Capítulo 3 A emoção acabou, que coincidencia é

As notas fluiam pelas teclas brancas e pretas do plano de calda que ficava em um estúdio isolado no prédio da empresa onde Fernando ensaiava. O lugar tinha sido feito exclusivamente pra ele, já que quando compunha, o pianista gostava de se isolar.

Naquela tarde, depois de conviver com Luíza por uma semana, vendo ela perguntar coisas sobre sua rotina, analisar as músicas, os ensaios, a agenda, depois de ter que ver seu rosto sorridente, seu corpo andando pra lá e pra cá nas salas de reuniões, depois de ter sido torturado a semana toda, ele precisava de um momento isolado.

Ele teve que sentar e fingir que não era Luíza o motivo de todas as suas letras emotivas de seu último álbum. Dizer na sua frente para a coletiva do dia anterior de que era um amor antigo, que não mantinham mais contato, que não sabia mais como a pessoa estava, mas que esperava que estivesse bem E feliz.

Ele suspirou pesado e começou outra canção, uma que não tinha lançado ainda, que estava presa na sua garganta.

"Amor, meu grande amor, não chegue na hora marcada

Assim como as canções, como as paixões e as palavras

Me veja nos seus olhos, na minha cara lavada

Me venha sem saber se sou fogo ou se sou água

Amor, meu grande amor, que chega assim bem de repente

Sem nome ou sobrenome, sem sentir o que não sente

Que tudo o que ofereço é meu calor, meu endereço

A vida do teu filho desde o fim até o começo"

Entao a porta do pequeno estúdio se abriu lentamente e Fernando ergueu os olhos vendo Luíza na entrada. Ele não parou de tocar enquanto a loira fechava a porta e ia a passos lentos até o banco do piano, se sentando ao seu lado. Fernando continuou tocando, e cantou a última estrofe.

"Amor, meu grande amor, só dure o tempo que mereça

E quando me quiser que seja de qualquer maneira

Enquanto me tiver, que eu seja o último e o primeiro

E quando eu te encontrar, meu grande amor, me reconheça"

As últimas notas ressoaram no ambiente e entao um silêncio se instalou, só as respirações dos dois eram ouvidas, os braços quase se encostando no pequeno banco onde sentavam lado a lado. Fernando fechou os olhos, dando uma curta risada.

- Então agora você faz marketing.

- Te surpreendeu? - a voz mansa de Luíza chegou em seus ouvidos, diferente da autoritária e intimidante Luíza Moraes que ele tinha visto na semana que passou.

- Sempre achei que seguiria a carreira do seu pai, afinal você faz tudo o que ele manda. - Fernando se arrependeu do que disse no momento em que as palavras saíram de sua boca - Desculpe, nao devia ter dito isso.

- Tudo bem - Luíza disse com um pequeno sorriso. - Afinal, você tem razão. Mas muito tempo se passou Fernando, eu acabei mudando de curso, e consegui construir uma carreira independente do meu pai.

- Porque você tá aqui? - Ele disse, finalmente. - Você não pode tá aqui por acaso, e eu prefiro pensar que não é por acaso, porque seria muita sacanagem sua vir trabalhar comigo.

- Porque seria sacanagem? Não seria só um emprego?

- Dado a nossa história nao, nao seria. Sua presença me tortura Luíza, acho que já deixei isso bem claro nas minhas músicas.

- Fer.... - Fernando se arrepiou ao ouvir o velho apelido com que era chamado pela mais nova - É claro que a proposta de emprego foi tentadora, quem não gostaria de trabalhar com o maior ídolo do momento? Mas não foi isso que me fez aceitar.

- O que foi então? - o pianista ergueu o rosto e olhou nos olhos de Luíza pela primeira vez desde que tinham se reencontrado.

- Eu voltei por você. Só por você.

- Luíza...

- Eu errei, eu sei que errei. Meu pai ele... bom... mas muito tempo se passou, e eu nunca te esqueci. E eu precisava saber se você já tinha esquecido. Aquele dia, quando você apresentou suas músicas... Fer, era nossa história contada... Entao eu entendi que você também não tinha esquecido. Eu resolvi arriscar.

- Muito tempo se passou Luíza, quase 10 anos...

- Eu sei, mas eu quero consertar as coisas. Se não ficarmos juntos pelo menos quero ter voce na minha vida. Me dá uma chance de provar que sou digna da sua confiança?

Fernando suspirou e colocou as mãos nas teclas do piano.

"Enquanto me tiver, que eu seja o último e o primeiro

E quando eu te encontrar, meu grande amor, me reconheça"

Ele cantou simplesmente então Luíza entendeu.

Fernando não prometeu nada, Luíza sabia que ela era o amor de sua vida. Mas muitas feridas ainda estavam vivas e pulsavam em seu coração.

Eles precisavam de tempo, de reconhecimento.

E eles teriam uma longa turnê de 1 ano pra isso.

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Amor meu grande amor - Barão Vermelho

            
            

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