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Eu não consegui dormir. Me mantive acordada e em alerta. Do outro lado da porta, a música tocava alta e era possível ouvir risadas espalhafatosas e conversas obscenas. Se eu planejasse uma fuga, para onde eu poderia ir?
Me encolho na cama ao ouvir o barulho da porta. Ela é aberta num estrondo e uma mulher magra de cabelos loiros desgrenhados entra. Ela tem o rímel borrado e torce o nariz numa careta.
-Você fez xixi na cama? Que porca!-ela bate palmas, impaciente.-vamos, levanta daí. Não temos o dia todo.
Eu me levanto num pulo e sigo-a. Quando atravessamos o corredor, as mulheres à nossa volta olham e cochicham umas com as outras.
-Pois é, meninas! Temos carne nova no pedaço. E ela ainda faz xixi na cama.
As meninas distribuídas no corredor põem-se a rir. Eu abaixo a cabeça constrangida e paro atrás da loira, ela coloca a mão na cintura e aponta para uma porta de madeira velha.
-Esse aí é o banheiro. É melhor você se despachar, não vai querer ver aquelas muralhas de mau humor.
Eu adentro o banheiro e suspiro agradecida ao sentir a água quente escorrendo pelo meu corpo. O sangue descendo pelo ralo me faz comprimir os lábios.
-Despacha logo garota. Tem uma fila aqui querendo usar o banheiro.
Eu me certifico de que já não há sangue em mim e só então abandono o banheiro, enrolada numa toalha que estava sobre a tampa do vaso. Olhares tortos fazem eu me encolher e abaixar o rosto.
-Tem roupas limpas na sua cama. Estou esperando você Cinderela.
Eu assinto e entro no quarto para me trocar. As roupas consistiam num short preto curto e uma regata branca. Calcei os all stars brancos desbotados que estavam ao lado da cama e prendi o cabelo num coque frouxo. O meu olho continuava bem machucado e havia marcas roxas pelo meu braço.
-Vamos logo, não temos o dia todo.
Eu me assustei quando um dos brutamontes adentrou com uma cara de poucos amigos. Ele me puxou pelo braço e foi me arrastando até a saída do prédio onde uma van preta aguardava. Sem delicadeza nenhuma ele me empurrou para dentro.
-Se mantenha calada durante todo o trajeto se não quiser que eu soque o seu outro olho.-declarou entredentes antes de fechar a porta na minha cara.
Eu entrelacei os meus dedos preocupada. Seria que eles estariam me levando para ser executada? Tentei ouvir o que eles diziam, mas parecia ser uma missão sem sucesso. Apenas o silêncio.
Após mais ou menos uma hora de viagem a van parou e o brutamontes mal humorado abriu a porta.
-Desce logo.- eu pisquei com medo. Medo...Medo... era só isso que eu conseguia sentir.-Use esses óculos escuros.
Eu olhei para o objeto confusa, mas ainda assim obedeci. Notei que estávamos no mesmo estacionamento de horas atrás, e o trajeto até ao elevador foi o mesmo. O rádio do brutamontes fez um ruído estranho antes dele atender, eu me mantive encolhida e ouvia curiosa enquanto ele conversava com a pessoa do outro lado, em russo. Eu não conseguia entender nada, mas esperava que eles não estivessem planejando a minha execução.
Diferente da noite passada nós estávamos indo para a cobertura do prédio. Quando as portas deslizaram eu fui arrastada para fora.
Fiquei com a boca completamente escancarada ao ver um imponente helicóptero. Era a primeira vez que eu via um tão de perto.
-Aonde vocês estão me levando?- gaguejando, eu consegui perguntar. Os meus pés estavam pregados no chão. Será que eles iriam me empurrar de uma grande altura?
-Cale a boca e não pergunte mais nada.
O meu cabelo foi puxado com força. Eu apenas caminhei com lágrimas nos olhos até ao interior do helicóptero, à raiz do meu cabelo doía enquanto o brutamontes a segurava, mas eu não tinha voz para reclamar da dor. Ele apertou o meu cinto de segurança e me entregou fones, eu estava muito confusa com tudo o que estava acontecendo.
Será que eu estava sendo levada a outro país para tráfico humano? Roubo de órgãos? Para ser prostituta? Milhares de alternativas terríveis passavam pela minha cabeça e eu só queria chorar.
O helicóptero pousou no aeroporto de La Guardea, New York, ao lado de um jato Lear pintado de um azul escuro, onde lia-se "MK" na cauda em letras cursivas e escuras. Na frente do jato estava um homem na casa dos trinta, vestido de um elegante terno preto. Quando as pás do rotor do helicóptero pararam, o brutamontes abriu a porta e me mandou aguardar. Ele trocou algumas palavras com o homem e então fez um sinal para que eu descesse.
-Você vai ficar caladinha e não vai fazer nenhuma tolice que coloque a sua vida em risco durante o voo. Acho que a essa altura já sabe do que nós somos capazes. Entendeu?
Eu apenas assenti, confusa. Fui levada até as escadas, apesar de assustadora e bizarra a situação que eu estava vivendo, nunca pensei que um dia eu pisaria num lugar como aquele. O interior do jato era inteiramente forrado com couro marrom, doze assentos individuais faziam pares, um em frente ao outro, e era tudo muito requintado.
O brutamontes me indicou uma poltrona e mais uma vez ajeitou o meu cinto de segurança.
Ele pronunciou um nome e então uma mulher de cabelos ruivos, presos num coque bem feito e o uniforme bem passado apareceu. Ela carregava uma bandeja com um copo. O seu rosto era sério e acetoso.
-Tome isso.- eu olhei desconfiada para o comprimido que me era estendido. Pensei em negar, mas a cara de poucos amigos do homem de dois metros à minha frente me deixava trêmula.- Prefere levar outro soco?
A contragosto recebi o comprimido. Engoli-o, e tive que provar a eles que não o havia escondido debaixo da língua. Aos poucos eu fui sentindo um cansaço imenso, tentei lutar contra ele, mas era impossível. Quando dei por mim, os olhos estavam pesados e só conseguia ouvir vozes ao fundo.
Será que eu estava sendo levada para o meu fim? O que eles fariam comigo?