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- Professora, a senhora tem filhos? – Ouviu uma de suas alunas lhe perguntar.
- É professora, a senhora tem filhos? – E se fez um coral no meio dos alunos.
- Não, eu não tenho filhos. – Respondeu sorrindo, tentando conter aqueles olhares curiosos.
- Mas, por que? Você é tão bonita! – Disse Josias, arrancando um sorriso bobo de Emily.
- Porque ainda não é a hora! E vocês parem de me enrolar e façam logo a lição! - Advertiu ela.
- Acho que ela não quer... – Ouviu uma outra aluna dizer.
Bem, ela queria muito ter um filho, mas James sempre a alertava que ainda não era a hora. Ela que adorava dar aulas para as crianças, se perguntava quando teria uma. Quando seu ventre seria preenchido por um ser tão inocente, que mudaria completamente a sua vida?
Após a aula, ela foi para o mercado, e depois voltou pra casa. Olhou um momento para o lugar onde acreditou que seria o seu abrigo, seu lar. Mas, uma tristeza lhe invadiu, lembranças de quando ela e James se casaram vieram à tona. Lutaram tanto para mobiliar a casa, e agora que está confortável, ela é quem se sente desconfortável.
Ela olhava para a mesa vazia, outrora estariam felizes comemorando mais um ano juntos. Mas, julgando que James estava deitado no quarto tranquilamente, ele nem se lembrava da data. Ela apenas deixou sua bolsa no criado-mudo, e voltou para a cozinha.
- Você comprou a torneira para o banheiro? – Questionou ele, com um tom mal-humorado.
Emily sentiu uma aflição no peito. Como seu casamento tão feliz se reduziu à isso? Ela ainda tinha uma esperança dele se lembrar da data... talvez ele só estivesse brincando... Mas, James estava mesmo estressado por uma simples torneira.
- Ainda não. Eu passei só no mercado, assim que saí da escola. - Ela tentou não alterar seu tom. Pois sabia que isso ia resultar em mais brigas.
- Poxa, Emily! Eu deixei a merda do dinheiro para você comprar! – Disse ele irritado - Não pode ao menos fazer isso?
- Eu vou comprar mais tarde, não vamos morrer por cauda disso! – Afirmou ela já sentindo seus nervos à flor da pele.
Era a data de aniversário de casamento, e ele estava preocupado com uma maldita torneira...
- Comprar mais tarde? – Ele a encarava irritado - Você sempre deixa as coisas para mais tarde! Esse é o problema!
- Quer saber? Que se dane! Se quiser compre você a maldita torneira – Retrucou ela, depois disso, saiu sem rumo.
As compras ficaram em cima da mesa, e James gritava para ela voltar.
- Emily, deixa de ser infantil! – Foi a última coisa que ela conseguiu ouvir ele falando.
Como ele poderia ser tão insensível? " você sempre deixa para mais tarde? " ele que deixava, ela sempre teve que cuidar dos problemas, já que de acordo com ele, o trabalho dela não era cansativo. James dava mais valor no trabalho do que no próprio casamento, pensou ela, enquanto lutava para esconder as lágrimas que insistiam em cair.
Enquanto andava, ela dizia para si mesma o quão trouxa era! Por um momento achou que ele faria algo diferente, que ao menos iria se lembrar... Seu aniversário passou completamente em branco, e James tentou compensar com um presente... um perfume. Ele nem sequer entregou o presente direito, apenas deixou lá, de qualquer jeito.
James havia mudado muito! Ela ainda se lembrava com clareza das incontáveis vezes que tentou conversar, tentar de alguma forma mudar aquela situação, mas ele estava sempre muito ocupado. Eram reuniões, atrás de reuniões. James não esquecia nenhuma...em compensação...
Depois de caminhar por um tempo, ela decidiu voltar para casa, já que suas amigas estavam ocupadas demais em seus trabalhos ou com os filhos. E nem filhos ela tinha. Talvez fosse a vida dizendo que certamente James não era o homem da sua vida.
James não estava mais em casa. As compras ainda estavam em cima da mesa, e ela se sentia uma completa fracassada.
- Quatro anos casada, e eu aqui, comendo lamêm! - Riu com ironia, lembrando que nessa data eles saíam para almoçar ou jantar fora.
Depois de guardar as compras que fizera, Emily tomou o remédio para o estômago, pois aquela dor estava se tornando habitual. Ela sabia o porquê. A casa estava sempre tão vazia que nem fome ela sentia, e isso já estava lhe dando prejuízo.
Ela adormeceu. Sua cabeça latejava, mas finalmente conseguiu dormir um pouco.
Emily acordou no susto. Ouviu um barulho imenso, e se levantou bruscamente. Seu coração ficou acelerado, era James bêbado novamente. Ela abriu a porta, e lá estava ele completamente embriagado, coisa que se tornou rotineira também. Depois de uma briga, uma tarde de trabalho, James bebia e chegava tarde.
- O que é que tá me olhando? – Começou as perguntas que mais tarde se tornaria uma conversa ofensiva.
- Vamos para o quarto. – Ela o pegou pelo braço, e pelo o estado dele, alguém o trouxe, certamente uma mulher, ela podia sentir o cheiro do perfume misturado naquele fedor de álcool.
- Eu não vou para lugar nenhum! Eu quero ir para casa! – Ele tentou se soltar.
- James, entra! – Falou seriamente, enquanto sua respiração lhe sufocava.
Ele obedeceu, mas não quis que ela o segurasse. Sem dúvida ele não lembraria disso no outro dia, e ela não faria questão de dizer, não adiantava.
Ela o levou para o outro quarto, e desejava mesmo que ele apenas entrasse e dormisse...
- Você estava com outro homem, né? – Perguntou ele, tentando tirar a camisa.
- Sim. – Respondeu de forma seca.
- Que bom! É bom saber que não estava sozinha!
Ela mordeu a língua, aquilo lhe dava nojo, mas era a única forma de fazer ele parar. Nas outras vezes, ela negava em vão, pois ele insistia que ela estava com outro homem.
- Você está bem? – Continuou a perguntar.
- Melhor sem você.
- Ah, é bom saber disso também!
- Deite e durma! – Ela torceu para que assim fosse.
- Você vai deitar do meu lado? – Ele fazia menção de se deitar.
- Não, vou dormir no outro quarto.
- Então durma bem, viu? – Ele se deitou e ela agradecia por isso.
- Não precisa, eu vou.
- Eu também vou, eu vou, dormir bem. – Era o que Emily desejava que ele fizesse, sem falar mais nada.
- Feche os olhos e faça isso em silêncio.
- Eu queria que a minha esposa estivesse aqui, você não viu ela?
Emily respirou fundo. Não imaginou que teria que lidar com um bêbado, e um que ainda esquecia de quem era ela. James era tão perfeito, que ela nunca sequer pensou em passar por isso.
- Durma, que ela virá amanhã.
- Eu vou...
Ele adormeceu. E ela foi para o outro quarto. Chorando, bastante. Odiava quando ele bebia, porque suas palavras a machucavam. Era dolorido não ser reconhecida pelo próprio marido. Era difícil não reconhecer a pessoa pela qual ela se apaixonou...
Sem nenhum resquício de sono, ela decidiu anotar mais um dia terrível em seu diário. Até dois anos atrás, dificilmente ela escrevia dias ruins, porque eles quase não aconteciam, mas nos últimos dois anos, dificilmente tinha um dia bom.
Mais um ano! – Anotou no final da folha.
Só mais um ano, e ela largaria James, e viveria sua própria vida. Já que ele não a tratava como esposa, mas como uma mera empregada, e suas relações não passavam de sexo, e isso quando ele queria... ela o deixaria. Ela sabia que já deveria ter feito isso, mas insistia numa mudança que não aconteceria.
Era a maldita dependência emocional que a prendia. Toda vez que arrumava suas coisas, se sentia incapaz de abandoná-lo, mesmo quando ela já sentia abandonada há muito tempo. Mas, agora era para valer! Organizaria sua vida nesses doze meses, alugaria uma casinha em outro lugar, e viveria bem. Era o que desejava.