-Estou cansada. -Não estava disponível para sermões, discussões ou qualquer coisa que seu pai pudesse dizer naquele momento.- Sinto muito, em outro momento. -Passou por todos eles sem dizer mais nada, caminhou pela casa até encontrar a saída que a levaria ao seu quarto. Lá a esperava Canela.
Ela a olhou com aqueles olhos cheios de pena, mas não quis dizer nada a respeito; todos em casa sabiam o que havia acontecido em seu casamento.
-Senhorita, suas coisas foram transferidas para um quarto dentro da casa.
-O quê? A que se deve isso? -Era uma decisão muito estranha.
-Foi ordem de seu pai -respondeu.- Logo depois que chegaram em casa.
-Ele te disse por quê? De qualquer forma, vou embora amanhã em lua de mel. Claro, comigo mesma. Não há marido que queira me acompanhar.
-Sinto muito pelo que aconteceu no seu casamento.
-Tranquila, não precisa dizer nada. Sabe por que a mudança de quarto?
-Agora você é a senhora Queen, casada com o herdeiro da família, aquele que dirige as empresas desse sobrenome. Ambos primogênitos das duas famílias. É uma união muito favorável, acho que muitas coisas podem mudar para você. E já começaram a acontecer.
-Não quero entrar naquela casa. -Pra quê? Eles se encarregaram de deixar claro que ela não fazia parte.
-Você verá como será diferente -insistiu Canela.
-Ontem não era. E... sobre ser a senhora Queen, é engraçado, mas não sou isso. Não pode haver uma senhora Queen sem um marido, e meu marido foi embora com outra mulher. Não sou a senhora Queen.
-Será, enquanto estiverem casados.
-Ele foi embora com outra mulher, não te disseram essa parte? Casou-se e logo foi embora. Apenas cumpriu o dever dele.
-Escute -aproximou-se dela, pegando sua mão para levá-la para dentro e poder fechar a porta.- Isso não se trata de um simples casamento, é uma troca entre duas famílias que se dá através de um matrimônio. Você pode sair ganhando com isso, assim como os chefes das famílias.
-Não! Quero... quero algo diferente disso, não desejo ser a esposa de papel de ninguém, ele tem sua vida com outra mulher, só cumpriu o seu dever.
-E você também.
-Eu queria um casamento de verdade! Não uma humilhação num dia como hoje.
-Quais são suas opções? Se voltar para a França planejando um divórcio, seu pai vai esquecer completamente que tem uma filha. Isso não seria bom para você.
-Acha que não posso sobreviver sem ele?
-Acho que pode jogar no lixo o que sua mãe deixou para você.
-Minha mãe... -Era a segunda vez que a mencionavam naquele dia, todos pareciam conhecê-la, menos ela.- É verdade que ela queria esse casamento com um dos irmãos Queen?
-Não... -Canela sorriu, aproximando-se mais.- Com o mais velho. Não com qualquer um.
-Davide.
-Eles eram gêmeos, o mais velho não era Davide. A senhora Queen veio pouco tempo depois de você nascer, veio com o filho. Vai soar estranho, mas ele a carregou nos braços, foi engraçado porque a mulher com quem se casaria no futuro ainda era apenas uma menina. Lembro que ele disse: "Não quero vê-la crescer, porque então a tratarei como irmã, mas ela será minha esposa." Todos riram das palavras tão bem pensadas do jovem Queen. As duas mães desejavam esse compromisso.
-Então era verdade. Minha mãe planejou isso. Mas... casei com o gêmeo errado?
-Ele havia morrido na adolescência, pouco tempo depois daquela visita a esta casa.
-Oh! -De repente, sentiu-se muito triste, porque a maneira como Canela falou dele parecia a de uma boa pessoa, ao contrário do que ela viu na igreja com Davide.- Não sei de que forma poderia aproveitar um casamento com Davide Queen. Salvo o fato de que ele não agirá como meu marido e que meu pai já não me tratará aos pontapés, o que mais posso tirar disso? Não gosto de como isso parece, não acho que vá dar certo.
-Vai ser melhor do que contrariar seu pai. E, como isso também é algo empresarial, não creio que os Queen desejem a anulação deste casamento.
-Tenho que pensar. A lua de mel vai me fazer bem. Pode trazer minhas coisas de volta para este quarto? Não quero entrar na casa.
-Falarei com seu pai.
-Muito obrigada, Canela. -Graças a Canela, agora tinha um pouco mais de informação.
Minutos mais tarde, antes que Canela voltasse com suas coisas, chegou seu pai.
-Acho que precisamos falar agora, porque amanhã você viaja, Chiara.
-Estou tentando imaginar o que você quer falar, mas não me vem nada à cabeça -falava sem forças, tudo o que queria era fechar a porta, deitar-se na cama, fechar os olhos e esquecer de tudo ou pelo menos tentar.
-Você é maior de idade, há algumas coisas sobre as quais temos que falar.
-Algumas coisas? Não sei a que se refere.
-Sua mãe e eu tínhamos uma sociedade conjunta que, desde que você é maior de idade, não posso mexer sem você, a não ser seguir a direção que já tinha. Eu preciso dela, quero fazer uma fusão, mas para isso tenho que ter o controle. Quando voltar da lua de mel, podemos falar sobre isso.
-É... minha?
-Nossa. É nossa, não sua. Mas a tomada de decisões cabe a nós dois, só porque você é maior de idade, embora eu esteja no comando.
-Essa fusão em que afeta o que me cabe?
-Chiara, não te cabe nada -disse o pai, olhando nos olhos dela.- Sua parte foi investida em você.
-Investida em mim? Como pode dizer isso?
-E você, como pode dizer o contrário? Nestes últimos dezessete anos que esteve no exterior, gastou muito dinheiro, mais do que imagina.
-Você é meu pai, o dinheiro que me deu não pode ter sido o que minha mãe deixou para mim. E você? Não tinha responsabilidade alguma comigo? Não... não pode ser verdade que tudo o que me deu foi com o meu dinheiro.
-Falaremos melhor quando voltar da lua de mel.
-Falaremos agora! Estou cansada! Farta! E não vou deixar que mais ninguém me pisoteie hoje. Eu não te pedi esse dinheiro para cobrir meus gastos na França. Você me mandou para lá, então tinha que assumir os gastos, não eu.
-Eu era o adulto, eu decidia, Chiara.
-E decidiu que era melhor gastar o meu dinheiro.
-Em você.
-Porque não queria se responsabilizar por mim. E pelo visto também não podia assumir os gastos, assim como a sua paternidade. -Sem intenção de derramar uma lágrima diante do pai, respirou fundo para não chorar.- Tem razão, falaremos sobre isso quando eu voltar da lua de mel. Então contratarei advogados para analisar toda a situação e ver se era correto eu ter que cobrir todos e cada um dos meus gastos quando ainda era apenas uma criança. -Seu pai franziu o cenho, nada contente com o rumo da conversa.
Se tinha a ver com sua mãe, Chiara precisava saber tudo a respeito e o melhor seria procurar um advogado que soubesse em detalhe tudo sobre aquela sociedade e o que havia sido a parte que lhe correspondia através de sua mãe.
Quando Canela voltou com suas coisas, Chiara fechou a porta e finalmente deitou-se na cama, encolhendo-se junto ao travesseiro.
Fechou os olhos sem derramar uma única lágrima, não se permitiria chorar naquele dia.
Pensaria em sua mãe, tentando lembrar-se de algo dela.