Lucas se agarrou à perna de Heitor, me fuzilando com o olhar. "Você é louca! Você é uma bruxa louca!" Ele chutou minha mala, um ato fútil e infantil de agressão. "Papai, manda ela embora!"
A raiva crua e desenfreada que eu havia suprimido por 2.190 dias finalmente explodiu. Não foi um grito. Foi uma ação assustadoramente calma. Passei por eles e entrei na sala de jantar. O bolo prestígio pela metade estava sobre a mesa, um monumento à minha humilhação. Helena estava por perto, um olhar presunçoso e vitorioso em seus olhos.
Minhas mãos se moveram antes que meu cérebro pudesse processar o comando. Agarrei o delicado suporte de bolo de porcelana e o arremessei contra a parede. Ele se estilhaçou com um estrondo ensurdecedor, porcelana branca e creme espirrando pelo caro papel de parede de seda.
Lucas gritou. Helena ofegou, fingindo medo.
Heitor agarrou meu braço, seus dedos cravando-se em minha carne como garras. "Você ficou completamente insana?"
Arranquei meu braço de seu aperto. "Insana? Você quer ver o que é insanidade, Heitor?" Passei o braço pela mesa de jantar. Taças de cristal, talheres de prata e porcelana fina voaram, caindo no chão em uma cacofonia de destruição. Cada estilhaço parecia uma libertação, a quebra das correntes invisíveis que me prenderam por tanto tempo.
"Pare com isso! Você está assustando o Lucas!", Heitor gritou, puxando o filho para trás dele protetoramente, protegendo-o de mim como se eu fosse um monstro.
Helena correu para o lado de Lucas, seus braços envolvendo-o. "Está tudo bem, querido. A mulher má está apenas tendo um chilique. Ela vai embora logo."
Parei, meu peito arfando. A adrenalina diminuiu, deixando para trás um vazio profundo. Olhando para a destruição, não senti nada. Nenhuma satisfação, nenhum arrependimento. Apenas uma sensação cansada de futilidade. Aquela bagunça era uma metáfora perfeita para o nosso casamento.
"Limpe isso", Heitor ordenou, sua voz pingando nojo. "E depois você vai pedir desculpas à Helena e ao Lucas."
"Não", eu disse, minha voz vazia.
"Ela é uma mulher má, papai", Lucas soluçou no vestido de Helena. "Eu não quero vê-la nunca mais."
Heitor acariciou o cabelo do filho, seu olhar fixo em mim com total desprezo. "Você o ouviu. Arrume suas coisas e saia da minha casa." Ele me deu as costas, concentrando toda a sua atenção em acalmar o filho, guiado pelos murmúrios gentis de Helena.
"Não se preocupe, Lucas", Helena sussurrou, seus olhos encontrando os meus por cima da cabeça dele. Eles brilhavam de triunfo. "Eu estou aqui agora. Vou cuidar de você e do seu papai."
Eu não precisei ouvir duas vezes. Virei-me sem outra palavra e subi as escadas. No meu quarto, peguei a coleira pequena e gasta da minha mesa de cabeceira. Buddy, meu golden retriever, levantou a cabeça de sua caminha, seu rabo batendo suavemente no carpete. Ele era o único pedaço da minha vida antiga que eu havia trazido comigo, o último elo vivo com um tempo antes de Heitor Bastos.
Com minha única mala em uma mão e a coleira de Buddy na outra, saí do quarto que havia sido minha gaiola dourada.
Quando desci as escadas, Heitor havia sumido. Apenas Helena e Lucas permaneciam, parados como um retrato de uma nova família no hall de entrada.
Meu celular vibrou no meu bolso. Uma mensagem de Heitor.
`A pulseira de edição limitada da H.Stern que a Helena estava usando hoje à noite. Você vai substituí-la. Mande entregar no meu escritório até amanhã.`
Olhei para a mensagem, uma risada sem humor borbulhando na minha garganta. Ele estava me expulsando, mas ainda se sentia no direito de me dar ordens.
Apaguei a mensagem, depois o contato dele, e então bloqueei seu número.
A casa estava opressivamente silenciosa naquela noite. Heitor e Lucas não voltaram para casa. Imaginei-os hospedados em um hotel, ou talvez no apartamento de Helena, criando novas e felizes memórias sobre as ruínas do meu casamento. Eu não me importava. Dormi profundamente pela primeira vez em anos, com Buddy aninhado aos pés da minha cama.
Na manhã seguinte, eu estava guardando os últimos dos meus pertences pessoais no meu carro quando um sedan preto parou na entrada da garagem. Heitor saiu, mas não estava sozinho. Gláucia Moraes emergiu do lado do passageiro, seu rosto sombrio.
Ele estava trazendo reforços. Interpretando o papel do marido injustiçado, tentando fazer Gláucia convencer sua esposa histérica e ingrata a ter juízo. Ele sempre soube quais botões apertar.
"Alina", Gláucia começou, sua voz tensa enquanto se aproximava de mim. Heitor ficou para trás, uma figura silenciosa e imponente de julgamento. "Heitor me contou o que aconteceu. Talvez possamos conversar sobre isso. Não tome uma decisão precipitada."
Olhei para minha antiga tutora, a mulher a quem eu devia tanto, e senti uma pontada de tristeza. Ela queria que isso desse certo. Mas ela, como Heitor, não tinha ideia do que isso havia me custado.
"Não há nada para conversar, Gláucia", eu disse suavemente.
Heitor finalmente falou, sua voz carregada da paciência condescendente de um homem que acredita ter todas as cartas. "Alina, você já teve seu chilique. Acabou. Agora volte para dentro. Gláucia veio de tão longe para mediar."
Eu quase ri. Mediar? Ele achava que isso era uma negociação. Ele ainda não entendia. Ele ainda achava que eu queria estar aqui. Ele ainda achava que tinha algum poder sobre mim.
Mas ele estava prestes a descobrir o quão errado estava.