Aos nove meses de gravidez, estava presa no carro sob um dilúvio, a água subia rapidamente.
O motor calou-se, o pânico instalou-se, e liguei a Léo, o meu marido, a implorar por ajuda.
Ele atendeu, impaciente, e ao fundo ouvi a voz da sua meia-irmã, Sofia, a queixar-se do gato dela.
"A Sofia está em pânico," ele disse, com a voz dura. "Não te podes desenrascar sozinha? Liga para os bombeiros."
E desligou.
Fui engolida pela água gelada enquanto o meu carro se desintegrava à minha volta.
Acordei num hospital, a minha barriga vazia, o meu bebé tinha morrido.
Mas o Léo não estava lá. Ninguém da sua família estava.
Quando ele finalmente apareceu com o pai, Ricardo, não havia dor, apenas irritação.
Ricardo disse: "Isto é uma tragédia terrível."
E Léo acrescentou: "Estas coisas acontecem."
Eles culparam-me por ter saído à rua, queriam que eu superasse por "bem da reputação familiar".
"Estas coisas acontecem"? Como podia ser tão frio?
Eu tinha implorado pela minha vida, pela vida do nosso filho, e ele escolheu a sua meia-irmã e o gato dela?
Onde estava o homem que eu amava? Que tipo de família era esta que me deixava morrer?
A verdade, fria e cruel, encontrei-a no Facebook.
Uma amiga de Sofia publicou uma foto: Sofia e amigas num café chique.
A legenda: "Sorte que o Léo nos veio salvar com o seu jipe. O nosso herói!"
A hora da publicação. Quinze minutos depois de eu lhe ter implorado ajuda.
Léo não estava a acalmar Sofia ou o gato; ele estava a servir de motorista a um grupo de mulheres aborrecidas num café.
Naquele momento, enquanto ele me olhava sem culpa, apenas com raiva, as minhas palavras saíram claras.
"Quero o divórcio."