A minha mente vaga pelas memórias que me confundem, sinto um líquido quente e asqueroso escorrer pela minha testa... Estou sangrando. Olho para trás e confiro o que eu já havia previsto, o meu carro quase que totalmente destruído na parte da frente por ter colidido contra uma árvore ao lado da estrada.
Tudo fica em silêncio, ainda confusa com o que aconteceu, ouço ao longe o som das sirenes das ambulâncias se aproximarem rapidamente, olho para os lados e vejo os rostos preocupados e assustados das pessoas que antes estavam a jantar no restaurante ao lado.
Uma dor de cabeça forte seguida de um zunido surgem do nada, sinto-me tonta, logo tudo fica escuro, e memórias antigas vem a tona.
Dez anos atrás...
- Noah, o que você quer ser quando crescer?
- Não sei, talvez um advogado ou um cirurgião?
- Eu quero ser uma cantora! - rio -
- Cantora? Sério? - ele sorri -
- Uhum, assim eu posso viajar pelo mundo inteiro! - rio - E talvez eu encontre o meu verdadeiro amor.
O mais velho olha para mim e ri.
- Do que está rindo?
- Admita, Emma, você só quer isso para ver se consegue casar com um olho puxado.
- Ei! São asiáticos, não "olho puxado", mas prefiro os coreanos, são mais bonitos.
- Talvez sejam, mas beleza nunca define caráter, Emma.
Olho para cima, admirando o céu azul, a brisa leve chacoalhando os nossos cabelos, a piscina de chão ao lado do Noah, a água morna por conta do sol deste verão, estamos deitados no deck de madeira da piscina, aproveitando o clima.
- Acha que eles ainda estão brigando?
- Quem?
- A mamãe e o papai - Observo os olhoabzul ciano dele -
Vejo ele olhar para as mãos dele, eu queria poder saber o que tanto o preocupa, o que o deixa com este olhar pesado e exausto.
- As vezes um casal discute por coisas bobas, Emma, mas não significa que não se amam, vão existir algumas ideias que um não vai concordar, por exemplo, quando estamos brincando, não brigamos as vezes?
- Sim.
- E isso significa que não nos amamos?
- Não - Falo convicta -
- Exato, eu amo você porquê é minha irmã mais nova, e é tipo isso que acontece na vida de um casal, ninguém é perfeito Emma, lembre-se disto.
- Então você acha que eles vão continuar juntos?
- Claro, eles são "perdidamente apaixonados" um pelo outro, o papai já falou que não conseguiria viver sem a mamãe, já fez até serenata para ela - Ele sorri levemente e bagunça os meus cabelos -
- Ei! - Rio os arrumando -
- Eu amo você maninha, para sempre - Ele me abraça forte -
Dias atuais...
Acordo numa cama hospitalar, o lugar é um pouco frio por conta dos ar-condicionados, abro os meus olhos lentamente, tendo a visão turva e assim que uma luz do teto e as minhas pupilas se encontram, uma dor de cabeça forte invade a minha mente.
O meu corpo formiga bastante, observo os acessos no meu braço direito, o som do soro pingando, a máquina ligada fazendo um "beep" sem fim que mostra os meus batimentos cardíacos, o meu pulso esquerdo enfaixado pelo tecido branco amarelado, e então me lembro...
- Noah...
A minha voz sai quase como um sussurro, mas rapidamente ouço a voz do meu pai e sinto ele segurar a minha mão e a apertar levemente.
- Emma! - Ele fala com felicidade estampada no seu semblante -
Ele sai e fala alto no corredor do hospital "A minha filha acordou! A minha filha acordou!". Uma enfermeira vem no meu quarto hospitalar para ver como estou, ela confere tudo detalhadamente.
- Como está se sentindo?
- Bem, mas estou com dor de cabeça e o meu corpo continua a formigar um pouco.
- Isso é normal, mas vou te trazer um comprimido para a sua dor de cabeça.
Vejo em seu uniforme azul bebê um crachá com o seu nome "Nathalie". A mulher de aparente uns 29 anos de pele negra continua a anotar mais e mais, o seu cabelo preso num coque no topo da sua cabeça, os cabelos castanhos escuro encaracolados dando destaque a sua maquiagem básica, a aliança no seu dedo anelar, dá a entender que ela é casada, droga, seria uma ótima cunhada, bem melhor do que a vaca da namorada do meu irmão mais novo, Steve, na verdade, qualquer mulher seria melhor que aquela víbora interesseira.
O meu pai me tira dos meus pensamentos quando fala comigo.
- Pensei que fosse te perder, filha - Ele fala com os olhos já vermelhos e marejados -
- Eu não vou a lugar algum, pai - Sorrio a olhar nos seus olhos -
Vejo a minha mãe entrar no quarto.
- Emma... Ai meu Deus! - Ela vem até mim e me abraça - O que você tinha na cabeça, menina! Queria se matar?!
- Rio - Também te amo, mãe - Retribuo o abraço, sentindo o seu cheiro doce do perfume clássico que usa desde os meus seis anos, ela gostou tanto dele que desde então só compra ele.
- Eu iria te matar se você ousasse morrer!
- Eu sei, mãe - Rio -
- Fiquei tão preocupada quando o seu pai me contou que você tinha sofrido um acidente, Emma - Ela fala com uma voz de choro -
- Mas como aquilo aconteceu? - Pergunta o meu pai -
- Não sei, eu só me lembro que em um momento eu estava dirigindo e no outro eu estava andando na rua sem rumo algum.
- Vamos resolver tudo com calma, o mais importante é a recuperação da Emma agora - A minha mãe sorri orgulhosa enquanto fala -
- Você está certa, amor.
O resto do dia se passou num sopro, os meus pais vão para a casa deles depois de eu os convencer de que estou bem...
Me deito de lado e fecho meus olhos tentando pegar no sono e tentar mudar os pensamentos, logo sinto meu corpo amolecer e se render ao cansaço e finalmente adormecer.