Capítulo 4 Visita dos sogros

Depois daquela intensa discussão, Eduardo se encontrava em um turbilhão de pensamentos enquanto rolava de um lado para o outro em sua cama, incapaz de encontrar conforto ou paz para adormecer. Cada vez que estava prestes a sucumbir ao sono, a voz dela ecoava em sua mente, suas palavras carregadas de angústia e questionamento penetrando profundamente em sua consciência.

"Por que eu tenho que ser a única vilã?"

As palavras dela ressoavam como um mantra, reverberando pelos recantos de sua mente atormentada.

Eduardo permaneceu nesse estado de agitação mental até os primeiros raios de sol anunciarem a chegada de um novo dia e a obrigação de ir trabalhar se tornar inevitável. Ao descer as escadas, foi recebido pela voz preocupada de Elô, sua governanta.

- Bom dia, senhor Eduardo... o senhor irá tomar café da manhã? - ela perguntou gentilmente, notando a exaustão estampada em seu rosto.

- Não, estou sem fome! - Eduardo respondeu abruptamente, sua voz carregada de cansaço e frustração.

- E Felícia, já se levantou? - perguntou Eduardo, seus olhos varrendo a casa em busca dela.

- Não, senhor! Estava indo agora a chamar. - respondeu Elô.

- Está certo! - Eduardo assentiu.

Ao se dirigir para a porta, um gesto automático, Eduardo percebeu subitamente a ausência de algo em seu pulso. Seu relógio, um objeto que normalmente era uma extensão de seu corpo, estava notavelmente ausente.

- Eduardo, por onde anda sua mente? - ele murmurou consigo mesmo, enquanto dava meia-volta e retornava às escadas.

Ao chegar em frente ao seu quarto, Eduardo foi surpreendido ao ver Elô correndo em sua direção, seus passos apressados ecoando pelo corredor enquanto ela o chamava desesperadamente.

- Senhor, a senhora... ela não quer acordar, por mais que eu chame... ela não acorda. - O tom de voz de Elô estava carregado de aflição, seus olhos buscando desesperadamente os de Eduardo em busca de orientação.

- Como assim? - Eduardo perguntou, tentando processar a gravidade da situação.

- Acho que a discussão de ontem foi pesada demais para ela! - Elô disse, deixando claro que, embora não estivesse presente durante a briga, ela tinha ouvido tudo da cozinha.

Eduardo correu até o quarto de Felícia e ficou chocado com a bagunça que encontrou lá dentro. Papéis e lápis estavam espalhados pelo chão, algumas roupas estavam amontoadas na mala enquanto outras estavam jogadas ao chão em um emaranhado caótico. Ele se aproximou rapidamente e encontrou Felícia desacordada ao lado da foto de seu falecido pai.

- Felícia? Ela está quente! - disse, alarmado, ao sentir o calor emanando de seu corpo ao tocá-la.

Sem hesitar, ele a ergueu em seus braços e a levou até seu carro, dirigindo em alta velocidade em direção ao hospital mais próximo.

No quarto do hospital, Felícia estava deitada na cama, já medicada, mas ainda mergulhada em um sono profundo e inquieto. Eduardo permanecia ao seu lado, mantendo uma certa distância enquanto observava-a atentamente. Sua mente estava repleta de lembranças da noite anterior, das palavras ditas por ela.

- Pai... - sussurrou Felícia, sua voz fraca e distante, chamando por aquele que fora seu refúgio desde a infância, aquele que a vida cruelmente havia tirado dela.

Algumas horas depois, Felícia despertou e se viu surpreendida pela presença de Eduardo, que a observava com um olhar preocupado.

- Onde estou? - perguntou, sua voz carregada de confusão ao notar que não estava em seu quarto.

- No hospital! Estava inconsciente, então a trouxe. - A voz de Eduardo soava suave e reconfortante, como se ele estivesse tentando acalmar qualquer desconforto que ela pudesse sentir.

- Ah! - Felícia evitava olhar para ele.

- Se estiver se sentindo melhor, podemos retornar para casa. - comentou ao perceber o desconforto dela por estar perto dele.

Ao receber alta do hospital, Felícia e Eduardo percorreram todo o caminho de volta em silêncio, cada um imerso em seus próprios pensamentos. Nem mesmo um olhar foi trocado entre eles durante a viagem de volta.

Ao chegarem em casa, Elô recebeu Felícia com alívio estampado em seu rosto preocupado.

- Menina! Digo, senhora...

- Desculpa por preocupá-la. - Felícia disse, ao ver o rosto preocupado de Elô.

- O que importa é que está bem! - Elô sorriu gentilmente. - Venha, vou levá-la ao seu quarto.

Elô segurou no braço de Felícia e a acompanhou até o quarto dela.

- Onde estão os meus desenhos? - Felícia perguntou ao notar o quarto organizado.

- Eu os coloquei dentro da gaveta perto da sua cama. - respondeu Elô apontando para a gaveta.

- Obrigada! - Disse enquanto se acomodava na cama e logo adormecia novamente.

Do lado de fora do quarto, Elô encontrou Eduardo escorado na parede, visivelmente preocupado com o estado de Felícia.

- Ela está bem, Senhor! - Elô assegurou, notando sua expressão de preocupação. - Está dormindo novamente.

- Dormindo? Ela não já dormiu o bastante? - Eduardo questionou, com um visivelmente preocupado.

- Deve ser reação das medicações... - O senhor já comeu?

- Não!

- O almoço já está pronto, se quiser comer posso lhe servir. - Elô ofereceu.

- Vou tomar banho primeiro, estou com o cheiro do hospital impregnado nas minhas roupas.

Meia hora depois, Eduardo saiu do seu quarto e permaneceu olhando em direção ao quarto de Felícia por alguns segundos, antes de decidir ir vê-la. Ele bateu na porta, mas não obteve resposta, indicando que ela ainda estava dormindo.

A noite havia chegado e Felícia continuava adormecida.

- Quer que eu vá chamar, senhor? - perguntou Elô, depois de ter posto a mesa do jantar.

- Não, pode deixá-la dormir. - respondeu Eduardo.

- Como o senhor quiser... tenha um... - antes que Elô pudesse terminar de falar, a campainha tocou.

- Está esperando alguém, senhor? - perguntou Elô, estranhando a visita.

- Não, ninguém! - Eduardo respondeu, surpreso com a visita inesperada.

Ao abrir a porta, Elô percebeu que as visitas eram Dirceu e Olga, pais de Eduardo.

- Quem era? - Eduardo perguntou ao ver Elô retornar.

- Mãe? Pai? - ficou surpreso com a visita deles.

- Para que esse espanto todo? Por acaso seus pais não podem vir aqui? - questionou Olga, com sua habitual rigidez.

- Não, é que... não esperava a visita de vocês. - explicou Eduardo, desconcertado.

- Onde está sua esposa? - perguntou Olga, notando a ausência de Felícia no jantar.

- No quarto dela...

- Ela não janta com você? - inquiriu Olga, lançando um olhar desaprovador para Eduardo.

Diferente de Dirceu, que sempre tratou Eduardo de forma leve, Olga sempre foi mais severa, já que ele se tornaria o herdeiro de tudo.

- Janta... - mentiu Eduardo, desconfortável. - Elô, chama Felícia, por favor!

Elô, obedecendo a Eduardo, dirigiu-se até o quarto onde encontrou Felícia saindo do banheiro.

- Menina, rápido... seus sogros estão lá embaixo esperando por você.

- O quê? - Felícia sentiu sua ansiedade aumentar novamente, pois não se sentia pronta para encará-los novamente.

- Eduardo a está chamando... vista-se rapidamente.

Sem ao menos secar o seu cabelo, Felícia foi ao encontro dos seus tios que agora eram seus sogros.

- Tio, tia... - Felícia os cumprimentou sem graça.

- Está doente? - Dirceu perguntou ao perceber o rosto dela um pouco pálido.

- Um pouco... - Felícia respondeu, tocando seu rosto e tentando desviar o olhar deles.

Durante o jantar, Olga lançava alguns olhares em direção a Felícia, deixando-a desconfortável sob sua análise.

- Felícia... - Olga a chamou.

- Sim, tia...

- Estão se empenhando para ter um filho logo? - a pergunta direta de Olga fez com que seu filho se engasgasse.

- O quê? - Felícia ficou chocada com a pergunta, enquanto Eduardo tentava disfarçar sua surpresa.

- O que foi? Por que estão me olhando com essas caras? Não foi para isso que se casaram? - Olga questionou, sem rodeios.

- Foi... mas ainda está cedo demais para isso. - Eduardo respondeu, recuperando-se do susto.

- Eu engravidei de você na primeira semana depois de casada.

Assim como Felícia, Olga também havia se casado para dar continuidade à tradição da família.

- Vamos dormir aqui hoje... - Olga anunciou de repente.

- O quê? - a voz de Eduardo saiu mais alta do que o esperado.

- Algum problema? - Olga perguntou, surpresa com a reação de seu filho.

- Não, nenhum! - Eduardo respondeu rapidamente, tentando manter a compostura.

- Elô, prepare o quarto mais afastado do quarto do casal para nós, por favor. - ordenou Olga, sem perceber a tensão no ar.

- Esse quarto não! - interveio Eduardo, enquanto Felícia também expressava sua objeção.

- Por que não? - Olga questionou, perplexa com a reação deles.

- Porque o banheiro dele está com um probleminha... - Elô interrompeu rapidamente, evitando que Olga descobrisse que Felícia estava dormindo lá ao invés de junto com Eduardo.

- Então prepare outro, mas que seja um pouco distante do quarto do casal... não quero correr o risco de ouvir eles em seu momento de intimidade. - determinou Olga, sem perceber a tensão crescente entre Eduardo e Felícia.

            
            

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