Laços de Sangue, Laços de Alma
img img Laços de Sangue, Laços de Alma img Capítulo 3
4
Capítulo 4 img
Capítulo 5 img
Capítulo 6 img
Capítulo 7 img
Capítulo 8 img
Capítulo 9 img
Capítulo 10 img
Capítulo 11 img
Capítulo 12 img
Capítulo 13 img
Capítulo 14 img
Capítulo 15 img
Capítulo 16 img
Capítulo 17 img
Capítulo 18 img
Capítulo 19 img
Capítulo 20 img
Capítulo 21 img
Capítulo 22 img
Capítulo 23 img
Capítulo 24 img
img
  /  1
img

Capítulo 3

Dois dias depois, Pedro teve alta. Voltar para casa foi como entrar em território inimigo. João nos esperava na sala, com uma expressão de preocupação ensaiada no rosto.

"Graças a Deus vocês voltaram! Fiquei tão preocupado! Por que não me atendeu? Por que me bloqueou, Maria?" , ele perguntou, tentando me abraçar.

Eu me esquivei. "Não me toque, João. Onde você estava quando seu filho quase morreu de febre?"

"Eu já te disse, a Sofia se machucou, eu precisava ajudar!" , ele se defendeu. "Eu não sabia que era tão grave com o Pedro. Você devia ter insistido!"

"Insistido?" , repeti, incrédula. "Eu te liguei vinte e três vezes, João. Vinte e três. Enquanto você estava no hospital com a sua amante por causa de um pulso torcido, seu filho estava delirando. Você sabe qual foi o diagnóstico dele? Uma infecção bacteriana que poderia ter chegado ao cérebro. Você sabe qual é a comida favorita dele? O nome do melhor amigo dele? Você sabe qual é o maior medo que ele tem? Não, você não sabe nada. Porque você nunca se importou."

Cada palavra saía carregada de anos de ressentimento contido. João me olhou, chocado com a minha explosão. Ele não estava acostumado com essa Maria.

"Maria, você está exagerando... É claro que eu me importo com o Pedro."

"Então prove" , desafiei. "Amanhã é a feira de ciências da escola dele. Ele passou os últimos dois meses trabalhando em um projeto de robótica. Ele quer muito que você vá. Você vai?"

João hesitou. "Amanhã? Puxa, amanhã eu combinei de levar o Lucas no zoológico. Prometi pra Sofia..."

Eu ri. Um riso seco, sem humor. "Claro. O zoológico. Muito mais importante."

Antes que a discussão pudesse continuar, a campainha tocou. Eram Sofia e Lucas.

"Oi, gente! Viemos visitar o Pedrinho! Soube que ele ficou doente, coitadinho" , disse Sofia, com sua voz melosa. Lucas correu para dentro, já procurando por alguma coisa para brincar.

"Maria, que bom que o Pedro já está em casa. A gente podia aproveitar e ir todos juntos ao zoológico amanhã, o que acha? Uma saidinha em família!" , sugeriu Sofia.

"Não, obrigada. Nós temos um compromisso" , respondi, seca.

A feira de ciências aconteceu no dia seguinte, em um ginásio lotado de pais e alunos. João, para minha surpresa, apareceu. Mas, como sempre, ele não veio sozinho. Sofia e Lucas estavam a tiracolo.

O projeto de Pedro era incrível, um pequeno robô que conseguia desviar de obstáculos. Ele explicava o funcionamento com um orgulho tímido, e meu coração se enchia de amor. João ouvia com uma expressão entediada, enquanto Sofia não parava de mexer no celular.

Em certo momento, o diretor da escola subiu ao palco para dar algumas palavras. João, que era um empresário conhecido na cidade e um dos patrocinadores do evento, foi convidado a subir também.

"Gostaria de agradecer ao senhor João da Silva por seu apoio à nossa escola" , disse o diretor. "Um pai dedicado e um exemplo para a nossa comunidade."

João pegou o microfone, sorrindo. "Obrigado, diretor. A educação é o futuro. E eu faço tudo pelos meus filhos." Ele fez uma pausa e olhou para a plateia. "Meu filho Pedro é um menino muito inteligente, mas meu sobrinho, Lucas, é um verdadeiro gênio! Tenho certeza que ele também vai estudar aqui um dia e nos dar muito orgulho. Um brinde à família!"

Ele levantou a mão e acenou na direção de Sofia e Lucas, que estavam na primeira fila. Todos aplaudiram. Eu olhei para Pedro. Ele estava ao meu lado, e seu rosto ficou pálido. A humilhação pública, a preferência descarada do pai, foi como um soco no estômago.

Eu o abracei com força. "Não liga pra ele, meu filho. Eu tenho muito orgulho de você."

Mais tarde, enquanto os juízes passavam pelas bancadas para avaliar os projetos, a catástrofe aconteceu. Estávamos conversando com um dos professores quando ouvimos um barulho de algo quebrando e um grito.

Corremos de volta para a nossa bancada. O robô de Pedro estava no chão, em pedaços. Ao lado, Lucas chorava, apontando para o meu filho.

"Foi ele, mamãe! Foi o Pedro! Ele me empurrou e quebrou o robô dele!" , gritava o menino.

"O quê? Eu não fiz nada!" , protestou Pedro, os olhos arregalados de espanto. "Eu nem estava aqui!"

Sofia correu e abraçou o filho, lançando um olhar acusador para Pedro. "Como você pôde fazer isso com seu primo, Pedro? Ele é só uma criança!"

João chegou logo em seguida, o rosto fechado de raiva. Ele nem se deu ao trabalho de perguntar o que aconteceu. Ele olhou para o robô quebrado, para Lucas chorando e para Pedro em estado de choque. E tomou sua decisão.

"Pedro, peça desculpas ao seu primo agora!" , ele ordenou, a voz dura como aço.

"Mas eu não fiz nada, pai! Foi ele que quebrou!" , Pedro tentava se defender, as lágrimas começando a brotar em seus olhos.

"Não discuta comigo! Você está de castigo! Vai ficar um mês sem computador e sem sair de casa! E vai pedir desculpas na frente de todo mundo, para aprender a não ser invejoso e a não machucar os outros!"

A injustiça era tão grande, tão absurda, que me deixou sem ar. João agarrou o braço de Pedro com força e o arrastou para o centro do ginásio, onde todos podiam ver.

"Peça desculpas!" , ele rosnou.

Pedro olhava para o pai, o rosto banhado em lágrimas, a boca tremendo. Ele não conseguia falar. A humilhação era demais para ele.

Eu tentei intervir, correr até eles, mas Dona Elvira e uma tia de João me seguraram.

"Deixa, Maria. João sabe o que faz. Menino tem que ter disciplina" , disse minha sogra, com uma frieza cruel.

E ali, no meio daquela multidão, eu vi meu filho ser quebrado pelo próprio pai, por causa de uma mentira deslavada de uma criança mimada e de uma mulher perversa. Aquele foi o momento em que o amor que um dia senti por João se transformou em puro ódio.

                         

COPYRIGHT(©) 2022