O ar da cidade de Bangkok era frio como o do mar, mas não chegava a incomodar Gael. Tanto ele quanto Anny estavam trajados com casacos e calças mais grossas, feitas especialmente para climas frios como o daquela noite.
_Espero que as comidas daqui sejam tão boas quanto as de Ilhabela_murmurou Gael.
_Isso talvez não seja possível_respondeu Anny.
_Como assim?
_O tempero da nossa comida é muito melhor do que os dos outros países... É um sabor único. Não concorda?
_Tem razão... É mil vezes melhor. Sem querer ofender ninguém é claro.
Os dois saíram do aeroporto e pararam ao lado de um ponto de ônibus.
_Não estou vendo nenhum restaurante aqui por perto no Google Maps_disse Anny._Essas ruas são muito confusas.
_Já chamei o Uber no aplicativo... Só que tem um probleminha.
Anny olhou para Gael já sabendo que a notícia não seria nada boa.
_O que aconteceu?
_O carro está em um trânsito bem grande agora... Deve demorar uma hora até chegar aqui.
_Uma hora?!_Anny se espantou.
Algumas pessoas que estavam no banco a espera do ônibus a encararam com um olhar zangado.
_Me desculpe_disse Gael em tailandês, se curvando completamente constrangido.
Ele olhou para Anny e colocou a mão sobre suas costas.
_Vem, vamos pegar o metrô... Já cancelei a corrida.
_Metrô?_perguntou Anny.
_Sim_respondeu Gael enquanto caminhavam._Tem um metrô dentro do aeroporto.
_E por que não me disse isso antes?
_Porque eu me esqueci que aqui é a cidade dos trânsitos.
Gael e Anny voltaram para o mesmo lugar em que desceram do jato, seguindo adiante em uma porta que dava acesso a um corredor.
_Tem certeza de que é aqui?_perguntou Anny preocupada.
_Tenho, não se preocupa... As placas estão dizendo que o metrô fica por aqui.
Ao chegarem no fim do corredor, eles se depararam com uma escadaria, que descia até um outro espaço do aeroporto. Lá, eles encontraram a cabine onde se compravam os bilhetes do metrô, e por incrível que parecesse, estava bem vazio.
_Eu te disse que era aqui_falou Gael confiante.
_Vou ter que começar a aprender Tailandês se quiser sobreviver nesse lugar_murmurou Anny.
_Na verdade, não é necessário... Se você souber falar inglês, vai conseguir se virar por aqui.
_Sério?
_Ué, claro que sim... Você não sabia que aqui eles também falam inglês?
Anny ficou toda envergonhada.
_C-Claro que eu sabia.
_Sei...
Os dois caminharam e se aproximaram do gabinete.
_Olá, boa noite_disse Gael em inglês.
_Boa noite_respondeu o moço do gabinete na mesma língua._O que desejam?
Gael olhou o mapa das estações em que o metrô fazia as suas paradas, mas antes que ele dissesse algo, Anny respondeu por ele.
_Dois bilhetes para a estação de Ratchaprarop, por favor.
_Ok_o moço digitou no teclado do computador._São dezesseis Bahts.
_Aqui_Gael lhe entregou seu cartão.
_Crédito ou débito?.
_Débito.
Gael pagou o bilhete e o moço do gabinete retirou dois papeizinhos de sua bancada.
_Prontinho, aqui estão seus bilhetes... Vocês tiveram bastante sorte hoje_disse o moço._O metrô fica bem vazio neste horário, e o seu trem já já deve passar.
_Que bom então_Gael sorriu e se despediu._Muito obrigado.
_Tenham uma boa noite e uma boa viagem_disse o moço.
_Você também_respondeu Anny.
Eles passaram pela roleta e esperaram ao lado dos trilhos até que o trem chegasse, entrando e se sentando nos bancos até as placas eletrônicas avisarem que a estação Ratchaprarop seria a próxima parada.
***
{Estação Ratchaprarop (Ratchaprarop Station) }
Gael e Anny desceram do trem e seguiram adiante nas escadarias até o lado de fora do metrô.
_Como você sabia que aqui era o lugar certo?_perguntou Gael.
_Eu pesquisei pelo prédio Starry Night no Google Maps, e ele me mostrou que fica bem perto dessa estação.
Gael ficou bastante surpreso com a rapidez e agilidade da garota. Ele nem tinha visto Anny retirar o celular do bolso. Talvez tivesse feito isso enquanto olhava no mapa das estações.
Os dois andaram pela rua observando os arredores desconhecidos. Não demorou muito até que se deparassem com um restaurante filipino bem a sua frente. Os estômagos dos dois pareciam suplicar por comida.
_Pode ser esse daqui mesmo?_perguntou Gael.
_Comendo é o que importa_respondeu Anny.
Eles apertaram o passo e entraram no restaurante com malas e tudo nas mãos. Alguns clientes do restaurante até encararam os dois assim como as pessoas no ponto de ônibus, mas os dois não pensavam em nada mais além de comida naquele momento. Se sentaram em uma mesa perto da parede e colocaram as malas embaixo dela.
O garçom percebeu a sua presença no restaurante e se aproximou deles com sua comanda e caneta nas mãos.
_Olá, boa noite_disse o garçom em tailandês._Sejam bem-vindos ao Gintong Pamumula.
Naquele momento, Gael e Anny se forçaram a não rir do jeito que ele pronunciou o nome do restaurante. Seria uma tremenda falta de respeito rir da língua de outra pessoa.
Gael desviou o olhar de Anny e se recompôs.
_Muito obrigado.
_Gostariam de pedir algo?
Anny e Gael vasculharam as opções do cardápio.
_Eu vou querer essa sobrecoxa de frango Filipina e um Ensaladang Talong.
_Ok... E você senhorita?
Anny olhou para o garçom como se estivesse decifrando um enigma.
_Ele perguntou o que você vai querer_disse Gael para ajudá-la._Pode responder em inglês se quiser.
_Eu vou querer um Halo-Halo e essa sobrecoxa de frango também_respondeu Anny em inglês.
_Muito bem_disse o garçom._É só aguardar, por favor.
_Ok, obrigada_disse Anny.
Um tempo se passou, e os dois já haviam conversado, rido de assuntos completamente aleatórios de suas vidas e comido os pratos que pediram ao garçom. Gael pagou a conta e saíram do restaurante com o estômago cheio.
_Nossa...acho que devia rever minha opinião sobre a comida daqui_disse Anny.
_Digo o mesmo... Aquela comida estava uma delícia!_respondeu Gael.
A frente deles, uma placa luminosa indicou se tratar do prédio Starry Night. Ele não era tão alto quanto aqueles colossais que viram enquanto estavam sobrevoando a cidade, mas não ficava para traz no quesito de estética moderna.
Gael e Anny se aproximaram da porta de entrada e a garota se virou para ele.
_Já está bom por aqui... Obrigada por me acompanhar, e por pagar os bilhetes do metrô e a comida... Fico te devendo uma.
_Por nada... Não podia te deixar vir até aqui sozinha.
Gael olhou por entre a porta de vidro e viu a recepcionista.
_Tem certeza que não precisa mais da minha ajuda?
Anny também voltou seu olhar para a recepcionista.
_Vou ficar bem, não se preocupe... É só falar em inglês, não é?
Gael sorriu e lhe entregou as malas.
_Agora eu preciso...
Anny não perdeu tempo e lhe deu um beijo na bochecha.
_...ir_terminou Gael sem reação.
_Tenha uma boa noite, Gael_disse Anny sorridente.
A garota juntou suas malas e entrou dentro do prédio sem dizer mais nenhuma palavra. Gael colocou seus dedos sobre o lugar em que Anny o havia beijado, dando um sorriso tão bobo quanto o de alguém que estava começando a se apaixonar de novo.
_Você também...Anny_murmurou ele.
Gael virou as costas para o prédio e caminhou de volta até a estação de metrô.
***
_Ah, fala sério_murmurou Gael indignado.
Ao voltar para o metrô e conversar com o funcionário do gabinete, a próxima partida até a estação mais próxima da casa dos Ayutthaya demoraria em torno de duas horas até que o trem chegasse. E digamos que tempo não era o que Gael tinha em abundância naquele momento.
Ele havia dito ao pai que chegaria a tempo para o jantar. Não podia fazê-lo passar tamanha vergonha na frente de um possível parceiro de negócios.
_Merda_Gael olhou em seu celular o aplicativo do Uber, mas o trânsito ainda continuava o mesmo._Vou ter que comprar uma bicicleta se eu quiser andar nesse lugar.
Gael estava tão estressado e vidrado na tela de seu celular que acabou atravessando a faixa de pedestre no sinal vermelho.
Uma moto estava vindo pela rua em alta velocidade, e antes que percebesse, Gael apenas conseguiu ver o clarão dos faróis sobre seus olhos. Ele sentiu algo se agarrando ao seu casaco e o puxando com força para trás, tudo isso em uma fração de segundos tão rápido quanto uma piscada de um olho.