Capítulo 3 Lembranças

Despedidas podem ser realmente difíceis, mas Gael não tinha em mente que aquilo seria um adeus. Ele acreditava com todo o seu coração que era apenas um até logo, e se não fosse, o faria ser.

Passou com seu carro na entrada de um condomínio de luxo bem próximo do mar. O lugar era imenso, repleto de praças, áreas de lazer, clubes e diversos outros lugares.

O carro parou a frente do portão de uma enorme mansão com estética modernizada, e o mesmo se abriu sozinho para que o automóvel pudesse se dirigir para dentro. Gael desceu por uma rampa e estacionou o carro ao lado de vários outros automóveis, que mais pareciam ser uma coleção em tamanho real de carrinhos de brinquedo.

De uma Lamborghini Huracán á uma Ferrari 488 Pista Spider, todas aquelas maravilhas pertenciam a tão famosa e bem sucedida família Salles, a família mais rica de todo o Brasil, ou para ser bem mais específico, a família de Gael.

Ele nunca se importou muito com todos aqueles luxos que podia ter por estar em uma família multimilionária. Nunca deixou que aquilo subisse a sua cabeça, já que preferia mil vezes uma vida simples do que toda essa baboseira de ser o filho do dono da SallesCorp, o então "herdeiro do trono".

Gael seguiu para um canto daquele enorme estacionamento, onde ficavam as portas de um elevador. Elas se abriram e ele entrou na cabine, apertando o botão para o andar de cima.

_Que dia_murmurou Gael retirando o elástico do cabelo .

A porta do elevador se abriu e revelou uma sala de estar moderna, do mesmo tamanho ou um pouco menor que o estacionamento, com uma parede inteiramente feita de vidro temperado ao lado da grande porta de entrada.

Tudo parecia estar bem silencioso naquela casa, o que poderia ser normal pelo tamanho do lugar. Mas Gael estava sentindo que havia alguma coisa de errado.

De repente, alguém saltou sobre suas costas.

_Maninho! Você voltou!.

Gael sorriu e virou-se para trás assim que um garotinho saiu de cima dele. Seus olhos eram no tom verde oliva, um pouco mas não tão semelhantes aos de Gael, se pareciam mais com os de seu pai. Seu cabelo cor de mel era cortado no estilo social, e quanto as roupas, estava com um pijama e pantufas do Pikachu.

_Claro que eu voltei, Brian_Gael chegou nos ouvidos do irmão._Não podia te deixar sozinho com aquela mulher.

_A bruxa do setenta e um?

Quem você está chamando de bruxa?, ecoou uma voz pela sala.

No outro lado, Teresa estava parada com os braços cruzados lhes encarando. Brian logo se escondeu atrás de Gael com medo.

"Falando no diabo, pensou Gael"

_Você nunca teve infância não?_perguntou Gael em desdém._Estávamos falando sobre o Chaves.

_Eu não perco meu tempo assistindo essas babozeiras de televisão. São uma completa perda de tempo_disse Teresa de forma grosseira._Devia fazer o mesmo se quiser se tornar o próximo dono da SallesCorp.

_Deve ser por isso que você é carrancuda desse jeito_murmurou Gael bem baixinho.

Brian escutou e riu da cara de Teresa.

_Eu ouvi isso, seu moleque_respondeu Teresa impaciente._Posso ser mais velha do que vocês dois juntos, mas não sou surda.

Gael olhou nos olhos de Brian e sussurou:

_No três.

Brian assentiu com a cabeça.

_Um...dois...três!!

Gael pegou seu irmãozinho no colo e correu para dentro do elevador. Antes que Teresa os alcançasse, Brian apertou o botão para o segundo andar e as portas se fecharam bem a tempo.

O garotinho desceu do colo de Gael e eles correram pelo corredor até o quarto do garotinho. Ele era inteiramente feito com estrelas florescentes das paredes ao teto, simulando um céu estrelado quase tão belo quanto o de Ilhabela.

Gael ajudou seu irmãozinho a se sentar na cama.

_Você já jantou?

Brian balançou a cabeça afirmando e bocejou, esfregando seus olhos.

_Papai me deu o jantar mais cedo... Ele disse que é para eu dormir agora por conta da viagem de amanhã. Só que eu queria esperar você chegar.

Gael sorriu.

_Então sua missão já foi cumprida... Vou te colocar para dormir agora.

Gael ajeitou seu irmão no travesseiro e cobertores, se ajoelhando ao lado da cama.

_Maninho_chamou Brian.

_Oi_respondeu Gael.

_Você pode cantar a música que a mamãe gostava de cantar?... Eu quero ouvir ela de novo.

Gael por um momento se paralisou, mas não viu problema em reviver essa lembrança por seu irmãozinho. O problema era que ao mesmo tempo sendo doce e feliz, ela deixava um enorme buraco em seu peito apenas por relembra-la.

_Está bem...

Gael passava as mãos nos cabelos de Brian enquanto cantava Minha Felicidade da Roberta Campos, com uma voz suave e lenta. Brian logo foi fechando seus olhos a cada segundo que se passava da música, e quando Gael acabou, o garotinho já estava dormindo.

Gael se levantou e beijou a testa de Brian, saindo do quarto e fechando a porta.

_Bons sonhos maninho...

No corredor, uma das empregadas se aproximou de Gael.

_Com licença senhor... O senhor Ulices quer que você desça. O jantar já está sendo servido.

_Obrigado Lurdes... Já estou descendo.

A empregada se retirou dali e continuou a seguir pelo corredor. Quando Gael percebeu, estava agarrado ao seu colar de concha, soltando-o e descendo as escadas em direção a sala de jantar.

***

_Aí está você_disse Ulices feliz.

Gael se sentou na mesa, bem de frente com Teresa.

_Como foi com seus amigos?_peeguntou Ulices.

_Não quero falar sobre isso_Gael mexia com a colher na comida como se não tivesse interessado em comer.

Ulices suspirou e olhou para Teresa. Aquela mulher se portava a mesa em extrema elegância, tanta que chegava até a incomodar Gael apenas por comer da forma "correta".

_Vamos demorar quase um dia inteiro no avião até Bangkok, e provavelmente chegaremos lá a noite... Então espero que já tenha arrumado todas as malas que vai precisar levar.

_Já... Não preciso que se preocupe comigo.

_Eu só lhe avisei porque não quero atrasar nosso compromisso com o senhor Kaden... Ele é um homem muito ocupado assim eu e seu pai.

_E por falar nele_completou Ulices antes que uma briga acontecesse._Assim que chegarmos a Tailândia, iremos participar de um jantar de boas-vindas em sua casa... Ele disse que seria bom que nossas famílias se conhecessem antes de partimos para os negócios.

Gael assentiu.

_Mais algum aviso importante?

_Por enquanto é só_respondeu Teresa.

_Então se me derem licença_Gael se levantou da cadeira._Vou ir me deitar... Boa Noite.

Gael se retirou da sala de jantar e subiu para o seu quarto.

_Boa noite_respondeu Ulices tentando entender o por que de seu filho estar daquele jeito.

Existem lembranças no fundo do nosso subconsciente que desejaríamos nunca mais ter que relembrar novamente. Aquelas lembranças que não fazem você apenas se recordar do que aconteceu alí, mas vivenciar e sentir toda a dor e todo aquele sofrimento que seu coração jamais desejou sentir novamente.

Às vezes se recordar de uma lembrança, mesmo sendo uma das piores da sua vida, só mostra o quanto você foi forte o suficiente para lidar com ela até hoje.

            
            

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