Tarde Demais Para o Seu Pedido Desesperado
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Tarde Demais Para o Seu Pedido Desesperado

Gavin
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Capítulo 1

Por dezessete anos, eu amei meu melhor amigo, Heitor Reis. Eu era a garota quieta que sempre tinha um curativo para os joelhos ralados dele, acreditando em segredo que estávamos destinados a ficar juntos.

Mas ele estilhaçou meu mundo com seis palavras: "Ela é minha irmã. Só isso." Ele se apaixonou pela cruel e glamorosa Fabiana, chegando a levá-la ao nosso refúgio secreto.

O ciúme dela era um veneno. Ela fingiu uma gravidez para prendê-lo, depois contratou um homem para me atacar num beco. O trauma rompeu um aneurisma no meu cérebro, e eu fiquei cega.

E em todo esse tempo, Heitor a defendeu. Ele se recusou a acreditar que ela era capaz de tamanha maldade, escolhendo o monstro que conhecia há meses em vez da garota que conhecia a vida inteira.

Meu salvador, um médico gentil chamado Jairo, me ofereceu um futuro, e planejamos um casamento de mentira para dar esperança aos meus pais apavorados.

Mas enquanto eu estava no altar, cega, Heitor invadiu a cerimônia. Ele caiu de joelhos, com um anel de diamante na mão.

"Eu te amo, Clara", ele implorou. "Casa comigo."

Capítulo 1

Ponto de Vista: Clara Valente

"Eu te amo, Clara", Heitor Reis sussurrou, sua voz embargada por uma emoção que eu esperei a vida inteira para ouvir. "Sempre foi você." Ele se ajoelhou diante de mim, seu rosto bonito marcado pelo desespero, um anel de diamante seguro entre seus dedos trêmulos. "Casa comigo."

Olhei para baixo, para o homem que amei por dezessete anos, o garoto que tinha sido meu mundo inteiro. Então, desviei o olhar para o homem ao meu lado, cuja mão repousava gentilmente nas minhas costas.

Eu sorri, um pequeno e triste curvar de lábios. "Heitor", eu disse, minha voz clara e firme, "eu já sou casada."

Um mês atrás, meu mundo tinha uma cor diferente. Era pintado nos tons de Heitor Reis.

A Festa da Primavera da USP estava a todo vapor, o ar denso com o cheiro de pipoca e dos jacarandás floridos. Risadas e música giravam ao meu redor, mas eu só tinha olhos para uma pessoa. Heitor. Ele estava perto do palco improvisado, o sol poente realçando os reflexos dourados em seu cabelo castanho, um sorriso confiante brincando em seus lábios enquanto conversava com seus irmãos da atlética de administração.

Ele era carismático, popular, o sol em torno do qual tantas pessoas orbitavam. E eu, Clara Valente, era apenas uma lua silenciosa, contente em girar em sua órbita, um segredo que eu guardava desde os dez anos de idade.

Éramos inseparáveis. "O show de Clara e Heitor", nossos pais nos chamavam. Ele era o aventureiro, eu era a cautelosa. Ele era quem ralava os joelhos, e eu era quem sempre tinha um curativo pronto. Ele me via como sua irmãzinha, um papel que eu desempenhava com uma facilidade praticada, enquanto meu coração gritava uma verdade diferente.

"Sério, Reis, quando você vai chegar na Fabiana Clark?", um de seus amigos, Léo, o cutucou de brincadeira.

Meu coração deu um salto doloroso no peito. Fabiana Clark. A rainha da universidade, uma influencer com um milhão de seguidores e um fundo fiduciário para bancar tudo. Ela era tudo o que eu não era: ousada, glamorosa e rica.

Heitor soltou uma risada baixa, um som que geralmente fazia meu estômago revirar. Desta vez, pareceu uma pedra caindo num poço. "Dá um tempo, cara. Tô trabalhando nisso."

"Trabalhando nisso? Cara, a garota tá te dando sinal verde há meses", outro amigo interveio. "Qual é a demora? Você não tá ainda preso na sua sombrinha, tá?"

Minha respiração falhou. Eu me encolhi atrás de um grande carvalho, a casca áspera cravando nas minhas costas. Eu não deveria estar ouvindo. Isso era particular.

A voz de Heitor, quando veio, foi desdenhosa. "A Clara? Não seja ridículo. Ela é como uma irmã pra mim. É só isso que ela vai ser."

Irmã.

A palavra foi como um martelo, estilhaçando a frágil casa de vidro dos meus sonhos. Eu a tinha ouvido mil vezes, mas desta vez, no contexto dele querendo outra pessoa, pareceu um julgamento final.

"Bom", disse Léo, batendo nas costas dele. "Porque a Fabiana é um partidão. A família dela é dona de metade de São Paulo. Se você garantir essa, tá feito na vida."

"Não é por isso", disse Heitor, com uma ponta de defensiva em seu tom. "Ela é... empolgante. Diferente."

As palavras não ditas pairavam no ar: Diferente da Clara.

Eu não precisava ouvir mais nada. Virei-me e fugi, com a visão embaçada pelas lágrimas que me recusei a deixar cair. Encontrei um canto deserto atrás da biblioteca, um lugar onde as sombras eram profundas e reconfortantes. Deslizei pela parede de tijolos fria, puxando os joelhos contra o peito, e finalmente deixei os soluços sacudirem meu corpo.

Tinha acabado. Uma história de amor que só existiu na minha cabeça tinha chegado ao seu trágico fim.

Depois que as lágrimas cessaram, uma fria determinação se instalou em meu peito. Tudo bem. Se ele só me via como uma irmã, então era isso que eu seria. Eu enterraria meus sentimentos tão fundo que ele nunca os encontraria. Eu sorriria, eu o apoiaria, e eu o veria se apaixonar por outra pessoa, mesmo que isso me matasse.

Ajeitei minhas roupas, limpei o rosto e voltei para a festa, uma máscara cuidadosamente construída de indiferença alegre firmemente no lugar.

Mais tarde naquela noite, o mundo explodiu em uma chuva de fogos de artifício. Sob o céu cintilante, eu o vi. Heitor estava no meio do gramado lotado, segurando uma única e perfeita rosa vermelha. Ele estava olhando para Fabiana Clark, seus olhos brilhando com uma adoração que eu só sonhara em receber.

"Fabiana", ele disse, sua voz se destacando em uma pausa entre as explosões. "Eu sei que demorei para agir, mas a verdade é que não consigo parar de pensar em você. Quer ser minha namorada?"

A multidão ao redor deles suspirou em admiração. Fabiana, parecendo uma estrela de cinema em seu vestido de grife, soltou um suspiro encantado. Ela pegou a rosa, seus dedos perfeitamente manicureados roçando nos dele. "Claro, Heitor. Pensei que você nunca fosse pedir."

Ele a puxou para seus braços e a beijou, um beijo profundo e apaixonado que selou sua nova realidade. A multidão explodiu em aplausos.

Minhas próprias mãos estavam tão cerradas que minhas unhas cravavam nas palmas. O buquê de flores do campo que eu tinha colhido para ele mais cedo, um gesto bobo e esperançoso, parecia um monte de mato em minhas mãos. Uma única lágrima escapou e traçou um caminho frio pela minha bochecha.

Virei-me antes que alguém pudesse ver. Enquanto caminhava em direção à saída do campus, passei por uma lixeira. Sem pensar duas vezes, joguei as flores lá dentro. Elas caíram com um baque suave e patético.

Um sorriso amargo e autodepreciativo tocou meus lábios.

É hora de deixar ir, Clara, eu disse a mim mesma, as palavras um mantra silencioso e doloroso. Ele não é seu. Nunca foi.

Duas semanas depois, Heitor deu uma festa em sua casa fora do campus para celebrar seu novo relacionamento. Um convite apareceu na minha caixa de entrada, com um "Você tem que vir, Clarinha!" casual anexado em uma mensagem. Meu primeiro instinto foi apagar, fingir uma doença, fazer qualquer coisa para não ir. Mas isso seria admitir a derrota. Seria mostrar a ele que ele me machucou.

Então eu fui.

Vesti-me de forma simples, com jeans e um suéter macio, um contraste gritante com o brilho e o glamour dos amigos de Fabiana. A casa pulsava com música de baixo pesado e a cacofonia de cem conversas.

Heitor me viu do outro lado da sala e seu rosto se iluminou. "Clarinha! Você veio!" Ele me envolveu em um abraço familiar e esmagador. Por um segundo, deixei-me derreter nele, respirando seu cheiro, o cheiro de casa.

Então ele se afastou, pegando outra mão. "Clara, esta é a Fabiana. Fabiana, minha melhor amiga, Clara."

O sorriso de Fabiana era brilhante, mas não alcançava seus olhos. Seu aperto de mão foi frio e firme. "É um prazer finalmente conhecer a famosa Clara. O Heitor fala de você o tempo todo."

"Só coisas boas, espero", consegui dizer, meu próprio sorriso parecendo rígido e artificial.

"Claro", disse ela, seu braço envolvendo possessivamente a cintura de Heitor. "Ele me disse como você é a irmã que ele nunca teve."

Lá estava de novo. Aquela palavra. Irmã.

"Parabéns, vocês dois", eu disse, minha voz soando surpreendentemente firme. "Vocês formam um belo casal."

Peguei um copo de plástico com cerveja de uma mesa próxima e dei um longo gole, o líquido amargo fazendo pouco para anestesiar a dor em meu peito. Passei o resto da noite na periferia, um fantasma na festa, observando Heitor mimar sua nova namorada. Ele era atencioso, charmoso, um namorado perfeito.

A festa finalmente diminuiu. Fabiana estava encostada em Heitor, parecendo cansada, mas triunfante. Heitor olhou para mim, um lampejo de preocupação em seus olhos.

"Clarinha, como você vai para casa?", ele perguntou. "Está tarde."

Antes que eu pudesse responder, Fabiana falou, sua voz doce como mel. "Nós podemos te dar uma carona, Clara. Não é incômodo nenhum." Não era uma pergunta; era uma declaração de posse. Nós somos uma unidade agora. Você é a de fora.

Uma onda de desafio, afiada e inesperada, cortou minha névoa induzida pelo álcool. "Não, obrigada", eu disse, pegando minha bolsa. "Já chamei um Uber."

Não esperei por uma resposta. Saí pela porta e entrei no ar frio da noite, sem olhar para trás. Enquanto meu carro se afastava da calçada, olhei no retrovisor. Vi Heitor dar um passo em direção à porta, uma carranca no rosto, mas Fabiana o puxou de volta, sussurrando algo em seu ouvido. Ele hesitou, depois a deixou levá-lo de volta para dentro.

Ele nem sequer olhou para trás.

As lágrimas finalmente vieram, quentes e silenciosas, enquanto o carro acelerava pelas ruas vazias.

"Noite difícil?", o motorista, um homem mais velho de rosto gentil, perguntou suavemente, seus olhos encontrando os meus no espelho.

Eu balancei a cabeça, limpando rapidamente o rosto. "Não. Eu só estou... muito feliz pelo meu amigo."

A mentira tinha um gosto de cinzas na minha boca.

Dezessete anos. Eu conhecia Heitor Reis há dezessete anos. Ele se mudou para a casa ao lado quando eu tinha cinco. Ele me ensinou a andar de bicicleta. Ele deu um soco no nariz de um valentão por puxar meu cabelo na terceira série e pegou uma semana de suspensão. Lembro-me de sentar do lado de fora da sala do diretor, chorando, até ele sair.

Ele tinha bagunçado meu cabelo e dito, com toda a bravata que um menino de nove anos poderia reunir: "Não chore, Clarinha. Eu sou seu irmão mais velho. Sempre vou te proteger."

Esse foi o dia em que meu afeto infantil se transformou em algo mais profundo, mais quieto e mais profundo. Eu o segui, o apoiei, torci por ele das arquibancadas de sua vida, sempre acreditando que um dia ele se viraria e me veria. Me veria de verdade.

Ele havia prometido me proteger para sempre.

Mas quem iria me proteger dele?

            
            

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