minha comida favorita.
- Ela está preparando tudo. Não parou quieta desde que soube que estava vindo, querida. - Sorrio largo. Ah, dona Polyana, sabe como me ter em suas mãos e fazer meu coração ficar quentinho.
Depois de alguns minutos, finalizo a ligação. Meu coração bate freneticamente. Respiro fundo, tentando em vão me acalmar, mas sem sucesso. Ergo a cabeça, mantenho-me em uma posição ereta. Rebolando os quadris com tamanha confiança, enquanto caminho em direção à saída do aeroporto. Algo dentro de mim grita, dizendo-me que a partir de hoje, uma nova Isabella está prestes a surgir.
E, Deus, como eu estava certa!