Levantei-me de um salto, minha mão se movendo antes que meu cérebro pudesse processar a ação. O estalo da minha palma contra a bochecha de Kátia ecoou na sala silenciosa.
A cabeça dela virou para o lado, uma marca vermelha florescendo em sua pele pálida.
"Estela!", Heitor rugiu, movendo-se instantaneamente para protegê-la. Ele agarrou meus ombros, seu aperto como ferro. "Você enlouqueceu?"
Ele me empurrou para trás. Com força. O mesmo empurrão descuidado e desdenhoso do dia do nosso casamento. Eu tropecei, meu tornozelo torceu, e caí pesadamente, meu cotovelo batendo no chão de madeira. Uma dor lancinante subiu pelo meu braço.
"Oh, Heitor, ela se machucou!", Kátia chorou, sua voz pingando falsa preocupação. "Deveríamos ajudá-la."
Heitor hesitou, seus olhos fixos na minha expressão de dor. Por um momento, vi o antigo Heitor, o protetor. Mas era apenas um fantasma.
Kátia puxou sua manga. "Deixe-me limpar o corte dela", ela disse suavemente. "É o mínimo que posso fazer."
"Não", sibilei, tentando me afastar dela. "Não me toque."
O rosto de Kátia se contraiu. "Eu só estava tentando ajudar", ela choramingou, virando seus olhos cheios de lágrimas para Heitor.
Isso foi tudo o que precisou. O rosto dele endureceu. "Segurem-na", ele ordenou às duas empregadas que correram para a sala com a comoção.
"Senhor?", uma delas gaguejou, parecendo chocada.
"Segurem. Ela. No chão", ele repetiu, sua voz não deixando espaço para discussão.
As duas mulheres, seus rostos uma mistura de pena e medo, prenderam meus braços. Eu lutei, mas estava fraca, emocional e fisicamente esgotada.
"Você está sendo histérica, Estela", disse Heitor, sua voz fria. "Kátia está sendo gentil. Você deveria ser grata."
Kátia se aproximou de mim, uma garrafa de álcool e uma bola de algodão na mão. Ela se ajoelhou, seu rosto perto do meu, seu perfume doce me fazendo engasgar. "Isso pode arder um pouco", ela sussurrou, um sorriso cruel brincando em seus lábios que só eu podia ver.
Ela não usou a bola de algodão.
Ela desatarraxou a tampa e virou a garrafa inteira sobre o arranhão cru e sangrando no meu cotovelo.
O mundo explodiu em uma supernova de dor pura e absoluta. Era um fogo, um ácido, mil agulhas em brasa afundando na minha carne de uma só vez. Um grito rasgou minha garganta, cru e animalesco. Minha visão embaçou, pontos pretos dançando nas bordas.
Através de uma névoa de agonia, olhei para Heitor, meus olhos implorando por ajuda, por um pingo da compaixão que ele um dia teve por mim.
Ele apenas ficou lá. Observando. Seu rosto era uma máscara remota e impassível.
Vi sua mandíbula se contrair. Ele estava vacilando.
Kátia também viu. "Heitor", ela engasgou, sua voz tremendo. "Dói... meu peito... não consigo respirar..."
Instantaneamente, sua atenção voltou para ela. "Kátia", ele disse, sua voz grossa de alarme. Ele a pegou nos braços como se ela fosse feita de vidro.
"Vou te levar para cima", ele murmurou, carregando-a para fora da sala sem um único olhar para trás, para mim, a mulher que ele acabara de permitir que fosse torturada no chão de seu escritório.
As empregadas soltaram meus braços e fugiram, deixando-me sozinha, caída em um monte. O cheiro forte e estéril de álcool encheu meus pulmões, um aroma que eu agora associaria à morte absoluta do meu amor por Heitor Gusmão.
Minha mão, aquela com a cicatriz antiga, estava no chão perto da fotografia destruída da minha mãe. Ele havia conseguido aquela cicatriz me protegendo. Agora, ele ficou parado e assistiu enquanto outra mulher infligia uma nova.
Uma risada borbulhou na minha garganta, um som histérico e quebrado.
Eu amei um monstro. Ou pior, eu amei um homem fraco que deixou um monstro ditar suas ações.
Reuni cuidadosamente os pedaços da foto da minha mãe, meus dedos ainda sangrando. "Sinto muito, mãe", sussurrei para o rosto sorridente e estilhaçado. "Sinto muito por tê-lo escolhido acima de tudo."
Alguns dias depois, aconteceu a gala anual da família Gusmão. Era uma apresentação de comando; minha presença não era opcional. Heitor insistiu que Kátia fosse junto, alegando que ela estava com muito medo para ficar sozinha.
No momento em que entramos, senti os sussurros começarem, os olhares de pena e julgamento. Eu era a notícia de ontem, a noiva abandonada. Kátia, agarrada ao braço de Heitor como uma trepadeira delicada, era a heroína trágica e romântica da noite.
Ele era repugnantemente atencioso com ela, buscando seu champanhe, ajustando seu xale, rindo de suas piadas vazias. Fui deixada para ficar sozinha em um canto, um fantasma estranho em uma festa que um dia deveria celebrar meu lugar nesta família.
Uma prima de Heitor, uma mulher que sempre teve ciúmes de mim, aproximou-se. "Ora, ora, Estela", ela zombou, me olhando de cima a baixo. "Você parece um pouco... descartada. Acho que talento e cérebro não são suficientes para manter um homem como Heitor, não é?"
Apertei minha taça de vinho, meus nós dos dedos brancos.
Heitor deve ter ouvido. "Já chega, Clara", ele disse, sua voz afiada. Mas então ele imediatamente se virou para Kátia. "Você está se sentindo bem, querida? Parece um pouco pálida."
Sua defesa de mim foi um gesto vazio, imediatamente negado por sua preocupação muito maior por ela.
Kátia me deu um sorrisinho triunfante por cima do ombro de Heitor. Então, enquanto se virava para caminhar em direção à grande torre de champanhe, ela deu um tropeço deliberado e teatral.
Tudo aconteceu em câmera lenta.
Seu corpo arqueou para trás, não para longe da torre, mas diretamente para ela. Centenas de taças de cristal, cheias de champanhe dourado, caíram em uma cascata brilhante e mortal.
Heitor não hesitou. Ele se lançou, não em minha direção, mas em direção a Kátia, envolvendo seu corpo ao redor do dela para protegê-la do vidro que caía.
Fui deixada em pé, diretamente no caminho da destruição.
A onda de champanhe me atingiu primeiro, fria e chocante, encharcando meu vestido de grife em um instante. Depois veio o vidro. Cacos choveram sobre mim, cortando meus braços e ombros nus. Uma pesada taça de cristal atingiu minha têmpora, e o mundo se dissolveu em uma cacofonia de vidro quebrando e os suspiros chocados da multidão.
Eu fiquei lá, congelada, pingando champanhe e sangue, um espetáculo de humilhação pública. Heitor, tendo garantido que Kátia estava perfeitamente ilesa, finalmente se virou para me olhar. Seus olhos se arregalaram em choque momentâneo com a figura patética e quebrada que eu me tornara.
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