O cheiro de poeira e livros velhos me sufocava, mas não mais que a percepção de frio se espalhando pelo meu corpo.
Eu estava morta, mas abri os olhos e a luz do sol da tarde entrava pela janela do meu quarto de adolescente.
Meu coração batia descontrolado, uma versão mais jovem de mim me encarava no espelho, sem as marcas de cansaço e tristeza que a vida com Lucas havia gravado em mim.
A data circulada no calendário me atingiu como um soco: véspera do vestibular, o começo do meu fim.
Lembrei-me de Lucas, o namorado de infância que se tornou meu carrasco, e de Sofia, a "verdadeira paixão" que roubou tudo de mim.
Naquela mesma noite, Lucas me ligaria com uma desculpa esfarrapada sobre Sofia precisar de ajuda, me convencendo a faltar à revisão final para o vestibular.
Foi a primeira de muitas sabotagens: ele interferiu nas minhas provas, criou "acidentes" para me impedir de brilhar, tudo para que eu não tivesse um futuro que ele não pudesse controlar.
A crueldade final foi a doação de sangue repetida, que me levou à infertilidade e à ruína, me forçando a um casamento infernal.
Ele se suicidou por ela, me deixando para trás com os pedaços de uma vida que não era minha.
Respirei fundo, o ar do meu quarto parecendo novo e cheio de possibilidades, porque desta vez, eu não seria a garota ingênua e apaixonada.
Eu conhecia suas fraquezas, seus medos, suas manipulações; desta vez, eu seria egoísta, protegeria meu futuro e me vingaria.
Meu celular tocou, o nome "Lucas" na tela fez meu estômago revirar.
Atendi, minha voz firme, e quando ele me convidou para sair, esperando que eu cedesse como sempre, um sorriso frio se formou em meus lábios.
"Não."
Houve um silêncio chocado do outro lado da linha, e antes que ele pudesse começar suas manipulações, eu desliguei.
A garota no espelho já não era uma vítima, mas uma sobrevivente pronta para lutar, e a guerra pela minha vida tinha acabado de começar.