/0/14448/coverbig.jpg?v=ecfd9119821ea68514f172010417c2b6)
As duas semanas seguintes foram estranhamente silenciosas. Rebeca seguiu sua rotina como sempre: acordava cedo, ia à livraria, assistia às aulas, estudava até tarde. Mas havia um detalhe diferente em seus dias - uma ausência. Um pensamento que voltava sempre nos momentos mais calmos. Ele. O homem misterioso. Ela não sabia seu nome. Só lembrava do olhar, da presença marcante, e do modo como ele parecia enxergá-la por inteiro em segundos. Tinha certeza de que ele a reconheceu no café, mesmo fingindo o contrário. E tinha quase certeza de que ele foi até lá por ela. Mas depois daquele dia...
nada. Nenhum sinal. Nenhuma aparição. Nenhuma explicação. No fundo, achava que era melhor assim. Ele era claramente de um mundo diferente. Um homem feito de silêncios, terno bem cortado e intenções que ela não sabia se queria decifrar. Mesmo assim... ela olhava para a porta do café todos os dias. Esperando. Fingindo que não. Mas esperando. Até que ele voltou. Foi numa tarde de sexta-feira. O movimento era tranquilo. Rebeca estava lendo um capítulo de Processo Penal atrás do balcão, completamente imersa nas entrelinhas, quando ouviu o tilintar da porta. Seu coração reconheceu antes dos olhos. Ele entrou com a mesma calma de sempre. Vestia camisa azul escura dobrada até os cotovelos, sem gravata. Mais descontraído, mas ainda elegante. Os cabelos um pouco desalinhados. Um leve cansaço no rosto - e o mesmo olhar firme que a atravessava. Rebeca congelou por um instante. - Café preto? - ela perguntou, tentando soar casual. Ele sorriu de leve. - Achei que você não fosse lembrar. - Eu lembraria até seu perfume, se quisesse - pensou. Mas só disse: - Eu tenho boa memória. Preparou o café com as mãos um pouco trêmulas. Ele se aproximou do balcão, observando-a com a mesma atenção de antes. - Rebeca, não é? Ela levantou os olhos, surpresa. - Sim. Você... lembra? - claro que lembro. Silêncio. Ela entregou o copo e ele agradeceu com um aceno. - Posso te fazer uma pergunta? - ele disse, antes de sair. Rebeca assentiu, cautelosa. - Você tem alguma coisa pra fazer hoje à noite? O tempo pareceu parar por um segundo. - Hoje? - ela perguntou, confusa. - Eu sei que é repentino. Mas pensei... talvez um jantar. Nada formal. Só conversa. Um lugar tranquilo. Ela mordeu o lábio, surpresa. Ninguém nunca a havia convidado pra sair daquele jeito. Não alguém como ele. Não com tanta calma, tanta certeza, e ainda assim, tanto mistério. - Eu... - hesitou. - Eu trabalho até as oito. - Então posso te buscar às oito e meia. - Eu nem sei seu nome - ela disse, antes que pudesse se conter. Ele sorriu de canto, como se estivesse esperando por isso. - Gabriel. Gabriel Ferraz. Ela repetiu o nome mentalmente. Agora ele tinha um nome. Ainda era um mistério... mas com identidade. - Tudo bem, Gabriel. Às oito e meia. Ele assentiu, agradeceu novamente e saiu. Rebeca ficou parada por longos minutos, tentando entender o que acabava de acontecer. Algo dentro dela dizia que aceitar aquele convite era cruzar uma linha. Mas algo mais forte dizia que ela já tinha cruzado... desde o momento em que esbarrou nele naquele corredor. E agora, não havia mais volta. Os pensamentos tomaram conta de Rebeca naquele instante, por um momento ela viu-se questionando se havia feito a coisa certa ao aceitar sair com ele, afinal ela não sabia praticamente nada sobre aquele homem. Mas estava na hora de ela se permitir viver um pouco, talvez até dar uma chance pro amor. Rebeca merecia ser feliz, já tinha sofrido muito naquela vida.