Entre a Crueldade e a Redenção
img img Entre a Crueldade e a Redenção img Capítulo 2
3
Capítulo 3 img
Capítulo 4 img
Capítulo 5 img
Capítulo 6 img
Capítulo 7 img
img
  /  1
img

Capítulo 2

JP recebeu as cinzas da avó numa urna simples. Segurava-a com força, o único conforto físico que lhe restava. Pediu também ao hospital que guardassem os restos mortais do feto. Um pequeno recipiente, quase insignificante, mas que continha um universo de dor.

Antes de desaparecer, JP preparou o seu contra-ataque. Gravações de conversas comprometedoras de Tiago, mensagens trocadas entre Sofia e o amante, cópias dos seus próprios relatórios médicos que atestavam a sua fertilidade, e o relatório de Sofia, cuidadosamente arquivado, que confirmava a sua dificuldade em engravidar. Deixou tudo em cima da cama que partilhara com Sofia, ao lado do pequeno recipiente com os restos do feto. Uma despedida silenciosa e brutal.

Ligou para Helena. Antiga colega da faculdade de arquitetura, agora uma bióloga marinha respeitada, a liderar um projeto de conservação no Algarve. Sempre houve uma ligação especial entre eles, um carinho não expresso.

"Helena? Sou eu, o JP. Preciso da tua ajuda. Desesperadamente."

Com a ajuda dela, o plano tomou forma. Uma tempestade perfeita estava prevista para a costa. JP alugou um pequeno barco. Deixou um bilhete de suicídio vago na sua secretária, falando de desespero e perda. Ao amanhecer, com o mar revolto, o barco foi encontrado à deriva, vazio. João Pedro fora dado como desaparecido, presumivelmente morto.

Ele estava agora a caminho do Algarve, com uma nova identidade, pronto para se juntar ao projeto de Helena. Pedro Silva. Um nome simples para uma nova vida.

Sofia voltou do hospital, o corpo dorido, a alma vazia. O aborto fora rápido, clínico. Ela tentou não pensar, mas a imagem do rosto de JP, quando lhe contou a sua decisão, assombrava-a.

Entrou no quarto. Viu a urna na mesa de cabeceira. Depois, os papéis na cama. E o pequeno recipiente.

Curiosa, pegou nas folhas. Começou a ler. As mensagens. As gravações. A voz de Tiago, cruel e manipuladora, a gozar com ela, a planear como extorquir mais dinheiro, a vangloriar-se de outros casos. Depois, os relatórios médicos. A sua infertilidade. A fertilidade de JP. O sacrifício dele.

A verdade atingiu-a com a força de um maremoto.

Ela olhou para o pequeno recipiente. O seu filho. O único filho que ela provavelmente alguma vez teria. Destruído. Por ela. Por causa de um mentiroso, de um manipulador.

Um grito animal rasgou-lhe a garganta. Caiu de joelhos, o corpo a convulsionar em soluços.

O telefone tocou. Era a polícia.

"Sra. Almeida? Temos notícias sobre o seu marido, João Pedro... Lamentamos informar..."

O mundo de Sofia desabou por completo. JP. Morto. E ela, a culpada.

Poucos dias depois, recebeu uma carta do advogado de JP. Um pedido de divórcio póstumo. Ela assinou, o corpo a tremer, a mente num nevoeiro de choque e culpa.

Mas a culpa rapidamente deu lugar a uma fúria fria. Tiago. Ele iria pagar. Ela usaria todo o seu poder, toda a sua influência, para o destruir. E depois... depois encontraria JP. Recusava-se a acreditar que ele estava morto. Tinha de haver uma explicação. Ela iria encontrá-lo. Tinha de o fazer.

                         

COPYRIGHT(©) 2022