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"Ethan, isso não é ético. É criminoso. Ela não consentiu."
Essas palavras arrepiantes, sussurradas no zumbido estéril de uma sala de cirurgia, foram a primeira coisa que ouvi enquanto a consciência tremeluzia de volta.
Meu coração martelava, um pavor frio serpenteando por minhas veias. Dr. Ben Carter, o velho amigo de Ethan, estava discutindo com ele.
"Ela é minha namorada, Ben. Praticamente minha esposa," Ethan zombou, sua voz tingida com uma casualidade assustadora. "Chloe precisa deste rim. Ava é uma combinação perfeita."
Rim. Chloe. Meu sangue gelou. A bela e frágil Chloe Vahn, que sempre assombrou nosso relacionamento, estava agora pegando um pedaço de mim, literalmente.
Tentei gritar, me mover, mas meu corpo parecia de chumbo, minha garganta áspera. Senti um puxão forte, uma linha de fogo ardente em meu lado - o bisturi. Dez anos de amor, de sacrifício, construindo Ethan Reed e sua empresa do nada, tudo por isso. Para ser fatiada como um animal pela mulher que ele realmente amava.
Quando finalmente recuperei a consciência total, Ethan estava ao lado da minha cama, com uma expressão ensaiada de preocupação no rosto, inventando uma mentira sobre um cisto ovariano rompido. Mas então, a conversa sussurrada de uma enfermeira que ouvi confirmou meu pesadelo: "O transplante de rim da Chloe... ele mal saiu do lado dela."
As peças se encaixaram com um baque. Meu desespero se solidificou em uma determinação fria e dura. Chega. Peguei meu celular, rolando até um contato para o qual não tinha ousado ligar. Noah Hayes, o rival de Ethan, um homem de integridade. Meu dedo tremeu enquanto eu digitava. "Noah," consegui dizer, minha voz rouca. "Você ainda está procurando por uma Diretora de Operações que conheça as estratégias da Reed Innovate... e talvez, uma esposa?"
O silêncio se estendeu, então sua voz, calma e séria, cortou o ruído do meu mundo em colapso. "Meu jato, em sete dias. LaGuardia."
A "bebida especial de recuperação" que Ethan me entregou tinha um gosto levemente metálico, mas ele sorriu, seus olhos se enrugando nos cantos.
"Para a sua fadiga, Ava. Beba tudo."
Eu confiei nele. Por dez anos, eu confiei.
Meus olhos ficaram pesados quase imediatamente.
A consciência se retirou lentamente, me puxando para uma escuridão espessa e xaroposa.
Acordei confusa.
Não na nossa cama, não em nenhum quarto que eu conhecesse.
O ar tinha um cheiro forte, como antisséptico.
Minha cabeça latejava.
Uma luz forte brilhava acima de mim.
Pânico, frio e rápido, apertou meu peito.
Isso não estava certo.
Então ouvi vozes.
Abafadas no início, depois mais claras.
A voz de Ethan, afiada de impaciência.
E outra, mais profunda, mais calma, mas tensa.
"Ethan, isso não é ético. É criminoso. Ela não consentiu."
Era a voz de Ben Carter.
Dr. Ben Carter. O velho amigo de Ethan de Yale. Um cirurgião.
Meu sangue gelou.
"Consentimento?" Ethan zombou, sua voz gotejando com um pragmatismo arrepiante que eu conhecia muito bem quando se tratava de seus desejos.
"Ela é minha namorada, Ben. Praticamente minha esposa."
"Chloe precisa deste rim. Ava é uma combinação perfeita."
"É um presente, na verdade. Um pequeno preço por tudo."
Chloe.
Claro.
Chloe Vahn, a mulher bonita e oca que sempre deteve um pedaço da alma de Ethan, o pedaço que Ava nunca conseguiu alcançar.
Chloe, que o abandonou quando ele estava quebrado após aquele acidente de esqui em Aspen, apenas para reaparecer quando ele estava poderoso novamente.
"Um pequeno preço?" A voz de Ben era incrédula, tingida com uma fúria que eu raramente tinha ouvido dele.
"O rim dela, Ethan? Depois de tudo que ela fez por você?"
"Ela colocou toda a sua carreira em pausa."
"Ela usou tratamentos experimentais em si mesma para fazer você andar de novo quando Chloe nem atendia suas ligações!"
A resposta de Ethan foi seca, desprovida de emoção.
"Chloe estava com medo. Ela é delicada."
"Ava é forte."
"Além disso, eu vou me casar com a Ava. Ela sempre quis isso."
"Considere uma compensação."
"Chloe precisa mais disso. A vida dela está em jogo."
Delicada? Chloe, cuja imprudência a levou a este ponto, insuficiência renal aguda.
Forte? Era essa a minha recompensa por anos de devoção inabalável?
Pelo aborto espontâneo que eu ainda lamentava, aquele que culpei pelo meu próprio estresse, nunca suspeitando dos "suplementos de ervas" que Ethan me incentivou a tomar, suplementos que Chloe havia fornecido?
Lágrimas picaram meus olhos, quentes e furiosas.
A traição, tão profunda que me roubou o fôlego, me inundou.
Meu corpo parecia de chumbo.
Tentei me mover, gritar, mas apenas um gemido fraco escapou dos meus lábios.
"Ela está acordando," disse Ben, sua voz urgente.
"Então seja rápido," Ethan retrucou.
"Eu quero que isso seja feito."
Um pavor frio, mais agudo do que qualquer dor física, me invadiu.
Senti uma pressão, uma sensação de puxão no meu lado.
Então, uma linha de fogo ardente.
O bisturi.
Minha mente cambaleou.
Dez anos. Uma década de amor, de sacrifício.
Dedicando meu intelecto, minha pesquisa em biotecnologia - pesquisa que uma vez me prometeu um futuro brilhante - à sua recuperação, à sua empresa, Reed Innovate.
Reconstruindo-o, pedaço por pedaço.
Para isso.
Para ser fatiada como um animal, um recurso a ser saqueado pela mulher que ele realmente desejava.
A escuridão girou novamente, acenando.
Desta vez, eu a acolhi.
A agonia física era um eco surdo do tormento que rasgava minha alma.
Meu rim. Meu amor. Minha vida, sacrificada no altar da sua obsessão.
Quando emergi novamente, a luz forte de cima havia sumido.
Eu estava em um quarto diferente.
Um quarto de hospital, estéril e frio.
Uma dor surda latejava no meu lado.
Minha garganta estava áspera.
A porta se abriu e Ethan entrou, sua expressão cuidadosamente arranjada em uma de preocupação.
Ele se sentou ao lado da cama, pegou minha mão. A dele estava úmida.
"Ava, graças a Deus. Você nos deu um belo susto."
Eu o encarei, minha visão embaçada.
"Você teve um cisto ovariano rompido," disse ele, sua voz suave, ensaiada.
"Cirurgia de emergência. Mas você vai ficar bem. Ben Carter fez um trabalho fantástico."
Mentiras. Tudo mentira.
A crueldade casual daquilo foi uma nova facada no meu coração já sangrando.
Eu queria gritar, enfurecer-me, despedaçá-lo.
Mas apenas lágrimas vieram, lágrimas silenciosas e amargas que escorriam pelas minhas têmporas até meu cabelo.
Ele apertou minha mão, um gesto que agora parecia uma violação.
"Ei, não chore. Acabou. Você está segura."
Segura. Eu nunca estive menos segura.
O celular dele vibrou. Ele olhou para o aparelho, sua preocupação fingida desaparecendo, substituída por uma atenção familiar demais.
"É a Chloe," ele murmurou, já se levantando.
"Ela está um pouco abalada. Preocupada com você, claro."
"Mas ela está desesperada por aquele gelato artesanal daquele lugarzinho em Tribeca. Você sabe como ela fica."
Ele se inclinou, roçou um beijo na minha testa. Parecia gelo.
"Eu volto mais tarde. Descanse."
E assim, ele se foi.
Abandonada. Novamente. Por Chloe.
Mesmo agora, quando uma tempestade de nordeste supostamente se aproximava de Manhattan.
A porta se fechou atrás dele com um clique.
O silêncio no quarto era pesado, quebrado apenas pelo lamento distante de uma sirene e o zumbido baixo do equipamento médico.
Mais tarde, duas enfermeiras entraram apressadas.
A conversa sussurrada delas, não destinada aos meus ouvidos, flutuou até mim.
"O Sr. Reed é tão devotado à Srta. Vahn, não é? Correndo para pegar gelato para ela neste tempo."
"Ela é uma mulher de sorte. Ele mal saiu do lado dela depois do transplante de rim."
Transplante de rim. O transplante de rim de Chloe. O meu rim.
As peças se encaixaram com uma clareza brutal.
Meu desespero se solidificou em uma determinação fria e dura.
Era isso. O fim.
Sem mais chances. Sem mais desculpas.
Minha mão desajeitadamente procurou meu celular na mesa de cabeceira.
Meus dedos tremeram enquanto eu rolava pelos meus contatos.
Meu coração martelava, não de medo, mas com uma esperança desesperada e crescente por algo mais, algo novo.
Noah Hayes.
O principal rival de negócios de Ethan em Austin.
Um homem conhecido por sua integridade, seu brilhantismo silencioso.
Nós nos conhecemos uma vez, anos atrás, em um painel de ética em tecnologia.
Ele ouviu atentamente enquanto eu falava, seu olhar pensativo.
Lembrei-me de seu aperto de mão firme, do respeito em seus olhos.
Uma pequena e querida foto minha falando naquele painel estava em sua mesa, de resto vazia - eu a vira em um perfil de revista.
Um detalhe tolo e sentimental ao qual eu me apegara.
O telefone tocou duas vezes.
"Noah Hayes." Sua voz era calma, firme.
"Noah," consegui dizer, minha voz rouca. "É Ava Miller."
Uma pausa. Não longa, mas o suficiente para eu sentir um lampejo de dúvida.
"Ava," ele disse, seu tom mudando, uma pitada de surpresa, talvez preocupação. "Você está bem? Você soa..."
"Noah," interrompi, as palavras saindo antes que eu pudesse perder a coragem.
"Você ainda está procurando por uma Diretora de Operações que conheça as estratégias da Reed Innovate... e talvez," respirei fundo, trêmula, "uma esposa?"
O silêncio do outro lado foi profundo, estendendo-se pelo que pareceu uma eternidade.
Fechei os olhos, preparando-me para a rejeição, para a confusão.
Então, sua voz, baixa e séria.
"Meu jato, em sete dias. LaGuardia."
"Mas Ava," ele fez uma pausa, e eu quase pude ouvi-lo escolhendo suas palavras com cuidado, "comigo, não há volta. Você tem certeza?"
Lágrimas, quentes e purificadoras desta vez, brotaram em meus olhos.
"Tenho certeza, Noah."
"Bom," disse ele. "Sete dias."
A linha ficou muda.
Eu encarei meu celular, uma tábua de salvação.
Sete dias.
Uma nova cidade. Uma nova vida. Uma chance.
Naveguei pelos aplicativos de companhias aéreas, meus dedos surpreendentemente firmes.
Austin. Só de ida.