Não Mais April Mayo: A Herdeira Retorna
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Capítulo 3

Ponto de Vista: Laura Arruda

Davi chorou até dormir em meus braços, seu corpinho sacudido por soluços que me rasgavam como estilhaços. Eu o segurei perto, sussurrando promessas de uma nova vida, de um avô que já nos esperava, que nos amava.

"Mas... o papai não me ama mais?", ele soluçou no meu ombro, sua voz pequena e quebrada. "Só você me ama, mamãe?"

"Não, meu amor", eu disse engasgada, minhas próprias lágrimas caindo em seu cabelo. "Muitas pessoas te amam. O vovô Jorge mal pode esperar para te conhecer. Você vai ser um príncipe."

"Podemos ir agora?", ele perguntou, afastando-se para me olhar, seus olhos vermelhos e inchados. "Podemos ir ver o vovô?"

Ele hesitou, sua mãozinha agarrando o lobo de madeira em seu bolso. Foi o último presente que Heitor lhe deu. "Mas... eu não quero deixar o papai."

Meu coração se partiu. Engoli o nó na garganta, forçando-me a ser a forte. "Eu sei, meu bem. Mas o papai e a mãe dele... eles não querem que a gente fique aqui. Eles querem que você o chame de 'tio Heitor' de agora em diante. Você consegue fazer isso?"

Ele me encarou, sua expressão vazia de choque. Lentamente, sua mão soltou o lobo de madeira. Lágrimas brotaram em seus olhos novamente. "Não", ele sussurrou.

Então, um apelo desesperado. "Mamãe, podemos esperar, por favor? Só até o meu aniversário? Talvez... talvez ele venha. Só por um pouquinho. Depois a gente vai. Eu prometo."

Ele estava implorando por uma última lembrança, um último fragmento de amor do homem que acabara de renegá-lo publicamente. Como eu poderia dizer não?

"Tudo bem, meu amor", sussurrei, beijando sua bochecha manchada de lágrimas. "Nós vamos esperar."

Mas Heitor não veio. O aniversário de Davi chegou, um bolo com cinco velas intocado sobre a mesa. O silêncio em nossa pequena casa era ensurdecedor. Eu finalmente explodi, pegando meu telefone e discando o número dele, minhas mãos tremendo de raiva.

"Você prometeu a ele", sibilei quando ele atendeu. "Ele tem cinco anos, Heitor. Ele está sentado perto da janela o dia todo esperando por você. Como você pôde fazer isso com ele?"

A linha ficou em silêncio por um longo momento. Então, um clique. Ele havia desligado na minha cara.

Davi olhou para as velas apagadas, seus ombros caídos em derrota. "Tudo bem, mamãe. Ele está ocupado." Ele forçou um sorriso pequeno e vacilante. "O tio Heitor é um homem muito importante."

A palavra 'tio' pareceu um golpe físico. Meu coração se partiu em um milhão de pedacinhos. Eu estava prestes a ligar para Heitor de volta, para gritar e exigir que ele consertasse o que havia quebrado, quando uma mensagem de texto iluminou minha tela. Era dele.

Venha para a mansão. Tenho uma surpresa para o Davi.

Mostrei o telefone para Davi. Uma pequena centelha de esperança se acendeu em seus olhos. "Ele lembrou! Mamãe, ele lembrou do meu aniversário! Você acha que ele me deu o caminhão vermelho grande?"

Outra mensagem chegou. Tenho uma festa inteira esperando por ele. Rápido.

Davi ficou exultante, me puxando em direção à porta, sua dor anterior esquecida. Ele tagarelou animadamente durante todo o caminho, um fluxo de esperanças e sonhos de uma criança de cinco anos.

Mas no momento em que entramos no salão de festas, eu soube que havíamos sido enganados. O salão não estava cheio de balões e serpentinas. Estava cheio de rosas, centenas delas, e convidados elegantemente vestidos bebendo champanhe. Não era uma festa de aniversário infantil. Era uma festa de noivado.

Davi não percebeu. Ele viu Heitor parado ao lado de um bolo imponente de vários andares e correu direto para ele, seu rosto iluminado de pura alegria.

"Papai!", ele gritou, sua voz ecoando no salão subitamente silencioso. "Você está esperando por mim para te ajudar a cortar o bolo?"

Heitor olhou para cima, seus olhos se arregalando em choque genuíno ao nos ver. "Laura? Davi? O que vocês estão fazendo aqui?" Ele estava vestido com um smoking sob medida, Sofia agarrada ao seu braço em um vestido de noite brilhante.

Os convidados começaram a sussurrar, seus olhos dardejando entre Davi e Heitor. "Esse é... o filho dele?" "Pensei que ele não tivesse filhos."

O rosto de Heitor endureceu. Ele deu um passo para trás de Davi, um gesto cruel e desdenhoso. "Quem você está chamando de Papai?", ele perguntou, sua voz fria e afiada. Ele empurrou Davi, não com força, mas o suficiente para fazer meu pequeno filho tropeçar e cair no chão polido.

Davi olhou para ele, seus olhos arregalados de medo e confusão.

Corri para frente, pegando-o em meus braços. "Estamos de saída."

"Saindo tão cedo?", a voz de Sofia pingava veneno sacarino. Ela parou na nossa frente, um sorriso triunfante no rosto. "Mas a festa está apenas começando. Eu esperava tanto que você viesse." Ela ergueu o telefone, mostrando-me as mensagens que havia enviado do número de Heitor. "Achei que Davi merecia uma celebração adequada por se tornar um órfão."

Ela se pressionou contra o lado de Heitor. "Diga a eles, querido. Diga a todos que esta criança de rua não tem nada a ver com você."

Heitor olhou para mim, seus olhos implorando por uma compreensão que eu não possuía mais. Então, ele olhou para Sofia, para os convidados poderosos e influentes, para o império que ele estava tão perto de garantir. Ele deu um aceno pequeno, quase imperceptível.

Essa foi a sua resposta.

"Meu filho não é um vira-lata", cuspi, minha voz tremendo de fúria. "E o pai dele é o maior homem do mundo. Um homem que você nunca poderia sonhar em ser."

Virei-me para sair, mas Sofia agarrou meu braço. "Como ousa!", ela gritou, e então sua mão voou, o ardor agudo de seu tapa ecoando pelo salão. "Você mente e insulta esta família! Você e seu filho bastardo!"

Ela se virou para a multidão, seu rosto uma máscara de indignação justa. "Ela está tentando estragar tudo! Tirem-na daqui!"

Os parentes de Constança avançaram, seus rostos contorcidos de ódio. Eles me cercaram, empurrando e me agredindo. Um punho atingiu meu estômago, tirando meu fôlego. Curvei meu corpo ao redor de Davi, tentando protegê-lo enquanto os golpes choviam em minhas costas e cabeça.

Através da névoa de dor, olhei para Heitor. Ele estava paralisado, seu rosto uma tela de horror e indecisão. Ele não fez nada.

E naquele momento, eu soube. A dívida que eu sentia que devia a ele por salvar minha vida todos aqueles anos atrás? Estava paga. Com juros.

De repente, uma voz pequena e desesperada cortou o caos. Davi se desvencilhou dos meus braços e se jogou aos pés de Heitor, suas mãozinhas agarrando o tecido de suas calças.

"Por favor", ele soluçou, sua voz crua com uma dor que nenhuma criança deveria conhecer. "Por favor, senhor. Pare eles. Não machuque minha mamãe."

Senhor. Não Papai. Senhor.

O mundo parou. As agressões pararam. Heitor olhou para Davi, seu rosto pálido, seu corpo inteiro tremendo. "O que... o que você me chamou?"

Davi olhou para cima, lágrimas escorrendo pelo rosto, mas seu olhar era firme, sobrenaturalmente adulto. "Nós vamos embora agora, senhor. Não seremos mais um incômodo."

Ele se levantou cambaleante e me ajudou a levantar. De mãos dadas, um menino pequeno e quebrado liderando sua mãe espancada, saímos daquele salão de festas enquanto todos os olhos no local nos observavam.

Meu telefone vibrou no meu bolso. Uma mensagem de Heitor. Vá para casa, Laura. Leve o Davi. Estarei lá hoje à noite. Vamos consertar isso.

Davi olhou para a tela, seu rosto impassível. Ele olhou para mim. "Mamãe", disse ele, sua voz baixa, mas firme. "O vovô Jorge sente nossa falta?"

"Mais do que tudo", sussurrei.

"Então vamos agora."

Naquela noite, acendi um fogo na lareira. Queimei tudo. Cada fotografia, cada carta, o pequeno lobo de madeira. Enquanto a última memória de nossa vida aqui se transformava em cinzas, peguei a mão de Davi.

Saímos pela porta e nunca mais olhamos para trás.

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