Capítulo 2 Meio dia, 27 de Abril

Estou em frente à praça da cidade vejo um pequeno amontoado em volta do palco, minutos antes de 2 garotas serem arrastadas pra lá. Vanda está do meu lado agoniada, olha de relance e comenta:

-" Elas foram acusadas de bruxaria." -já eram as oitavas daquela semana.

Engulo em seco, e continuo olhando, uma delas julgo ser a mais nova, olha exatamente na minha direção fixa em meus olhos,vejo os lábios dela sussurrando "socorro". Tento me recordar de onde a conheço, começo a puxar memórias e sem me dar conta já andei alguns passos, estou de frente ao palco agora, quando um flash me remete Mariana amiga de vovó e suas duas filhas na sala. Mariana ria enquanto bebia um pequeno copo de vinho, vovó cantarolava, como se o amanhã não existisse eu e as duas meninas dançávamos na sala, uma roda, um círculo e a pureza escorrendo diante dos meus olhos. Volto ao momento um homem as acusa de pegarem flores na floresta, o que pareceu normal pra mim pois Mariana vendia chás em uma pequena barraca ao lado da padaria, procuro na multidão não a vejo. Observo enquanto o homem esbraveja e cita diversos acontecimentos as acusando, vejo os 3 juízes parados analisando a cena, a primeira uma mulher alta e loira, o segundo um homem gordo e careca e o terceiro um velho com uma bengala.

A dois meses levaram uma pequena mulher a fogueira, eu a vi queimar, me lembro de suas lágrimas em meio ao fogo, ela foi a primeira, eu via medo na multidão e desejo, medo de mulheres tentando proteger suas filhas, desejo de uma grande maioria em ver queimar.

Percebo que me perdi em pensamentos e a primeira juíza a mulher alta e loira, deu o seu veredito:

-" Não as vejo como bruxas, vejo mulheres em formação, que estão ajudando a mãe em seu árduo trabalho, não irei condená-las."

Vejo um suspiro de alívio em meio às pessoas. Não vejo nenhum sinal de Mariana.

O segundo juíz decide que é a sua deixa:

-" Pois bem, vejo que é exatamente isso que elas querem transparecer essas bruxas estão cada vez mais ardilosas sabem enganar, sabem ludibriar mas jamais me passaram pra trás. Queimem ! Queimem !."

Vejo a multidão repetindo o final, e sinto uma camada fina e quente se aproximar. O tempo congelou ao meu retorno mais é como se eu não fizesse parte dele toco as pontas dos dedos pra ver se realmente estou ali, vejo Mariana andando calmamente em direção ao velho, sussurrando algo em seu ouvido, ele concorda com a cabeça. O mundo volta ao normal tudo aconteceu em menos de 1 segundo e parece que só eu percebi, olho ao redor procurando sinais, procurando Mariana mais não a acho. Volto a mim quando começo a ouvir vaias na multidão, o velho as declarou inocente, as pessoas aos poucos e resmungando voltam ao seus afazeres. Olho pra Vanda que olha fixamente pra mim, decido por fim perguntar:

- " Você viu Mariana, na multidão ?!"

Ela faz que sim com a cabeça.

Tudo que eu precisava ver, pego a pelo braço e saio a arrastando dali.

                         

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