Ela me chamou de coitada, uma sanguessuga patética tentando viver às custas do dinheiro dele. Então, ela e seus seguranças quebraram três das minhas costelas e exigiram dois milhões e meio de reais para me deixar ir.
Tudo isso enquanto Heitor, o irmão por quem sacrifiquei tudo, ignorava minhas ligações desesperadas. Ele estava ocupado demais festejando na cobertura que eu paguei.
Quando finalmente soube o que aconteceu, ele ficou do lado dela. Ele me chamou de uma velha amarga e ressentida, um monstro tentando arruinar sua felicidade.
A dor física não era nada comparada à constatação arrepiante de que o homem que protegi por décadas era um parasita.
Deitada naquele chão de concreto frio, eu entendi. Eu não ia apenas cortar os laços com ele. Eu ia queimar seu mundo inteiro até as cinzas, começando pelo segredo de trinta anos sobre seu nascimento que eu havia jurado proteger.
Capítulo 1
Meu mundo se estilhaçou com um sussurro, não um grito. "Eu me arrependo de cada segundo que perdi te amando. Acabou." Isso não foi uma escolha; foi uma rendição a uma verdade que eu evitei por tempo demais.
O bar do hotel zumbia com o murmúrio de conversas caras. Eu estava sentada em uma mesa de canto, invisível em minhas roupas de ginástica gastas. A garçonete, uma jovem de olhos nervosos, tinha acabado de voltar. Ela pigarreou.
"Me desculpe, senhora", ela gaguejou, "mas a conta corporativa do Sr. Alcântara... parece que foi recusada para este tipo de despesa."
Uma irritação familiar me atingiu. Heitor. Sempre o Heitor. Ele usava aquela conta para tudo. Uma única taça de Chardonnay não deveria ser um problema. Tentei manter minha voz calma, uma tranquilidade que desmentia a frustração crescente.
"Você poderia tentar de novo, por favor?", pedi, empurrando minha carteira de motorista sobre a madeira escura e polida. "É Alessandra Alcântara. Meu meio-irmão, Heitor, sabe que eu a uso."
A garçonete se encolheu, olhando nervosamente em direção ao bar. Meu olhar seguiu o dela. Chris Matos. A namorada do Heitor. Ela estava atrás do balcão, um sorriso de escárnio já se formando em seu rosto perfeitamente maquiado. Eu conhecia Chris de seu antigo emprego, uma gerente de bar que contratei anos atrás. O cargo que ela ainda mantinha, apesar de seu status social elevado como o bibelô do Heitor.
Os olhos de Chris, afiados e calculistas, fixaram-se nos meus. Ela se aproximou, seus movimentos deliberados, seus saltos altos batendo um ritmo de desprezo no piso de mármore. Ela arrancou o bloco de notas da garçonete.
"Está com problemas, querida?", Chris ronronou, sua voz escorrendo uma falsa preocupação, alta o suficiente para que os que estavam por perto ouvissem. "Ah, é você de novo."
Meu estômago se contraiu. Eu odiava esses confrontos inúteis. Preferia conduzir meus negócios em salas de reunião, não em bares de hotel. Especialmente não nos bares do meu hotel.
"Chris", eu disse, tentando manter um tom profissional, "parece haver um mal-entendido. Eu sou Alessandra Alcântara. Esta é a conta do meu irmão."
Chris soltou uma gargalhada teatral, um som áspero e irritante que atraiu olhares curiosos dos poucos clientes. Meu rosto corou. Isso era um absurdo. Eu era a CEO do Grupo Hoteleiro Alcântara. Este era o meu hotel.
Ela se inclinou para perto, seu hálito cheirando a menta e algo doce, provavelmente um dos coquetéis caros que ela gostava. "Ah, eu sei quem você é, queridinha", ela sibilou, sua voz pouco acima de um sussurro, mas carregada de veneno. "A coitadinha que o Heitor de vez em quando joga um osso. O quê, sua mesada já acabou? Tentando se aproveitar dos fundos da empresa dele de novo?"
Minha mente girou. Coitadinha? Mesada? Eu financiava toda a existência do Heitor. Cada luxo, cada capricho.
"Você deve estar enganada", eu disse, minha voz agora tensa com uma raiva crescente. "Eu sou Alessandra Alcântara." Fiz uma pausa e acrescentei: "A CEO."
Chris riu de novo, mais alto desta vez, jogando a cabeça para trás. "Ah, a 'CEO'! Hilário! Escuta, querida, eu te vejo por aqui com frequência, sempre à espreita. Sempre vestida como se tivesse acabado de sair da cama, tentando fingir que pertence a este lugar. Deixa eu deixar uma coisa clara: o Heitor é o dono deste lugar. E eu administro." Ela apontou um dedo com a unha feita para o recibo descartado. "Ele me disse especificamente: 'Não deixe ninguém além de mim usar esta conta.'"
Um pavor gelado se espalhou por mim. Heitor sabia que eu usava aquela conta. Ele realmente tinha dito isso a ela? Isso era um teste? Uma piada?
"Acho que você precisa checar novamente com o Heitor", eu disse, minha voz perigosamente baixa. "Ou talvez você pudesse apenas verificar os detalhes da conta. Ele é meu meio-irmão."
Peguei meu celular, um instinto súbito me dizendo para ligar para ele. Chris me observava, seu sorriso se alargando. O telefone tocou uma, duas vezes... e caiu na caixa postal. Tentei de novo. Caixa postal. Um arrepio percorreu minha espinha. Isso não era um erro. Era deliberado.
O sorriso triunfante de Chris foi um soco no estômago. "Viu? Ele provavelmente está ocupado com alguém importante. Não com alguma aproveitadora desesperada procurando uma bebida de graça."
Eu a encarei, as peças se encaixando. O ciúme dela. Sua insegurança. Sua necessidade desesperada de proteger seu acesso à riqueza de Heitor. Ela me via como uma ameaça. E Heitor... Heitor estava permitindo que isso acontecesse.
"Eu não sou uma aproveitadora", afirmei, minha voz desprovida de emoção, o choque dando lugar a uma clareza arrepiante. "Eu sou a dona deste hotel. Eu sou a dona da empresa que é dona deste hotel. E você, Chris Matos, é uma funcionária dessa empresa."
O rosto de Chris se contorceu, sua falsa doçura desapareceu. "Não se atreva", ela rosnou, sua voz perdendo a suavidade pública. "Não se atreva a tentar bancar a chefinha comigo. Você acha que eu não te conheço? Acha que eu não sei que você tenta seduzir o Heitor há anos, tentando colocar as mãos no dinheiro dele? Seu joguinho patético acaba agora."
Ela se inclinou novamente, seus olhos queimando com um fogo odioso. "Você não é nada. Uma velha triste e solitária que não consegue arranjar um homem, então tenta roubar o de outra pessoa. E ainda tenta roubar do meu Heitor usando o dinheiro dele? Que falta de vergonha!"
Minha mente ficou em branco. A audácia. O veneno puro e absoluto. Eu podia sentir os olhos dos outros clientes em nós, murmúrios começando a se espalhar. A humilhação pública era uma queimadura lenta, transformando meu estômago em cinzas.
Chris se endireitou, um brilho de prazer malicioso em seus olhos. Ela bateu palmas duas vezes, secamente. "Segurança!", ela gritou.
Duas figuras enormes de terno escuro, seguranças do Hotel Alcântara, moveram-se rapidamente em direção à nossa mesa. Bruno Viana, o gerente geral do hotel, não estava por perto, o que era incomum. Uma constatação fria me atingiu: isso foi orquestrado.
"Esta mulher está causando tumulto", anunciou Chris em voz alta, apontando para mim. "Ela está invadindo e tentando cometer fraude. Tirem-na daqui. E garantam que ela não volte."
Os seguranças olharam para mim, depois para Chris. Eles sabiam que Chris era a namorada de Heitor. Sabiam que ela tinha influência. Minha natureza reservada, minha preferência por trabalhar nos bastidores, de repente jogou contra mim. Eles não me reconheceram como a Alessandra Alcântara.
Antes que eu pudesse protestar, antes que pudesse pronunciar uma única palavra, suas mãos se fecharam em meus braços. O aperto era forte, doloroso. Meus pés deixaram o chão enquanto eles me meio arrastavam, meio carregavam pelo saguão opulento. Eu me debati, um gemido silencioso escapando dos meus lábios, mas a força deles superava em muito a minha. Com a dignidade em frangalhos, eu era uma boneca de pano em suas mãos. Os rostos dos clientes se transformaram em uma névoa de julgamento.
Eles não me levaram para a saída. Eles me guiaram para um corredor de serviço, uma passagem escondida que eu sabia que levava aos fundos do hotel. Meu coração martelava contra minhas costelas. Isso não era mais apenas sobre uma bebida.
O corredor era sinuoso, escuro e estreito. Meu corpo raspava nas paredes de gesso áspero. Avistei uma porta, uma porta pesada de ferro com uma placa: "Adega - Acesso Restrito". Eles me empurraram através dela, e o ar ficou instantaneamente mais frio, mais pesado, cheirando a terra úmida e fermentação.
Eu tropecei, mal conseguindo me equilibrar antes de cair. A sala era mal iluminada por uma única lâmpada nua. Prateleiras de garrafas de vinho revestiam as paredes, um cenário incongruente para o que estava acontecendo. Antes que eu pudesse processar o ambiente, outro empurrão me jogou no chão de concreto frio. Os guardas se foram, sem nem olhar para trás. Apenas Chris Matos permaneceu, sua silhueta na porta, seu sorriso uma promessa arrepiante de algo verdadeiramente sinistro.
A porta pesada bateu, mergulhando a sala em quase escuridão, exceto pela luz fraca da lâmpada. O som ecoou, me selando lá dentro. O cheiro de mofo e vinho velho encheu minhas narinas. Eu estava sozinha, verdadeiramente sozinha, com ela. Meu coração batia um ritmo frenético contra minhas costelas. Isso não era apenas humilhação. Era algo muito, muito pior.