Capítulo 4 A TAÇA DE CRISTAL Capítulo Sete

Estela tem dezessete anos. E, por ser a caçula em uma família de três irmãs, se acha no direito de ser "a princesa da casa". Afinal, seus menores caprichos são atendidos por seus pais. Suas irmãs é que não gostam muito da história, mas... e daí? Helena, quatro anos mais velha, é muito chata. Vive querendo dar ordens a ela... até parece que iria obedecer sua irmã, mesmo. A ultima das duas foi uma briga por causa de uma blusa de Helena que ela usou para sair com Jairo, seu namorado.

Que carnaval Helena fez quando a viu chegar em casa usando aquela blusinha azul com babados na manga, coisinha mais linda, meu Deus... Ficou perfeito, pensou Estela, quando a vestiu...ficou melhor em mim do que fica para ela, pensou. E, sem pensar muito, vestiu a blusa favorita de Helena e saiu com o namorado para irem ao cinema. E então, quando chegaram...

Quando Helena viu a irmã chegar, usando sua roupa sem permissão, praticamente voou sobre esta.

Quando sua mãe percebeu a discussão acalorada que se fazia, correu para fora para ver o que estava acontecendo. E viu Helena agredindo Estela. E aquilo estava errado, afinal Helena era muito mais velha que a irmã, pensou a mãe...

O ônibus apontou na esquina, e Estela desperta de seus pensamentos. Ela já está atrasada para a aula de reforço que está fazendo... anda meio ruim de matemática, está péssima em física...a única matéria em que vai bem é a de educação física. Pena que no Brasil ir bem nos esportes não tem influência alguma quando for a hora de se matricular na Faculdade... Pelo menos nos filmes, se o aluno vai mal nas matérias do currículo, mas é um bom desportista, tem grandes chances de cursar uma Universidade...

Já passava das sete da noite quando a menina chegou em casa. Sua mãe já estava preocupada. Afinal, ela saiu de manhãzinha, disse que ia estudar para a prova na casa de uma colega, e sumiu durante o dia todo. Para que tudo ficasse perfeito, ela deixou o celular desligado o dia todo. "Onde você estava, menina?"pergunta a mãe, aflita... "Você não sabe que a gente fica preocupada? Como você pode sumir assim o dia todo?" Estela finge que não ouviu. Sua mãe coloca a mão em seu ombro e a faz parar...

- Não ouviu o que eu disse?

-Ahn? Que foi, mamãe?

- Eu perguntei onde você passou o dia todo. Na casa de amiga é que não foi... liguei para todas elas quando você não apareceu para o almoço, e ninguém te viu, hoje...

-Que saco, mãe! Eu precisava de um tempo para pensar...

-Pensar? No que? Você pensa em alguma coisa, afinal?

- Mãe, dá um tempo! Estou cheia de problemas....

- Que problemas? A sua vida é só comer e dormir...

- Mãe!!!

- Mas é a mais pura verdade. Suas irmãs, quando tinham a sua idade , já trabalhavam...

- Pronto, já começou...

- Filha, o que estou dizendo é que, para você, a gente consegue dar uma vida melhor... você tem chances que suas irmãs nunca tiveram...

- E por acaso a culpa é minha?

- Não foi isso o que eu disse... por que é que você sumiu o dia todo?

- Já falei... tinha que pensar em alguns problemas...

- Mas que problemas são esses?

- É coisa particular, mãe...depois eu falo...

- Tá bom... e a escola?

- Faltei hoje... fui passear no shopping, depois assisti um filme...

- E ainda diz que tem problemas... eu é que queria ter uma vida igual a sua, quando tinha a sua idade...

- Sei... a senhora sempre diz isso...

- E não é? Deita a hora que quer, levanta quando bem entende, vai pra escola só quando tem vontade... vai repetir de novo, se não se cuidar. Se a gente mostra seu boletim para um touro em uma arena, não precisa nem de bandeira vermelha...

- Mãe, deixa de ser exagerada!

- Exagerada? Quem é que vai mal em português, matemática, história, biol...

- Mãe, chega!

- História! Como é que alguém pode ir mal em História, meu Deus? É uma matéria tão gostosa de se ver...

- Pelo amor de Deus... se a senhora não parar, vou sair de novo!

- Ah, mas não vai, mesmo, mocinha... acha que já é dona de seu próprio nariz?

- Mãe...

- Eu e seu pai fazemos tudo por você... a única coisa que te pedimos é que leve seus estudos a sério... acho que não é pedir demais...

Estela ficou lívida. Trincou os dentes. Olhou para sua mãe com uma expressão furiosa, deu-lhe as costas e subiu as escadas em direção aos quartos...

- Mocinha, volte aqui! Ainda não acabei de falar com você...

Estela continuou a subir, e respondeu, sem se virar...

- Acabou, sim. Boa noite!

- Mas... não vai comer? A janta já está pronta!

- Estou sem fome. Comi um lanche no shopping...

Acabou de subir os lances de escada e trancou-se em seu quarto. Sua mãe ficou parada, sem saber o que fazer. Então ela sentiu uma mão pousar delicadamente em seu ombro. Era Mario, seu esposo e pais das três garotas.

- Dia difícil, né?

- Nem faz ideia... juro que não sei o que se passa na cabeça dessa menina!

- Calma Janete... deixa ela! Tem hora que tudo o que a gente precisa é ficar só! Lembra quando tinha a idade dela, que qualquer coisa que acontecia parecia que o mundo ia acabar?

- Era diferente, Mario...

- Claro que era diferente. Afinal, as coisas estavam acontecendo com você, não é mesmo?

- Mario, você sabe como são as coisas...

- Não, meu bem... eu não sei. Porque não me conta?

- ...

- A gente faz assim... vamos jantar, então você me põe a par de tudo que está acontecendo...

- Eu...

- Não sei você, mas eu estou morrendo de fome... e sua comidinha está com um cheiro tão bom...

- Mário...

- Azar da Estela, estar sem fome... vai sobrar mais pra mim...

Janete sorriu. E, abraçados, os dois seguiram para a cozinha. Enquanto isso, no quarto, Estela caminhava de um lado para o outro , como se estivesse presa em uma jaula. Seu semblante continuava tenso. Ela realmente estava preocupada. Depois de algum tempo, sentou-se na cama, colocou as mãos no rosto e ficou assim. Pegou seu celular, olhou alguma coisa no mesmo e o guardou novamente. Ficou parada, olhando o nada no infinito... era como se o seu corpo físico estivesse ali, mas não seu espírito. Deitou-se de costas na cama e ficou olhando fixamente o teto, como se quisesse enxergar através deste e ver o que existia além. E assim ficou, até que acabou adormecendo, de sapatos e tudo, pois não se dera ao trabalho de descalçá-los...

            
            

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