Capítulo 2 Velório

Não é tão diferente do que achei que seria , as pessoas ficam tristes por causa da perda ,

choram por você , gritam o seu nome , nunca me senti tão venerado como me sinto agora ,

ando em meio a multidão , vejo vários rostos , ninguém me vê , mas eu os vejo , são várias

pessoas dentre as que eu conheço e as que a névoa da memória apagou com o tempo , mas

tem um rosto de uma mulher cujo coração acaba de ser partido , ela está lendo seu discurso

fúnebre , com lágrimas nos olhos , e mesmo naquele estado ela continua linda ; continuo

andando pelo meu funeral e quando parei no meu caixão ainda aberto , reparei em algo que

achei engraçado , estou vestido , paletó altamente passado , gravata borboleta colorida ,

camiseta social azul clara , logo que percebo o conjunto por inteiro , tirei o sorriso , eu

reconheço essa roupa em qualquer lugar , essa foi a roupa que eu usei no dia mais feliz da

minha vida , o dia do meu casamento com Sara .

O velório foi longo e agitado , várias pessoas abraçavam e apertavam a mão de Sara aos

prantos , e falavam as frases mais conhecidas em um velório , "vai ficar tudo bem" "seja forte"

" sentimos muito" e a clássica " ele era um homem bom".

Minha sogra chorava soluçando , meu cunhado me olhava com ódio , é compreensível , porém

ele não entende , e como poderia ? É difícil explicar a causa de um suicídio , são tantos os

motivos , é difícil de organizar tudo e dizer qual dos motivos foi a causa da morte.

Um homem da minha altura anda até Sara e a abraça , sei quem ele é , Hugo , melhor amigo e

ex de Sara , não acredito que ele está aqui , cara de pau não tem , muito menos senso ,

começou a chegar perto dos dois e ouço Hugo cochichar , ele diz que estaria ali para ela , e

que se precisasse de algo era só chamar , ela balança a cabeça afirmando , Hugo a solta e dá

um beijo em sua bochecha e vai embora , um homem magro e pequeno pergunta se já pode

baixar o caixão , Sara anda até o caixão ainda aberto , toca o meu rosto , eu sinto , eu senti seu

toque , ela se agacha até a altura do meu ouvido e sussurra :

- Eu te amo - funga - irei sentir sua falta , por favor não me deixe sozinha - sinto suas lágrimas

caírem no meu rosto - me visite nem que seja por espírito ou sonho , por favor , não me deixe .

Ela se afasta e vai para Miriam , minha sogra , ela deita a cabeça no ombro da mãe e faz sinal

ao homem magro e baixo para abaixar o caixão , olho para trás e vejo uma grande caixa

carregando nada mais nada menos que o meu corpo .

Vejo Sara caminhar até o carro , o Toyota da sua mãe , foi nele que demos nosso primeiro

beijo , foi nele que nos entregamos um ao outro pela primeira vez também ; Sara abre a porta

do carro e de longe eu vejo , ela olha para o cemitério e dá um suspiro , sei o'que significa

aquele suspiro e fecho os olhos ao sentir o amor dela por mim , sinto também que ela não me

culpa de eu ter partido , entendo que ela me queria por perto , mas a vida não é justa nem com

aqueles que nunca pecaram contra ela , imagina com os que cometeram tal delito , ainda de

olhos fechados , suspiro e espero que ela sinta , uma brisa suave mexe em seus cabelos , ela

entra no carro e fecha a porta , é aqui meu amor , que selamos uma vida.

            
            

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