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Era uma manhã fria, mas nem mesmo o conforto que sua cama macia proporciona foi capaz de conter o entusiasmo de Cassandra. Era o dia que seus superiores comunicariam a sua promoção para o resto da empresa.
Cassandra estacionou seu carro na garagem do grande prédio com vidros espelhados e caminhou em direção a recepção. Era seu primeiro dia trabalhando na matriz da empresa. Era a concretização de um sonho para ela. Nem de longe parecia com o dia em que ela fez sua primeira entrevista de emprego. Cassandra havia perdido os pais em um incêndio no galpão da empresa da família, ainda no velório, seus irmãos deram um prazo de duas semanas para que ela deixasse a casa onde cresceu. Por ser adotada, ela sempre sentiu era um peixe fora d'água, seus irmãos faziam questão de lembrá-la que ela não fazia parte da família e seus pais nunca a trataram com carinho, a relação entre eles era formal, nada parecido com o amor e carinho que eles davam aos dois filhos biológicos do casal.
Com um currículo sem quase nenhuma experiência profissional e alguns diplomas dos cursos que fez ao longo dos seus dezoito anos de vida graças às bolsas de estudo que ela conseguia. Cassandra buscou por vagas de emprego que ela pudesse se inscrever depois de alguns cliques em seu computador e uma semana de espera, ela foi chamada para a primeira entrevista em uma empresa que possuía a maior rede de lojas de eletrodomésticos e eletrônicos do país. Ao chegar no enorme prédio para participar do processo seletivo o nervosismo tomou conta de seu corpo, suas mãos suavam e tremiam. Ela respirou fundo e subiu os degraus que levavam a recepção. Haviam duas recepcionistas atrás de um elegante balcão, poltronas modernas decoravam o saguão e logo atrás dois elevadores com portas em inox escovado. Cassandra era a próxima da fila, ela observou enquanto as outras pessoas diziam o motivo de estavam ali e entregavam um documento, quando sua vez chegou ela timidamente falou com a simpática recepcionista. - Boa tarde. Estou aqui para participar do processo seletivo para vendedora. - A recepcionista tirou uma foto com uma pequena, preencheu os dados da candidata em seu sistema e devolveu o documento de identificação da moça. - Quinto andar, procure por Renata, ela fará sua entrevista.
Cassandra agradeceu e contando até dez mentalmente para se acalmar ela andou até o elevador, quando as portas se abriram ela apertou o botão de número cinco, enquanto o elevador subia ela aproveitou que estava sozinha enfrente à um grande espelho para conferir sua aparência. Uma voz mecânica anunciando a chagada ao quinto andar a tirou de seus devaneios e as portas logo se abriram.
Uma mulher não muito mais velha a recebeu com um sorriso gentil, Renata era responsável pelo departamento pessoal da empresa, ela notou o nervosismo da candidata a sua frente e fez o possível para deixá-la a vontade, isso fazia parte do trabalho, sua missão era conseguir funcionários talentosos e deixar um candidato mais nervoso do que já estava não facilitaria seu trabalho.
Cassandra e Renata conversaram sobre a vaga, a entrevistadora fez algumas perguntas para avaliar a candidata e lhe entregou alguns testes, após o final da entrevista Renata assegurou que ligaria para informar o resultado do processo seletivo no decorrer da semana. Com isso Cassandra se despediu e retornou para a casa que ela deveria deixar em poucos dias.
Ela não tinha nenhum parente além dos irmãos adotivos, nem muitos amigos a quem pudesse recorrer. Sua última esperança era seu namorado. Morar com um homem antes de se casar não era a história digna de conto de fadas com um grande casamento de princesa que ela idealizou desde sempre. Mas era isso ou morar na rua.
Jorge nunca a pediu em namoro, mas depois de dois anos juntos ela deduziu que ele era seu namorado, ele era seu colega de classe na escola e sempre que podia ele a elogiava, até que um dia ele a beijou e disse que tinha sentimentos por ela. O jovem parecia um modelo saído da capa de uma das revistas que ela lia. Ele era alto, magro, tinha pele clara, olhos azuis e cabelos escuros perfeitamente cortados. No entanto, ela não sabia se tinha ou não sentimentos por ele, mas o garoto era astuto e conhecia seus gostos, ele amoleceu seu coração com pequenos gestos. Vez ou outra levava uma rosa ou chocolates para ela, acompanhava Cassandra até a sua casa e levava a sua mochila, logo seus colegas diziam que eles eram um casal. E era assim mesmo dois anos depois.
Jorge sabia sobre o processo seletivo e prometeu visitá-la para saber como foi, Cassandra passou o resto do dia pensando em uma solução por mais provisória que fosse para o seu problema. Uma semana era pouco tempo para conseguir um lugar para morar, ela não tinha muito dinheiro, apenas o pagamento dos dias que trabalhou na empresa dos seus pais adotivos. Ela não conseguiu pensar em nenhuma solução, o medo de morar na rua a cegou. Jorge não apareceu naquela noite. Ele enviou uma mensagem de texto prometendo que a veria em breve.
No dia seguinte, Cassandra recebeu uma ligação do departamento pessoal informando que ela havia sido selecionada para o cargo. Era tudo o que ela precisava para ter a coragem necessária para enfrentar seus problemas. Ela ligou para seu irmão mais velho.
- Cassandra, espero que esteja ligando para dizer que conseguiu um lugar para ficar.
Nem um oi, Cassandra respirou fundo e respondeu da mesma maneira.
- Não, Carlos. Na verdade, eu queria pedir um pouco mais de tempo. Duas semanas não é o suficiente.
Ele suspirou e por algum tempo a linha ficou muda.
- Carlos?
- Ouça, você tem até o corretor conseguir alguém para alugar a casa. Nem um dia a mais.
- É o suficiente, eu acho.
- Você tem como se sustentar?
Por um momento Carlos parecia um irmão, um irmão muito egoísta.
- Eu tenho um pouco de dinheiro e consegui um emprego.
- Isso é bom. Agora eu tenho que ir.
E essa foi a última vez que Cassandra falou com um de seus irmãos. Ela alugou um pequeno apartamento depois que recebeu seu segundo salário na mesma imobiliária que deixou as chaves de sua antiga casa, levou quase um ano para a casa de seus pais ser alugada. Com muitas horas extras e desconto para funcionários ela conseguiu mobiliar seu modesto apartamento, era um espaço pequeno de paredes brancas, piso de taco no chão e com uma grande janela. Quarto e sala divididos por uma estante, uma pequena cozinha americana e área de serviço.
Tudo tão diferente da vida que Cassandra conseguiu depois de sete longos anos de trabalho duro, faculdade e quase nenhuma vida social.
O quarto em que ela acordou naquela manhã era uma suíte confortável e bem decorada, seu apartamento era amplo, com sala de jantar e sala de estar, cozinha com móveis planejados. Era financiado, mas ela tinha orgulho dele.
Orgulho de suas conquistas era tudo o que Cassandra tinha em seu coração naquele momento, voltar ao local de sua primeira entrevista como uma das executivas que trabalham em um dos escritórios da matriz. Ela entrou no prédio espelhado e como da primeira vez, ela foi até uma das recepcionistas, mas dessa vez não foi necessário se apresentar ou mostrar um documento de identificação, ela tinha um crachá que lhe deu acesso aos elevadores. Sim, ela estava nervosa, mas por motivos diferentes. Cassandra foi escolhida para trabalhar ao lado dos proprietários da grande rede de lojas. Em um cargo que não existia antes. Sem passar por nenhum processo seletivo, nem mesmo uma entrevista. Nada.